30 de maio de 2013

E a formação da empregada, como fica?

Em qualquer caderno de jornal que fale de emprego, em qualquer SINE ou coisa parecida, ao lado de uma vaga estão as exigências feitas aos interessados. Hoje em dia um porteiro precisa ter o 1º grau  completo e conhecimentos de informática. Em muitos casos, onde o nível das pessoas é mais elevado, exige-se também treinamento de relações humanas e, quem sabe, conhecimento, ainda que básico, de inglês.
Isso ocorre em todas as atividades. Falei de uma das consideradas menos especializadas ou exigentes para chegar onde quero: o Brasil discute dia após dia, como num circo de ingresso gratuito, ao espetáculo da legalização da profissão de empregada(o) doméstica(o). Qual vai ser a carga horária semanal? Como dividir o total pelos dias? Os pagamentos a que os demais trabalhadores estão sujeitos também valem para ela(e)s? O intervalo para o almoço será de quanto tempo? Demissão sem justa causa dá quanto de multa sobre o FGTS? E vai por aí. Todos os deputados, senadores, ministros e outros estão às ordens para falar sobre o assunto. Até mesmo bobagens.
Mas uma coisa parece passar desapercebida: que exigências de formação profissional serão feitas a essas pessoas, agora que elas passarão a exercer uma atividade regulamentada? Onde existem centros de formação profissional (por exemplo, do Sistema S) capazes de preparar "A" para ser cozinheira, "B" para cuidar do trato da casa, "C" para ser babá, "D" para ficar ao lado de idosos ou exercer outras tarefas mais? Onde serão formados os motoristas domésticos? E os jardineiros que, na maioria dos casos, sabem de jardim apenas e tão somente que a parte subterrânea da planta geralmente é a raiz. O resto fica para fora.
Não faço essas perguntas como forma de desrespeito ou pouco caso. O foco é o inverso. O preparo, a qualificação, é o que dita o valor de um profissional. Confere dignidade a ele. Hoje mesmo uma diarista ligou, sem saber em que botão estava enfiando o dedo, um equipamento eletrônico para lavagem de roupas com capacidade para 12 quilos com apenas três toalhas de rosto dentro. Estavam "encardidas", disse ela. Gastou água, sabão em pó, energia elétrica e fez a máquina sacudir como uma coqueteleira porque, com tão pouco tecido sendo lavado, tudo se concentrou contra apenas um dos lados do interior enquanto ela girava centrifugando em alta velocidade. Não quebrou; mas poderia.
A discussão sobre a regulamentação de uma das mais antigas profissões brasileiras não tem sentido desacompanhada da definição do quantum de conhecimentos cada profissional terá de ter para disputar um mercado de trabalho que hoje é muito mais dúvidas do que certezas. Sim, porque milhares de pessoas estão trocando as empregadas por diaristas por não terem como assumir maiores gastos. Os que tiverem meios de mantê-las vão querer - e terão o direito de fazer isso - exigir formação específica rigorosa. Afinal, não se exige só honestidade desse profissional. Isso exige-se de qualquer um. Desse também se exige muitas especificidades. Como, por exemplo, saber lidar com eletrodomésticos.
           

4 de maio de 2013

De maioridade penal e cotas raciais

Sempre que um crime bárbaro envolvendo menores de idade ocorre, uma bandeira é levantada: seria correta a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos? Afinal a pessoa já vota. Que tal 14 anos, já que alguns países de Primeiro Mundo a adotam? E aos 12 anos? Também existe essa possibilidade em casos de crimes que nós chamamos de "hediondos". Vou traçar aqui um paralelo entre essa questão e a das cotas raciais universitárias. Não tem pé nem cabeça? Erro; tem sim. Vamos lá:
Quando um menino paulista foi morto com um tiro na cabeça por um menor às vésperas de completar 18 anos, isso em São Paulo, só uma coisa me deixou mais horrorizado do que o crime em si: ver e ouvir na TV um desembargador de Tribunal responsável pelo Estatuto de Menor dizer que é contra a diminuição da maioridade porque nossas prisões são medievais. São sim. E pouca gente - quem sabe o meritíssimo não seja rara exceção? - faz qualquer coisa, por menor que seja, para mudar esse quadro.
Quando, já faz um bom tempo, começou a discussão sobre a criação do sistema de cotas para ingresso nas universidades, sobretudo e principalmente públicas, dizia-se que negros, pobres, índios e demais membros de minorias sempre levavam desvantagem nos vestibulares. Pouca gente se lembrou de dizer que isso decorre do fato de que nosso ensino público, de primeiro e segundo graus, é uma porcaria. Grande parte das escolas educa tanto quanto as prisões recuperam. São educandários medievais.
Eis o quadro: milhares ou milhões são contra a diminuição da maioridade penal por saber - e com razão - que o preso deixará a prisão ainda mais perigoso. Mas nada ou muito pouco é feito para corrigir esse quadro, fazendo do cerceamento penal da liberdade um caminho para a reintrodução do cidadão à sociedade. Da mesma forma, nada ou muito pouco é feito no sentido de que as instituições educacionais públicas sejam tão eficientes quanto suas congêneres privadas, o que tornaria inócuo o sistema de cotas por raça, cor da pele, status social ou time de preferência.
Os problemas existem porque o Estado não os resolve. Não há decisão política nesse sentido. Pelo menos não há decisões tão urgentes quanto aquelas que preservam e aumentam privilégios em todas as três instâncias municipais, estaduais e federais: Executivo, Legislativo e Judiciário. São eles que detêm o poder de solucionar esses problemas. Mas o custo seria alto e talvez fosse necessário reduzir algumas benesses e cortar uns 15 ministérios. Principalmente os que só existem para comer dinheiro e formar base parlamentar.
Portanto, tudo indica que as masmorras continuarão a receber gente e as escolas públicas prosseguirão existindo, mas sem ensinar. Ou então sem ensinar adequadamente.
Os criminosos usam menores entre 16 e 18 anos no cometimento de crimes porque sabem - e os jovens também - que eles serão apreendidos por três anos, se muito. Se a maioridade penal for reduzida para 16 anos esses crimes passarão a ser cometidos por meninos e meninas entre os 14 e 16 anos. Simples assim!
O que nos falta não são as soluções para os problemas. Elas estão aí, com todo mundo vendo. O que nos falta é vergonha na cara. Só isso e mais nada!