Tenho muitas histórias para contar da época da ditadura militar na vida dos jornais. Havia censura todos os dias, sim. Brava. E muita gente morreu depois de sofrer prisão ilegal e tortura. Só para ilustrar, hoje a vou falar de duas pessoas muito bacanas. Os irmãos Eugênio (foto ao lado) e Darcy Pacheco de Queiroz eram diretores do jornal A Gazeta (aquele que era de papel, vocês devem se lembrar...) e cunhados do principal proprietário da empresa, Carlos Fernando Monteiro Lindenberg, que se casou com as duas irmãs deles. Quando a mais velha morreu, pegou a mais nova...
"Seu" Eugênio, como o chamávamos, cuidava da parte administrativa da empresa. E de parte da interface com o público principal, político. Quando morreu, meu amigo jornalista Paulo Maia chorou muito no velório. Maura Fraga, outra amiga jornalista registrou o fato dizendo que nunca havia visto o Paulo chorar antes de ele ver o corpo "daquele homem sincero". E era assim mesmo.
Na campanha pela legalidade do PCB, botei um cartaz "PCB LEGAL" numa das paredes redação, então já na Rua Chafic Murad. No dia seguinte "Seu" Eugênio me esperava na porta: "Seu Álvaro, mandei tirar o cartaz do Partido Comunista da redação. Mas tirei também os cartazes da Arena. Quero evitar discussão política aqui dentro". Eu simplesmente dei um abraço naquele homem sincero.
Tempos antes disso, ainda na sede da Rua General Osório, Aninha, que era a pessoa encarregada de fazer e servir o cafezinho, entrou na redação e disse: "Chico Flores, Luiz Rogério Fabrino e Álvaro Silva. O general está chamando vocês na sala dele". Lá fomos nós para ver o Diretor Responsável.
Chegando lá havia um coronel do Exército sentado diante do general. Ao lado, dois ordenanças. Darcy, que adorava minhas piadas de sacanagem, olhou para nós e disse: "Gente, o coronel Fulano está chegando do Rio para assumir o 38 BI. E está preocupado porque soube que há membros do Partido Comunista na nossa redação. Vocês, editores, sabem de alguma coisa sobre isso?"
Luiz Rogério disse que jamais havia ouvido falar desse caso. Chico jurou que se encontrasse comunista denunciaria na mesma hora. Eu falei: "Sou editor de esportes, general. Não sei nada de política". O general olhou então para o coronel, que disse: "Estou convencido, general Darcy. E menos preocupado". Ato contínuo levantou-se e saiu junto com os ordenanças, cumprimentando-nos formalmente e apenas de passagem.
Nós rimos muito após sair da sala. Os três membros do PCB na redação de A Gazeta éramos nós mesmos, Chico, Luiz Rogério e eu. E Darcy Queiroz sabia disso muito bem. Muito bem mesmo...
No dia seguinte eu entrava na empresa para trabalhar e cruzei com o general que saia para almoçar. Dei um sorriso e disse:
- General, o senhor é um cara de pau!
Ele devolveu o sorriso e completou:
- Eu? Cara de pau é você!
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