19 de outubro de 2007

Um Rolex roubado


Faz mais de 40 anos que isso aconteceu. Meu pai era dono de uma pequena fundição de alumínio em São Paulo, onde produzia peças para o motor do automóvel Simca. Houve um problema qualquer que ele precisava solucionar colocando a mão na massa e, para não sujar o relógio Rolex de que tanto gostava, tirou-o do pulso e o colocou sobre uma bancada. Nunca mais viu a peça.
Os policiais chegaram a sugerir a ele deixar que os deixasse dar "uma apertada" nos empregados da Termo Flux, a empresa de então, mas papai disse não. Quem iria depois garantir a segurança dele nas idas e vindas ao trabalho? E tortura, mesmo naquela época, início dos anos 60, não era coisa com a qual se convivesse dormindo em paz todas as noites.
Até hoje, passados tantos anos, às vezes a lembrança do relógio vem à mente dele. E ele fala com tristeza do que aconteceu num dia de trabalho. Foi roubado por um de seus empregados, dentro da fundição onde ganhava dinheiro para sustentar a família e pagar salários.
Luciano Huck também tem o direito de ficar revoltado. Eu teria, você teria.
Ninguém tem o direito de tomar de mim o que conquistei trabalhando, com dinheiro ganho e não roubado. Ladrão não é Robim Hood e não se faz justiçaz social às avessas, protegendo quem rouba e condenando "as elites", como diz nosso presidente, sem explicar direito o conceito.
Se um dia construirmos uma sociedade digna, vamos nos indignar todos quando formos roubados. Mesmo os excluídos e "excluídos" de hoje.

9 de outubro de 2007

O guerrilheiro visionário


Praticamente tudo o que poderia ser dito como elogio à respeito de Ernesto Che Guevara, que aí aparece na célebre foto de Alberto Korda, já foi falado. Do revolucionário, ficam as razões de sua morte.

Che acreditava num equívoco chamado "Teoria do Foquismo". Isso queria dizer o seguinte: se um grupo pretendesse vencer uma revolução e tomar o poder num determinado país, bastava a ele criar um foco guerrilheiro. Esse foco cresceria, se tornaria uma onda, em seguida um vagalhão e ocuparia tudo. O exemplo era a revolução cubana.

Mas a teoria era errada. Em Cuba o foco guerrilheiro tomou o poder porque ele estava nas mãos de uma ditadura tão corrupta que bastaria um sopro. Mas não era nisso que Che acreditava. Pelo foquismo ele lutou na África e na América. Estava na Bolívia tentando criar um foco guerrilheiro que se transformasse em vagalhão quando foi morto, sumariamente executado, em 08 de outubro de 1967. Com ele foi sepultada a "Teoria do Foquismo".

Por ela morreram muitos outros. Inclusive brasileiros, levados a lutar em focos como a Guerrilha do Araguaia, seduzidos pelo mesmo canto. Muito sangue correu. E as lutas terminaram todas em derrotas e em repressões sangrentas também no Uruguai, Argentina, Chile e outros países.

Os visionários às vezes cometem erros graves. No caso do Che, honestamente falando.

3 de outubro de 2007

Saudades de Matheus


Quantas vezes fez-se piada do velho Vicente Matheus. Em algumas ocasiões ele havia falado mesmo as impropriedades - e falou muitas - mas na maioria, não. Dirigia o Corinthians como se aquilo fosse a coisa mais importante da vida. E para ele era.

Hoje, dez anos depois de sua morte, acompanhando à distância a promiscuidade em que se transformou o clube de maior torcida de São Paulo, só é possível sentir saudades de Matheus. Nesta foto acima, por exemplo, ele se realiza: segura um troféu de campeão de seu clube.

De onde saiu aquele Roberto Dualib? Como pode um presidente de clube, que se diz apaixonado por ele, falar em lavagem de dinheiro, em roubo de títulos esportivos, nas coisas mais promíscuas dos subterrâneos do futebol? De onde saiu essa gente, de que porão brasiliense, e como foi possível chegar ao futebol e tomar alguns dos maiores clubes do Brasil. Sim, porque o Corinthians não é a única vítima. E uma investigação séria mostrará isso.

Precisamos descer a esse porão. Limpar tudo, varrer aqueles que se aproveitam do futebol - das federações e da CBF também - para enriquecer ilicitamente.

Lembro-me de uma história hilariante. Candidato à presidência do Corinthians, o velho Matheus fez um improviso na sede corintiana, nos dias de vésperas de eleição: "Espero que os corinthianos compareçam para naufragar nas urnas o meu nome."

Dez anos após sua morte quem naufraga é o Corinthians.