Aconteceu há muitos anos. Eu era garotinho.
Havia (ou há) em São Paulo um jardim japonês chamado Nippon Sol. Nós o frequentávamos. Meu pai e minha mãe gostavam de ir lá passear, tomar chá, respirar um ar oriental. Se deliciar com o ambiente e os filhos pequenos.
Seu Japa (vamos chamá-lo assim porque não me recordo do nome) trabalhava no lugar e era casado com Dona Japa. Moravam ambos nas proximidades.
Um belo dia Dona Japa não apareceu mais. Sumiu. Os vizinhos procuraram saber o que havia acontecido e foi explicado a eles por Seu Japa que ela voltara para o Japão. Saudades da família, da terra, da realeza, acreditaram todos.
E o tempo passou. Cerca de dois anos.
Um belo dia a garotada jogava futebol na rua. A bola caiu na casa de Seu Japa. Um dos meninos que foi buscá-la aproveitou para olhar pela janela. Pela janela do quarto. E viu Dona Japa deitada na cama. Linda, de branco.
Correu para avisar a mãe da novidade da volta da amiga japonesa. A moradora esperou por Seu Japa e disse que gostaria de rever a antiga vizinha. O japonês ficou lívido. Disse que aquilo era mentira, a mulher havia ido realmente embora, os garotos estavam vendo fantasmas, eram bisbilhoteiros e mal educados. Bateu a porta na cara de todos.
A vizinha deu uma bronca no filho. Puxou as orelhas dele. E o colocou de castigo. Mas o garoto não se deu por vencido. No dia seguinte, depois que Seu Japa saiu, foi novamente olhar pela janela. Estava lá Dona Japa, deitada na cama. Falou novamente com a mãe e esta, fofoqueira-mor da rua, não se conteve e foi olhar também. Viu, como o menino, Dona Japa languidamente dormindo.
Quando Seu Japa chegou uma comissão o esperava. Queriam ver a esposa dele. Transtornado, o japonês bateu a porta na cara dos vizinhos mais uma vez. Só não pôde bater na cara dos policiais que, mandado à mão, chegaram um ou dois dias depois.
E estava lá Dona Japa, deitada na cama, competentemente conservada no formol. Seu Japa, que além de trabalhar no Nippon Sol era brilhante técnico em taxidermia e sabia tudo sobre embalsamamento, não se comformara com a prematura morte da mulher, que tivera um fulminante ataque cardiáco. Durante os dois anos, foi dia após dia, noite após noite, ele foi cuidando do cadáver. Na época em que terminou sendo descoberto, Dona Japa era uma obra de arte de conservação. Parecia a mesma japonezinha meiga do dia do casamento.
Com todo amor para dar...
Seu Japa foi preso. As autoridades, descrentes do amor eterno, levaram embora o corpo dela. Enterraram-no dias depois, ainda durante o bafafá que a imprensa fez sobre o caso.
De Seu Japa ninguém mais ouviu falar. E o assunto se tornou tabu no Nippon Sol, lugar onde, de coisas estranhas mesmo, só se continuou a produzir os bonsais, aquelas lindas minuaturas de plantas que até hoje emocionam as pessoas.
Principalmente porque são plantas vivas.
3 comentários:
Oi pai!!Nossa,muito legal seu blog,parabéns,está bem melhor que o meu que aliás está meio abandonado.
Ficou muito bonito e a história do japonês é realmente ótima rss.Só acho que a Senhora Japa deveria estar em um museu em homenagem aos japoneses que moram aqui rs.
Vou colocar o endereço do blog aqui nos meus favoritos pra quando eu quiser ler não ter dificuldades de achar.
Bjos.Te amo!
muito bonita a sua história
só,falta posta mais agora...
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