
A presidente Dilma Rousseff vetou uma decisão do Congresso que estendia a todos os aposentados e pensionistas do INSS o mesmo critério de reajuste praticado com o salário mínimo. E isso depois de o teto máximo de dez mínimos vir sendo achatado já faz alguns anos - hoje é de 6,2 mínimos - e o argumento usado ser a proteção da Previdência, que corre o risco de quebrar.
Isso não é verdade. A verdade é que a política atual levará a um achatamento cada vez maior dos pagamentos a ponto de, num futuro médio ou distante, todos ganharem o mínimo.
Mas a argumentação oficial é uma inverdade amplamente apoiada pelos meios de Comunicação, que evitam divulgar argumentos em contrário, embora eles se sustentem sobre bases sólidas, tanto do ponto-de-vista econômico quanto previdenciário. Não teria eu condições de fazer argumentação técnica nesse campo. Tomo emprestada a de Oswaldo Colombo Filho, presidente do Movimento Brasil Dignidade. Leiam. Embora um pouco longo o texto coloca luz na discussão. Uma luz que nos é negada quando os comentaristas econômicos donos da verdade falam sobre o assunto. Vamos a ele:
A Secretaria de Tesouro publicou os últimos resultados fiscais do ano de 2010, e assim segue uma breve análise das contas relativas ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS). O objetivo é apenas traçar considerações sobre os principais números, pois exame completo seguirá oportunamente ressaltando outras considerações, distinguindo correntes de pensamentos em relação aos resultados e efeitos produzidos aos beneficiários em ambos sub-regimes.
O saldo previdenciário “total” ou
consolidado do RGPS (sub-regimes Urbano e Rural), conforme apontado pelo
Tesouro foi negativo em R$ 42,9 bilhões. Cabendo ao RGPS Urbano o saldo
positivo de R$ 7,8 bilhões – arrecadou R$ 207,2 bilhões (+17% que 2009) e
despendeu R$ 199,5 bilhões (+10% que 2009). No sub-regime Rural, o saldo
previdenciário foi negativo em R$ 50,7 bilhões – arrecadou R$ 4,8 bilhões (+ 4%
que 2009) e despendeu R$ 55,5 bilhões (+13% que 2009).
O saldo final no fluxo de caixa do
INSS, incluindo as taxas de administração sobre outras entidades, apresenta
resultado positivo de R$ 4,7 bilhões; evidentemente fruto da resultante
auferida no sub-regime Urbano, e isso a despeito de outras considerações que
poderíamos tecer sobre a destinação da Cofins, CSLL (que foram criadas como
fontes de financiamento ao Orçamento da Seguridade e não ao Orçamento Fiscal) e
os consequentes efeitos subfatores da DRU; e que estão sempre em discussão
entre as correntes de pensamento socioeconômico voltadas ao do tema Previdência
Social no Brasil.
Vale citar sobre essas ‘correntes de
pensamentos’ que o “quadro demonstrativo” – resultado primário do governo
central – vem sendo apresentado de forma distinta desde fevereiro de 2009, nas
receitas, despesas, e saldos previdenciários para cada um dos sub-regimes já
citados. Mesmo assim, e diante de total clareza, um “grupo” de economistas,
autoproclamados fiscalistas, ou ainda denominados reformistas ou neoliberais,
peremptoriamente bancam a cantilena do déficit (resultado final) da “Previdência
Social”, citando e publicando números do que é o saldo previdenciário.
Não me estenderei sobre o que seja a
diferença linguística ou técnica entre déficit/superávit com o que seja saldo
previdenciário, mas friso que este último é uma espécie de ‘subtotal’ na
apreciação analítica das contas de um regime ou sub-regime previdenciário e sua
expressão numérica pode ser negativa ou positiva. Essa observação é importante,
pois os “neoliberais” tratam por déficit aquilo que tecnicamente é o saldo
previdenciário, e isso mesmo com o governo evidenciando a correta nomenclatura
em seus relatórios tal qual memorial de cálculo a que se dispõe o seguimento
lógico do texto constitucional.
Questionar a Constituição é um fato,
mas desconsiderá-la e propagandear esse ideário publicamente na composição de
contas e determinar erroneamente algo como déficit é no mínimo uma indecência
que leva a sociedade leiga a um entendimento difuso e errôneo sobre a questão.
A maioria deles sequer seria considerada reformista em lugar algum do mundo;
lobistas, ou talvez expressos conservadores do clientelismo e do
corporativismo, e assim qualificados pela resultante da Emenda 20/98 que
patrocinaram, assim como pela proposta da terceira reforma previdenciária que
já ofereceram ao governo anterior. Qual o intento dessas ações em que pese ou
possa alterar o comportamento da sociedade a integrar-se contributivamente ou
não ao orçamento da Seguridade Social? Há outra opção no mercado reservada aos
nossos cidadãos?
Propagandear contra a previdência
pública e desacreditá-la perante os jovens que ingressam no mercado de trabalho
foi e vem sendo o mais significativo dos feitos. Basta atentar para os
argumentos um ‘vendedor’ de um plano de previdência privada (produto do mercado
financeiro).
A abordagem inicia pelas “bombas de
efeito retardado” e que foram deixadas pelos “reformistas em 1998”: – # a
redução do valor inicial dos benefícios já quando requeridos e que pode chegar
a 40% (fator previdenciário); # em seguida, a própria base de cálculo do valor
do benefício médio; pois, os valores para base de cálculo, tomados desde 1994 e
mesmo ao público que recolhe sobre o teto pouco supera da média de sete
salários mínimos; visto que, mesmo sendo possível pela legislação vigente, o
governo promulga o teto abaixo do mínimo possível (dez salários mínimos) –
atualmente recolhe sobre 6,8. Lembrando que o valor decorrente deste cálculo
será oferecido ao fator previdenciário se cabível for. A fixação do
recolhimento abaixo do que a legislação faculta, e isto tão somente aos
trabalhadores (os mais interessados) posto que os empregadores já recolhem pelo
total, versa por mais uma graciosa contribuição governamental ao clientelismo e
um dano enorme à seguridade, e que ninguém contesta.
Na sequencia, o “vendedor” do produto
do mercado financeiro orienta ao seu cliente em potencial, ao obter o vínculo
empregatício via pessoa jurídica – “regime fiscal simples”, e assim a execução
do recolhimento mensal à previdência pública se efetiva pelo mínimo, e à
previdência privada por quantia que ele queira.
No Brasil, o peculiar “regime fiscal
simples” versa por uma renúncia fiscal (tal qual existe similar em todo mundo),
mas aqui se estende a renúncia previdenciária e que resulta em mais de R$ 10
bilhões/ano aos cofres do INSS. Na Europa, não importa o regime ou vínculo do
contrato de trabalho do indivíduo; o recolhimento à Seguridade é compulsório a
todos os trabalhadores, regulados ou não por qualquer forma de contrato de
trabalho e em qualquer atividade, e a incidência sempre pela maior base
disposta e parametrizada sobre os rendimentos mínimos mensais e/ou semanais.
Há países em que o mínimo do
empregador (cota patronal) supera inclusive o mínimo pago em salário efetivo.
Também por lá ninguém mistura renúncias fiscais com previdenciárias. Não
colocam mentecaptos e muito menos lobistas para cuidar da Seguridade Social;
isto é aberração, tal qual o é acatar a tese da miscelânea do Orçamento Fiscal
com Orçamento da Seguridade; – diriam os nossos experts já supracitados – “é
apenas uma questão contábil”. Por lá, crime previdenciário não é apenas
imputado ao empregador-sonegador, mas também a trabalhadores que não recolhem
sobre atividades autônomas e esporádicas. Sem dúvida nenhuma, este é um dos
motivos para que a saúde pública seja gratuita e incomparavelmente melhor do
que a nossa.
É assim que desejamos construir um
país em bases sólidas? – Uma sociedade justa e próspera a todos? – “Passando a
perna no orçamento da Seguridade Social”? Pessoas que assim agem tem moral para
contestar a volta ou não da
CPMF?
Em síntese, está mais do que em tempo
de que a discussão sobre o orçamento da Seguridade Social alce nível realístico
em nossa sociedade. Não falamos mais ou somente de números quando
insistentemente e irrepreensivelmente pelas autoridades e com clara
conveniência contesta-se abertamente Constituição; suprime-se o estado de
direito na tramitação de Projetos de Lei; tratam-se direitos pecuniários
advindos de crédito contributivo como um sendo um favor do Estado e não uma obrigação
a quem concorreu como contribuinte por décadas.
Regendo essa ópera bufa indubitavelmente o clientelismo se favorece e
contra isso que a sociedade e seus representantes devem agir em defesa do
orçamento da Seguridade Social; ou seja – Previdência e Saúde Pública. Não
vimos isso nos últimos 25 anos de governo, quiçá, e assim desejamos que a
presidente Dilma Rousseff assuma firme papel no comando dessa cruzada.
Certamente, não faltará quem lhe
apoie.