24 de novembro de 2010

O "problema social"


Um homem literalmente enlouqueceu terça-feira, dia 23: ao ser assaltado por um flanelinha em Vila Velha, região metropolitana da Grande Vitória, sacou de uma arma e começou a atirar. Atingiu um veículos que acabava de estacionar e de onde haviam saído uma senhora e uma criança. Por sorte não matou ninguém. Nem o flanelinha, que fugiu de bicicleta.
O irado daquela manhã vai responder a processo. Mas pode se defender dizendo que a culpa não é somente sua, mas também das autoridades do Espírito Santo e de todo o restante do Brasil. Afinal, aqui pelo menos, os bandos de flanelinhas ocupam as áreas contíguas ao Palácio Anchieta, sede do Governo do Estado. Seguem em frente e loteiam as proximidades do Palácio da Justiça. E estão perto da Assembleia Legislativa, câmaras de vereadores, prefeituras e outros órgãos públicos. Em todos os casos, diante do beneplácito das autoridades.
Em todos os casos também, sob a demagógica argumentação de que esse é um problema social. Se é, o é somente em parte. Isso porque esconde sob seu, digamos, manto de flanela, um incontável número de criminosos. E eles circulam à solta pelas ruas, muitas vezes indicando carros a serem roubados, depenados, etc. E praticamente todos praticam ostensivamente um crime chamado extorsão. Chega a ser tristemente engraçado ouvir de um deles, como ouvi certa feita: "É isso aí, vou vigiar seu carro senão o vagabundo arranha. São cinco real!"
Se as polícias, unidas, um belo dia passassem um pente fino por nossas principais cidades, detendo para averiguações essas pessoas, tirariam das ruas uma infinidade de criminosos, alguns deles procurados há muito tempo. Os poucos que sobrassem, juntamente com todos os nossos políticos e outras autoridades, seriam os verdadeiros problemas sociais brasileiros.

19 de novembro de 2010

A direita do ódio


A extrema direita dos Estados Unidos está espumando de raiva. Um tribunal civil do país absolveu um preso por terrorismo de 284 das 285 acusações que lhe eram imputadas. Imputa-se no atacado. E nem o fato de ele poder ser condenado a 20 anos de prisão ou à prisão perpétua diminuiu a ira desses fundamentalistas do racismo disfarçado. Querem que todos os acusados de terrorismo permaneçam em Guantanamo, onde não precisam ser acusados formalmente de nada, não têm assistência jurídica e saem de lá quando as autoridades militares locais bem entenderem. Preferencialmente, nunca mais. Há muito espaço para covas rasas no lugar.
Lá também podem experimentar o afogamento simulado tão a gosto do ex-presidente George W. Bush. Arrancar confissões assim é rápido. Os policiais e militares brasileiros faziam isso com perfeição durante os 21 anos em que durou a ditadura militar. Muitos aprenderam "as técnicas" nos Estados Unidos. Os únicos inconvenientes eram que alguns, teimosamente, morriam antes de falar. Outros, de tanto suplício pediam para morrer ou confessavam o que não haviam feito. Diziam: "Quem matou Kennedy fui eu". "Quem ia invadir o Brasil à frente de um exército comunista durante o governo Goulart era eu. A sorte é que vocês derrubaram o homem e mataram todo mundo".
O Brasil de 1964/1985 não compreendia que as ditaduras só geram violência, raiva e ódio. A mesma receita que elas carregam. Os Estados Unidos da extrema direita também não entendem a mesma coisa. Então, quando acontece um 11 de setembro ou outro evento parecido alguns se perguntam: "Por que eles não gostam de nós?"
Os Estados Unidos sempre amaram a paz dos cemitérios. Sempre. E transmitiram esses princípios à extrema direita de Israel, que faz o mesmo com os palestinos. Eles, norte-americanos e israelenses de extrema direita, não são piores do que os maiores ditadores de esquerda que o mundo já viu. Como os líderes do Khmer Vermelho, por exemplo. Mas empatam.
E tentam mostrar ao mundo que Barak Obama é fraco porque quer fechar Guantanamo. Porque não quer que acusados sejam executados sem culpa formada. A democracia da direita americana é essa: aos amigos os favores da lei; aos inimigos os rigores da lei, como dizíamos por aqui.
E como matar é fácil, muitos preferem a receita dos americanos, essa mais acima à direita, por injeção letal. Higiênica! A outros tanto faz. No Irã que eles detestam, a forca tem a vantagem de poder levar três de vez, como na foto à esquerda. Embora arranque alguns pescoços vez ou outra, o que é muito inconveniente.

9 de novembro de 2010

Uma sugestão para as aposentadorias


Uma das questões mais discutidas hoje em dia no Brasil - e em grande parte do mundo - é a das aposentadorias. No caso brasileiro, sobretudo os meios de Comunicação de alcance nacional falam que os aposentados vão quebrar a Previdência. Em síntese, o pensamento geral diz que em breve a arrecadação será tão inferior ao desembolso que não haverá como fechar as contas.
Isso, em síntese. Porque ao mesmo tempo em que ataca as aposentadorias do setor privado, os críticos se abstêm de falar com mais ênfase sobre o abismo que separa estas das aposentadorias do serviço público, aqui entendidos Executivo, Legislativo e Judiciário, onde uma pessoa pode chegar a ganhar mais de R$ 50 mil mensais, o que agride - impunemente - o teto constitucional.
Nesse ponto, cabe uma explicação. Nós ouvimos diariamente pelas rádios, vemos nas TVs e lemos nos jornais notícias sobre o crescimento do deficit da Previdência. Advogados especialistas da área dizem que esses deficits são meramente contábeis. Ou seja, nas contas de quem efetivamente sustenta o sistema previdenciário por décadas são debitados custos de quem não trabalha ou não trabalhou. E é essa a prática geradora da diferença entre o que entra e sai.
Vou à minha sugestão: nós temos um índice de expectativa de vida, revisto periodicamente. Ele mede a que idade o brasileiro está chegando. Os mais aquinhoados vivem mais do que os miseráveis, claro, mas a média retrata mais ou menos como a vida se dá no Brasil em termos de anos. E o justo, o ideal, seria fazermos com que a aposentadoria jamais ultrapassasse 80 por cento da média de idade do brasileiro. Explicando: se essa média é de 75 anos, a aposentadoria deveria acontecer aos 60 anos. Tanto para homens quanto para mulheres. Sem que as últimas parem antes deles, pois elas vivem até mais.
Mas como fazer isso? Como efetuar essa atualização, sendo que o índice varia e uma aposentadoria ocorre pelo menos 30 anos depois do início da contribuição. Esse é o exercício de inteligência que deve ser feito. E também precisa valer somente para quem está entrando agora no mercado de trabalho e não para os que já labutam com as regras atuais. O correto seria o cálculo de índice ser feito a cada cinco anos e a oscilação da idade de aposentadoria ser informada ao final de cada período quinquenal. Os trabalhadores já estariam sob a regra e acompanhariam a variação do índice como a referência para sua idade de parar de trabalhar. Sem sobressaltos ou dramas maiores porque as oscilações nunca serão bruscas demais. E mais: todos os trabalhadores, fossem do setor público, fossem do setor privado teriam de seguir a mesma regra, com o mesmo tempo mínimo de contribuição, a mesma idade para parar e o mesmo teto. Ou seja; todos com os mesmos meios de enfrentar o final da vida e seus acrescimos de despesas - médicas, por exemplo - com a mesma dignidade.
Isso acabaria com agressões aos direitos adquiridos. Eu, por exemplo, por um largo período da vida contribui sobre 20 mínimos como empregado do setor privado, pois esse era o teto para as aposentadorias. De repente, não mais que de repente, esse teto caiu para 10 mínimos. Todos os meus direitos cessaram. Foram subtraídos. Furtados. Negados. Minha aposentadoria acabou calculada para baixo, os anos de contribuição a mais jamais foram considerados para um cálculo parcial e o dinheiro pago a mais, nunca vi de volta. Tivesse isso acontecido com os vencimentos do setor público e o mundo desabaria. O senhor presidente diria que a decisão era cretina e o Executivo a iria contestar. O Judiciário, que ela não prosperaria por ser inconstitucional. E o Legislativo, por fim, quando houvesse quorum, derrotaria a votação no Congresso.
Mas eles são eles. E, no Brasil, a esmagadora maioria ainda espera bovinamente por mudanças que tornem o poder de todos e não de castas. Que o façam deixar de ser espúrio. Ao menos por enquanto.

5 de novembro de 2010

O cadáver insepulto


Não foi preciso muito tempo, como era previsto. Para falar a verdade, não foi preciso quase nada: nem bem a ex-ministra Dilma Rousseff se elegeu e a CPMF, um cadáver insepulto do governo Lula, começou a tomar forma novamente. E, como não poderia deixar de ser, convenientemente por mãos de terceiros, no caso os novos governadores eleitos pelo PSB.
O imposto, que agora corre o risco de se chamar CSS - o que, no fundo, dá no mesmo - é a solução encontrada para os males da saúde pública brasileira. No país onde grande parte dos cidadãos tem que pagar planos de saúde para não morrer em filas do SUS, agora eles vão acrescentar a esse custo o desconto nos cheques. Claro, porque a solução seria diminuir o Custo Brasil. A mastodôntica conta a pagar pelo empreguismo e pelo clientelismo. Mas como fazer isso se a 'companheirada' cresce mais a cada dia? Hoje, aos antigos aliados somam-se os novos, parceiros da eleição de Dilma. E para cada um deles e seus apaniguados há de haver um cargo público. Todos têm vocação para cargo comissionado!
A presidente (ela prefere presidenta) eleita, que discursou chorando e prometendo ética, vai iniciar o mandato colocando em prática a vingança de seu criador: Lula, que jamais se conformou com a extinção do imposto do cheque, agora quer vê-lo ressuscitado pelas mãos de sua criatura. E, convenientemente, por ações de terceiros para preservá-la antes da posse.
Com tudo isso, há a hipótese de o novo governo ser empossado já em meio a grande crise. O orçamento da saúde cresce a cada ano - de modo que o problema não é falta de dinheiro - mas a qualidade dos serviços, não. Ressuscitar a CPMF significará enfrentar a parcela da população brasileira que dá estabilidade ou desestabiliza governos. Na hora da eleição, todos temos o mesmo tamanho pois o voto vale um. Passadas as eleições, não. Depois das urnas fechadas, há cidadãos que geram crise e os que não têm influência alguma. E isso não está sendo visto.
Uma coisa é certa: haverá muita luta política e nas ruas, ainda que o governo detenha a maioria num Congresso que se curva aos demais poderes. O Custo Brasil, este só vai cair no dia em que os brasileiros chegarem à conclusão de que o Estado, em qualquer lugar do mundo, existe para servir o cidadão e não para se servir dele com metáforas e sofismas. Em termos mais simples, mentiras sofisticadas.
E você que votou na Dilma, está começando a ficar satisfeito?

3 de novembro de 2010

Sakineh e a manipulação da informação jornalística


A pena de morte não soluciona os problemas da criminalidade em lugar algum. Não fosse assim e nos Estados Unidos, que mais executam, e na China, ilustre segunda colocada, não haveria criminoso algum. Todos já teriam sido mortos. E os demais candidatos ao crime sentiriam tanto medo a ponto de concluir que delinquir é perigoso demais. Ao menos em seus países. Por isso, em poucos lugares ainda se mata legalmente hoje em dia.
Mas a pena de morte infelizmente existe. Em alguns casos ela é exercida contra os considerados criminosos comuns. Em outros, contra inimigos políticos. Por último, por motivos religiosos ou de castas. E esse é o caso da iraniana Sakineh Ashtiani (na foto abaixo, à direita), acusada de adultério contra um marido já morto e de ter, juntamente com outras pessoas, tramado o assassinado deste. O caso Ashtiani vem chamando a atenção em todo o mundo e principalmente por dois fatores: a brutalidade insana com que as mulheres são executadas nos estados islâmicos e o fato de ela viver num país governado por um líder de opiniões e ações desconexas e execradas internacionalmente. No Dia de Finados, o Jornal Nacional deu a notícia relativa à mulher como sendo ela uma condenada à morte "pelo regime de Mahamoud Ahmadinejad", numa alusão direta ao presidente iraniano. Como se a decisão pela condenação dependesse somente dele suas opiniões anti-semitas e não de toda uma cúpula teocrática que governa aquele país já faz muito tempo, sob tensão e pressão de grande parte das comunidades externas. Sobretudo dos Estados Unidos, o que acirra, e muito, os ânimos.
No último mês de setembro, Teresa Lewis, uma norte-americana de 41 anos (foto acima, à esquerda), foi executada nos Estados Unidos com uma injeção letal no estado da Virginia. Ela havia sido acusada de matar o marido e um enteado. Seu QI, segundo constatado, era 72, limite da deficiência mental. Os advogados que a defenderam disseram, e provaram, que ela era débil. Uma doente mental, sem noção exata do que fazia. Mas isso não sensibilizou a Suprema Corte. Nem o governador do estado onde ela estava presa. Os jornalistas que viram a execução testemunharam depois que Teresa parecia assustada e desorientada. O Jornal Nacional nada falou sobre o caso. Os outros telejornais nacionais também não. E ninguém, mas ninguém mesmo, disse ou escreveu que ela havia sido morta "pelo regime de Barak Obama".
É óbvio que na nossa prática de noticiar fatos há uma grande carga de rejeição política e de manipulação de fatos em nome de crenças pessoais, corporativas ou interesses econômicos. Temos uma visão ocidental e anticomunista de mundo e separamos, dessa forma, amigos e inimigos. Isso ocorre também nos EUA e em grande parte dos países europeus. Falamos de iguais e desiguais. Certos e errados. Culpados e inocentes. Os assuntos são direcionados para que a opinião pública ame ou odeie de acordo com a ideologia ou valores defendidos pelas grandes empresas de Comunicação. E o conceito de "liberdade de imprensa" é parte integrante da prática da manipulação dos fatos. O que se pretende é poder noticiar o que interessa, da forma como interessa, ainda que omitindo informações e dados. E marginalizando o "outro lado".
E não é essa a liberdade com que se sonha. Pelo menos, não é essa a liberdade de noticiar pela qual lutamos muitos de nós por 21 anos, de 1964 a 1985, enquanto os grandes veículos de Comunicação do País ou se calavam ou apoiavam claramente a ditadura militar.
Um Estado que, em nome do conceito de "controle social" da informação, deseja garrotear o livre fluxo de notícias, age deliberadamente contra o interesse público. E grandes corporações de Comunicação que usam a informação para divulgar ou omitir fatos, manipulando-os quando necessário e para atender a interesses individuais ou de grupos, agem da mesma forma.
Isso acontece hoje no Brasil e em outros lugares. Como todos os dias falamos do sagrado direito de informar - e informação é poder -, não seria demais lembrar que ele, esse direito, pressupõe uma responsabilidade muito grande. Primeiro, de levar ao público a informação limpa de tendências, fisiologismos, ideologias ou manipulações econômicas. Por fim, de lembrar que o outro lado tem esse mesmo direito de se expressar. Principalmente porque pensa diferente.

1 de novembro de 2010

A interrogação


Não se discute a vontade das urnas. No dia em que Dilma Rousseff foi eleita presidente do Brasil, eram incontáveis os veículos que trafegavam com adesivos seus. Ao contrário do que se julgava em primeira impressão, não foram somente os pobres que escolheram a "criação" do presidente Lula para votar. Uma enorme parcela da classe média também ajudou em sua eleição.
O Brasil, em verdade, elegeu a escolhida de Lula e não a Dilma. A eleita do presidente que, para tornar sua preferida conhecida nacionalmente, agrediu a ética, atropelou as leis, desconheceu a Constituição e navegou nas águas da falta de compostura como nunca antes houve na história deste País, saiu do pleito coroada. Se a coroa é de louros ou de espinhos, veremos. Mas a eleição não teve incidentes maiores, foi honesta e o mandato pertence à eleita. Temos, portanto, diante de nós não apenas a continuação de Lula, a primeira mulher Presidente da República, mas também a maior interrogação de nossa República. Afinal, ela jamais havia sido eleita para cargo algum.
Dilma será um boneco-de-ventríloquo?
O passe-livre (já que o Presidente adora citar futebol) para outros mensalões?
A ampliação da partidarização e instrumentalização do Estado?
O crescimento desordenado do déficit público?
A continuação do enriquecimento dos parentes e amigos dos detentores do poder?
A sequencia do uso do hábito da mentira para conquistar apoios?
Ou uma surpresa agradável que todos os brasileiros merecem vivenciar?
A resposta depende dela. Em seu discurso da vitória, prometeu ética, honestidade e outras coisas mais, como a defesa do Estado Laico com liberdade religiosa e a enorme tarefa de eliminar a miséria do Brasil e ampliar o SUS. Vai precisar de todas as forças para chegar a isso, se é essa mesmo sua vontade. No país que vai governar, os miseráveis existem em número muito maior do que mostram os dados oficiais. E a falta de perspectivas, de futuro, de horizonte, geram a maior parte da violência a que os brasileiros assistem todos os dias.
Dilma prometeu, por último, ser fiel ao presidente que a entronizou e elegeu. E disse mais: "Vou bater à porta do presidente Lula sempre que for preciso."
Essa é a única preocupação que ela não necessita ter, apesar de o presidente se dizer em fim de carreira. Sem cerimônia alguma, como é sua marca, ele é quem vai bater à porta dela todos os dias, de 1º de janeiro em diante.