26 de setembro de 2012

Maomé e os espíritos armados

Quem como eu perdeu seu tempo para ver o filme "A Inocência de Maomé" - pela internet - , deve ter chegado à mesma conclusão: trata-se de um filme amador, mal feito e idiota. Como seu único intuito era irritar os muçulmanos, pelo menos nisso foi um sucesso total. Mas não pelo fato de tantas pessoas terem sido mortas ou prejudicadas por causa dele.
Dizem que o filmete (com foto mostrada nessa página) foi obra de um judeu norte-americano. Se foi, esse imbecil deu uma grande contribuição para a guerra. Tocou em ninho de vespas e acendeu mais um rastilho de pólvora no conturbado Oriente Médio. Onde deveria haver ações em busca da paz, vez ou outra surge um inconsequente para levar ódio à região.
Os muçulmanos têm uma religião onde as proibições, se desrespeitadas, podem  levar até à morte. O escritor Salman Rushdie sente isso na pele faz muito tempo, desde que foi condenado a morrer pelo aiatolá Ruhollah Khomeini por ter escrito o livro "Os versos satânicos". Vive escondido, desde então, protegido pela polícia britânica e com identidade falsa.
Minha afirmação pode levar a protestos, mas o mesmo acontece com os inimigos de Israel. O Mosad, serviço secreto do Estado judeu, costuma caçar seus inimigos pelo mundo todo (talvez exceto nos Estados Unidos) e matá-los sem piedade. Assim, ao menos em questão de método - e não obrigatoriamente em competência e recursos - os dois inimigos se parecem. Se fossem capazes de dar uma chance à paz, as tensões no mundo diminuiriam consideravelmente.
Como seriam reduzidas caso a questão das armas atômicas fosse encarada sem subterfúgios ou fingimentos. De nada adianta prometer a guerra ao Irã caso ele não renuncie ao seu programa nuclear se, ao mesmo tempo, a ONU finge não ver que Israel tem um vasto arsenal atômico pronto para ser usado quando e onde sentir que sua existência está ameaçada.
O filme sobre Maomé é uma idiotice, repito. Mas serve a um propósito: por ele e graças a ele, todos nós ficamos sabendo, ao menos, que desarmar os espírito é mais importante hoje do que retirar armas dos inimigos, sejam elas nucleares ou não. Espíritos desarmados jogam fora as armas sem necessidade do uso da força.        

12 de setembro de 2012

"Caçadas do Pedrinho", esse racista

Parece mentira, mas faz dois anos o MEC luta contra organizações representantes de negros e pardos para poder manter como leitura obrigatória no ensino público um dos clássicos da literatura brasileira. Trata-se do livro "Caçadas de Pedrinho", de Monteiro Lobato, obra escrita em 1936.
Os defensores da censura ao livro - o termo tem que ser esse mesmo - alegam que ele tem conteúdo racista. Em certo trecho, a personagem Tia Anastácia é identificada como gente "que tem carne preta". Ela, Tia Nastácia - como as crianças dizem - é um dos mais caros personagens do universo lúdico criado por Lobato e que tão bem representa o espírito cultural brasileiro.
Livros são produtos de sua época, fotografias de seu tempo. Esse, por exemplo, foi escrito já se vão 76 anos. Quando o Brasil ainda guardava consigo, em seu universo da cultura do dia-a-dia, grande parte de um linguajar e um comportamento que vinham da época escravagista. E Lobato refletia esse tempo, fazendo em suas páginas um retrato do Brasil de então. Ele não era o que se poderia chamar de racista. Apenas um espelho da alma brasileira. Um retrato de nossa brasilidade.
Chamar os livros do maior escritor infantil brasileiro de todos os tempos de racista e obrigar o MEC a retirar a obra das escolas como conteúdo obrigatório, ou então a fazer com que na abertura dela seja colocado um aviso dizendo que se trata de texto que agride a raça negra é um absurdo. Um acinte. Um atentado contra a cultura literária brasileira e contra nossa herança cultural.
Já vivemos num país cheio de guetos. Nas universidades foram criadas cotas de vários gêneros, inclusive a que dá aos negros o direito de ingresso privilegiado. Isso, convenhamos, é muito mais fácil do que dotar o ensino público de qualidade capaz de assegurar igual oportunidade a todos no ingresso nas universidades públicas por mérito. Não não existe diferença entre negros, brancos, amarelos, vermelhos, ricos, pobres, gordos, magros, destros, canhotos, corintianos ou flamenguistas no poder de aprender. Apenas a miséria crônica leva a uma perda da capacidade de intelectual. Ou então o ensino ruim diminui a chance da entrada na Universidade.
Não vamos deixar que o mundo ria de nós mais uma vez. Não vamos consolidar aqui um país de cotas, de guetos, porque isso será tão ou mais danoso do que a vida na época da escravatura. Sou branco mas, se fosse negro, me recusaria a fazer parte de cotas nascidas do conceito de que sou ou era incapaz de triunfar intelectualmente, a não ser por critérios especiais.