27 de novembro de 2012

Dízimo com quem andas...

Vira e volta surge um escândalo envolvendo as chamadas "confissões evangélicas" ou "neo pentecostais". Na Grande Vitória isso aconteceu pela segunda vez esse ano envolvendo a Igreja Cristã Maranata. Houve batida policial, recolhimento de computadores e documentos e suspeitas sérias de desvio de dízimos para compra de imóveis, remessa de dividendos ilegalmente ao exterior e até mesmo de utilização de notas fiscais frias.
Não há nada mais fácil do que criar uma igreja no Brasil. Depois, basta envolver incautos. Em seguida, pedir isenção fiscal total. Então roubar. E roubar muito, preferencialmente. Os escândalos e processos são tantos e as igrejas ou seitas acusadas em tal número que é incrível entender como os fieis dessas denominações continuam frequentando cultos e outras atividades, além de pagar seus dízimos mensalmente.
Mas o pior não é isso. Somos um Estado Laico. Significa dizer que não somos um Estado ateu, mas tampouco temos religião oficial. E isso determina distanciamento entre religiões e poder público, sobretudo e principalmente no que diz respeito a dinheiro. Mas somente no papel. Porque na prática políticos formam blocos religiosos acima dos partidos, defendem abertamente leis que beneficiem as suas igrejas (ou seitas) preferidas, bem como pressionam para aprovar ou vetar leis ao sabor de crenças, de dogmas.
Vereadores, deputados e senadores não têm o menor pudor em destinar às suas "confissões" o dinheiro do contribuinte. Por intermédio das tais emendas parlamentares, direcionam grandes somas de valores que deveriam ser destinados a saúde, educação, mobilidade urbana, geração de emprego e renda, habitação, segurança e outros tantos destinos nobres, ou para essas instituições ou a entidades criadas e ligadas a elas. Não raro esse dinheiro desaparece. Grande parte dele vai parar em paraísos fiscais.
Uma vez perguntei a uma pessoa ligada a um deputado capixaba que desvia (esse é o termo correto) dinheiro para a Maranata via emendas parlamentares e premia instituição a ela ligada, os motivos de ele fazer isso além do claro intuito de criar um rural eleitoral teológico. Trata-se de uma entidade que teoricamente distribui remédios para carentes. A resposta foi: "Mas o Governo não faz isso..." É um escárnio de justificativa. A tarefa constitucional do deputado, como de resto de todos os membros do Poder Legislativo, é fazer com que o Estado cumpra a Constituição. Principalmente no que toca a saúde. Mas, claro, fica muito mais fácil se omitir e ajudar essa corja a roubar.
A Maranata tem uma instituição a ela ligada e que, teoricamente, deveria cuidar da saúde dos outros. Chama-se Fundação Manoel Passos Barros. Tem sede imponente no Espírito Santo e recebeu, nos últimos anos, cerca de R$ 1.800.000,00 em dinheiro de emendas parlamentares de quatro deputados estaduais capixabas, mais R$ 300.000,00 do deputado federal Carlos Manato (PDT) e mais R$ 230.000,00 repassados por secretarias de Estado do governo capixaba.
O  campeão estadual das emendas é o deputado Elcio Alvares (DEM), membro da "confissão" e convertido em época relativamente recente. Ao longo dos anos, em dois mandatos, desviou para a Maranata R$ 860.000,00 do meu e do seu imposto, leitor (ganhou fácil de Aparecida Denadai, Geovani Silva e Jurandi Loureiro, outros "doadores"). Trata-se de um parlamentar que faz "democracia" com dinheiro alheio. Esse ano, talvez assustado com a repercussão, tirou a seita de sua preferência das próximas transferências de dinheiro público. Agora vai ajudar na construção de campos de futebol...         
Está na hora de a Nação reagir. Se somos laicos constitucionalmente, deve ser considerado ilegal, inconstitucional, dinheiro público ser destinado a igrejas e, principalmente, a seitas criadas em fundo de quintal ou como dissidências de outras e que viram meio de vida para espertalhões. O Supremo Tribunal Federal deve ser acionado. Cabe a ele zelar pelo respeito às normas constitucionais.            

17 de novembro de 2012

A "descoberta" do ministro

Presos se espremem em cadeia. O ministro viu isso agora?
Há séculos sabe-se que o Brasil mantém seus presos em condições sub-humanas. Isso não é novidade, nem o é o fato de que as autoridades nada fazem para modificar esse quadro. Afinal, uma das funções da prisão é recuperar o criminoso, não importa que crime cometeu, para o convívio com o restante da sociedade. Terminada a pena ele recupera seus direitos de cidadania e deve, ou deveria, fazer isso em condições de voltar a ser um indivíduo apto a viver juntamente com o restante de sua comunidade.
Dessa forma, é difícil entender como e porque o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, fez um discursos dizendo que preferia morrer a passar uma temporada em nossas piores prisões. Digo que é difícil entender caso esse desabafo tenha nascido de forma espontânea. Caso contrário, fica fácil: ele falou isso justamente quando alguns dos cardeais do PT, diretamente ligados a altos cargos durante o Governo de Lula, correm o risco de conhecer pessoalmente nossas melhores e piores prisões.
O PT tem se insurgido contra os julgamentos do STF. Contra o caso do Mensalão. O Governo, que é desse partido, não se manifesta repudiando os atos praticados pelos condenados. Há uma indisfarçável tentativa de evitar que eles tenham de cumprir pena em regime fechado e isso tem sido visto em várias esferas de poder e em manifestações que ocorrem em todos os níveis da administração política brasileira ligada ao PT.
Um dos argumentos usados é o de que pessoas com passado de lutas de José Dirceu não podem ser tratadas como gente comum. Podem sim. Se o sujeito decide rasgar sua biografia e jogá-la na lama, isso é problema dele. Não se julga o passado de lutas de ninguém, mas sim atitudes espúrias praticadas. Se as pessoas se deixam corromper pelo poder, devem responder por isso. Na forma da lei.
O mais desconfortável nesse episódio nem é o fato de a manifestação do ministro ter sido suspeita. O que agride o bom senso é todos nós termos a mais absoluta certeza de que a "constatação" dele não vai mudar o quadro, pelo menos em prazo curto. Para tanto, seria necessária uma vontade política que não existe. Afinal, presos têm os direitos políticos suspensos enquanto durar a pena a cumprir. E quem tem seus direitos políticos suspensos não vota. Por que então se preocupar com eles?            

14 de novembro de 2012

Quem liga para isso?

O lindo vagão restaurante do Trem de Prata que ligava Rio/SP
Lembro-me como se fosse hoje: em vez de um vôo direto de Vitória para São Paulo, comprei certa feita passagem para o Rio de Janeiro. Do Aeroporto Santos Dumont fui para a estação ferroviária e embarquei na Primeira Classe do Trem de Prata ou Trem Húngaro, que ligava aquela cidade a São Paulo. Queria passar a noite no "comboio", como dizem os portugueses, fazendo a viagem que muitos homens de negócios usavam para poder ir de uma cidade para a outra resolver pendências relativas a dinheiro, indo a voltando sem precisar pagar hotel porque o trem fazia a viagem entre 23 horas e 07 da manhã seguinte.
O beliche da Primeira Classe servia de hotel. Corri aquilo tudo. Era um trem simpático, romântico, relativamente lento mas cheio de charme, principalmente no vagão restaurante. E ainda havia a hipótese de se dormir um pouco mais, pois quando ele chegava a São Paulo ou ao Rio ainda aguardava pelo acordar dos passageiros.
Lembrei-me disso vendo uma série de reportagens do Jornal Hoje, da Rede Globo, sobre transporte ferroviário. Na primeira delas foram mostrados os cerca de sete quilômetros de vagões e locomotivas abandonados, além de estações ferroviárias que viraram ruínas fantasmagóricas Brasil afora. Resta apenas a ligação diária Vitória/Belo Horizonte (ou vice versa) como uma linha regular de trens para passageiros no Brasil.
Muita gente diz que é um absurdo e uma burrice um país como esse não investir em transporte ferroviário. Concordo: é um absurdo. Mas não se trata de burrice. Trata-se de um crime contra o Brasil, praticado a partir de meados da década de 1950, quando as linhas férreas já estavam defasadas, necessitavam de ampliação e modernização, mas a vinda para o Brasil de montadoras de veículos fez com que o Governo Federal investisse maciçamente em rodovias e deixasse toda a malha ferroviária nacional sucatear. Restou apenas o transporte de carga, em poucos troncos que ainda funcionam tocados pela iniciativa privada.
Essa opção enriqueceu muita gente. O sucateamento das linhas ferroviárias brasileiras foi um atentado contra o Brasil. Mas quem liga para isso? Agora mesmo estamos convivendo mais uma vez com escândalos, pois a construção da ferrovia que deveria interligar o Nordeste ao Centro do Brasil é um caminho por onde o dinheiro público abasteceu o bolso de um grande número de ladrões graças a instituições como a Valec.
Aliás, o dinheiro público sempre enriqueceu bandidos nesse país. O faz agora nas obras paradas da transposição do Rio São Francisco. Um mar de água doce de dinheiro já foi gasto sem que uma gota de água real passasse por aquelas calhas imensas. Enquanto isso acontecesse, o nordestino perde lavouras, gado e as poucas esperanças que restam.
Mas quem liga para isso?     
   

11 de novembro de 2012

A Festança das Seitas

- Prefeito, como o senhor pretende administrar sua cidade?
- Em primeiro lugar agradeço a Deus pela minha eleição. Tenho certeza de que com o apoio Dele, com Sua força, saberei fazer os que meus conterrâneos esperam de mim!
Você já ouviu isso, leitor? Quantas vezes? Se não houve como contar - e eu também não contei as minhas vezes -, pode saber que foram milhares. Porque não se trata de fé, embora ela às vezes esteja presente em alguns discursos de candidatos. Isso é uma tática e uma técnica. Usa-se essa tática e essa técnica para ganhar eleições. Municipais, estaduais ou nacionais, tanto faz.
Procure se recordar das agendas dos candidatos. Lembrou-se? Sempre tem "reunião com a igreja A", "debate na igreja B", "participação no culto da igreja C", "demonstração de fé na igreja D". E vai por aí. A cada eleição praticamente todas as igrejas, sobretudo seitas, recebem os candidatos. Agora mesmo nós vimos isso acontecer nas eleições municipais.
E não é só isso. Desconheço um percentual, mas inúmeras candidaturas foram compostas com a participação de representantes de seitas evangélicas, conhecidas com o pomposo nome de "confissões neo-pentecostais". Em Vitória, Espírito Santo, o candidato vencedor, Luciano Rezende, do PPS, o atual nome do antigo PCB ou Partidão, recorreu a esse expediente. Seu vice é neo-pentecostal. Dentre seus apoios estão várias "confissões". Em alguns casos, com desvios de dízimos e outras coisas mais.
O que faz um prefeito? Administra uma cidade. E administrar uma cidade não quer dizer atender a reclames desta ou daquela corrente religiosa. Esse atendimento muitas vezes representa ceder a pedidos que atentam contra o interesse público. Em todo o Brasil, cresce como praga a quantidade de igrejas espalhadas pelas cidades. Na maioria dos casos são entidades novas ou "semi novas", fundadas com o claro intuito de enriquecer seus dirigentes. Alguns deles desfilam em aviões executivos de vários milhões de dólares. Muitos possuem mansões em outros países. Depósitos em paraísos fiscais. E problemas, muitos problemas, com o Fisco. Mas um ponto em comum eles têm: nenhuma dessas "entidades", podemos chamá-las assim, paga impostos. Os mesmos que penalisam o cidadão comum.
Geralmente as igrejas chamadas seculares não usam esse tipo de artifício ou recurso. Se o usam, fazem isso discretamente. E sempre mais para defender seus dogmas do que para conquistar favores do Estado. Afinal, quem ganha favores deve favores.
E os projetos de governo, aqueles que realmente interessam às populações? Esses são atendidos na medida do possível, depois de feito o butim dos cargos públicos para atender a essas correntes de apoio migratório. Em grande parte dos casos, nem sequer atendem ao interesse público. Mas continuam tendo um ponto em comum: como representam custos, esses custos são repassados aos contribuintes. Àqueles que não fazem parte das festanças das seitas.                 

7 de novembro de 2012

O horário político da TV

O poder, tomado por si só, não corrompe. Os que acreditam assim, ou querem se corromper ou então usarão facilidades legais para fazer conchavos, acordos que normalmente os homens de bem não fazem. E tudo isso com um único objetivo: chegar ao poder. Seja ele legislativo ou executivo, municipal, estadual ou federal. Isso pouco importa.
As últimas eleições municipais brasileiras deixaram mais uma vez à mostra uma aberração que permite os acordos mais espúrios possíveis e imagináveis: o tempo de TV na propaganda eleitoral gratuita - ou seria melhor obrigatória? Em busca de um tempo de exposição que é importante e pode ser a distância entre vitória e derrota, os candidatos a cargos majoritários fazem qualquer coisa. Até mesmo negociar alianças com políticos reconhecidamente corruptos, de partidos políticos de aluguel, para conseguir mais um minuto de exposição diante do público eleitor.
O desgaste do político brasileiro é evidente. Tomando-se somente Vitória, a Capital do Espírito Santo como exemplo, aqui, em números redondos, o candidato eleito prefeito teve cerca de 98 mil votos. O segundo colocado, 88 mil. E nada menos que 67 mil pessoas ou anularam os seus ou não votaram em ninguém. E o pior é que esse fato extremamente grave passou quase desapercebido.
O horário gratuito de rádio e TV é importante. Permite ao eleitor conhecer candidatos a fundo, em condições que seriam inimagináveis caso cada um deles tivesse que pagar por comerciais. O que mata são os conchavos. O tempo de TV e rádio deveria ser calculado apenas e tão somente de acordo com o peso político do partido do candidato a prefeito, governador ou presidente. E de forma a que cada um tivesse de 15 a 20 por cento do tempo total no mínimo. E partido que não tem representação no Congresso também deveria usar TV e rádio para propaganda gratuita. Isso acabaria com os acordos espúrios e com a existência de partidos sem razão para existir.
Acabaria com salvadores da Pátria e também com aqueles que imaginam governar numa democracia sem a estrutura dos partidos políticos, pois eles são a base dessa mesma democracia. Porque, paralelamente a todos os problemas que já temos, se um chefe de Executivo eleito tem a coragem - ou insensatez - de vir a público dizer que vai governar sem seu partido, ou ele é um novo tipo de demagogo dos mais baratos ou tem uma miopia política que só a decepção do eleitor poderá comprovar. 
Difícil fazer uma reforminha como essa sugerida para o horário gratuito? Claro que não. Basta o Congresso ter com essa questão a mesma disposição que têm seus membros quando se trata de decidir normas e textos legais em benefício próprio.