Era um final de tarde do último sábado e vi quando uma senhorinha na casa dos 60/65 anos parou diante do conteiner de lixo do prédio onde moro. Carregava uma sacola plástica, um carrinho de compras e uma espécie de mochila. Remexeu nosso lixo e não encontrou nada que a interessasse. Então eu a fotografei indo em direção ao prédio do lado (veja a foto), onde fez o mesmo e aí, sim, colocou alguma coisa entre seus pertences. Usava lenço na cabeça e andava com certa facilidade, mas vive do lixo das moradias daqueles que têm casa.
Só hoje publico a foto porque leio na coluna de Abdo Filho, jornal A Gazeta, que os supermercados têm 6 mil vagas não preenchidas em seus quadros, mas não conseguem contratar. Por que será? Um amigo meu, Lino Geraldo Resende, jornalista também, trabalhou anos para a ACAPS (Associação Capixaba de Supermercados) e pode apresentar algum tipo de luz no fim do túnel: a jornada de trabalho vai de oito a dez horas diárias e, mesmo com horas extras, não atrai. Poucas vezes as pessoas têm folga nos finais de semana e muitos recebem apenas o salário mínimo. Também não se tolera mais a escala 6X1, com seu viés escravagista. Ou seja, trabalhar na informalidade dá mais dinheiro e não obriga a muita coisa. Claro, a pessoa fica sem INSS, Fundo de Garantia, etc.
Houve uma época em que a rede Perin conseguia trabalhadores até mesmo de outras empresas do ramo porque suas lojas não abrem aos domingos. Mas agora nem isso e mais incentivos oferecidos atrai muita gente. E tem mais: os empresários do ramo supermercadista acham que o Bolsa Família atrapalha. Não são só eles: o empresariado brasileiro de maneira geral critica qualquer tipo de ajuda aos pobres. Não é verdade que o Bolsa Família tire gente da formalidade do trabalho, mas num quadro de falta de gente para trabalhar é preciso aumentar a remuneração e oferecer até treinamento. Eles não gostam...
Só que estamos falando de trabalhadores que estão no mercado e os moradores em situação de rua não estão. Um trabalho para eles devolve-lhes parte substancial da dignidade perdida com a vida nas calçadas ou então recolhendo lixo em conteineres de prédios. É possível reverter isso. O poder público como as prefeituras, por exemplo, pode tirar as pessoas das ruas com ofertas de trabalho. Em parceria com a ACAPS ou outras associações de empresários em busca de empregados, elas podem ministrar treinamento, tratamento antidroga quado for o caso e uma atividade remunerada que dignifique. Um plano de carreira pode e deve ser mais um elemento chamariz para os diversos segmentos sociais. Por que não fazer isso?
Hoje as prefeituras, como a de Vitória mais uma vez servindo de exemplo, oferecem apenas o retirar das ruas, lugar para um banho, uma refeição, cama e algum afeto. Não basta. Ninguém é feliz vivendo de crack, mas as pessoas abandonadas à própria sorte precisam ao menos de um horizonte de médio prazo. E isso elas não têm hoje. No bairro onde moro, em Vitória, há um grande número de moradores em situação de rua que pelo menos a mim geram uma trieteza imensa. Essas pessoas merecem ter dignidade mesmo num país onde um dos Poderes, o Legislativo, age diariamente de forma amoral, desonesta e visando apenas seu próprio nariz, talvez até mesmo em conluio com o crime organizado.
É possível tirar aquela senhorinha da rua. Ela merece. Se há vagas, há esperança.
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