15 de abril de 2025

Anistia nunca mais


O PL da anistia que se pretende aprovar no Congresso Nacional nos dias atuais, e com forte apoio do Partido Liberal, também PL e legenda de aluguel de Jair Bolsonaro, é inconstitucional, irresponsável, inconsequente e, por tudo isso, criminoso mesmo com a maquiagem que está sendo feita hoje no texto original. Não pode prosperar de forma alguma e já sofre forte rejeição de vários setores da sociedade civil como mostram as últimas pesquisas feitas pelos maiores institutos.

O Brasil, em sua história republicana, é uma sucessão de golpes de Estado, tentados ou concretizados. Isso começou com a deposição do imperador D. Pedro II, teve um episódio doloroso com o golpe de Getúlio Vargas e seu Estado Novo em 1930, continuou com o 1º de abril de 1964 (foto acima) e agora vive outra tentativa de destruição de nossa frágil democracia com os fatos de 08 de janeiro de 2023. É demais, não é?

Em 1956 o Brasil viveu tentativa de golpe que teve como epicentro a cidade de Jacareacanga, no sul do Pará, além de outras próximas (na foto, um DC-3 da FAB pousado em Jacareacanga para apoiar a aquartelada). Durou 20 dias e somente depois de muita negociação foi contornada. Juscelino Kubstschek, o JK, presidente eleito de então, recebeu muita pressão para anistiar os golpistas daquela ocasião e fez isso acreditando que seu perdão traria paz política ao Brasil. Oito anos depois, em 1964, boa parte daqueles que tomaram parte da Revolta de Jacareacanga estavam entre os militares que depuseram o presidente João Goulart e iniciaram uma longa ditadura de 21 anos em nosso país.

Esse tipo de anistia não promove a reconciliação das facções em disputa, não faz com que o país se una em torno de sua Constituição, não promove a paz e nem ao menos a justiça social porque é comandada por uma elite que só pretende manter seus privilégios intocados. Isso é apenas um capítulo de impunidade cujo resultado todos prevemos porque já o vivemos antes. Até os mais jovens têm conhecimento disso.

O  movimento do Congresso Nacional, que pretende fazer passar uma PEC criminosa tem que ser detido logo, antes mesmo de um veto presidencial ou uma barração pelo Supremo Tribunal Federal. E não com a força das armas, como sempre foi feito no Brasil, mas sim pela autoridade das leis em vigor. É inconstitucional e isso basta. Visa sobretudo e principalmente apagar com um mata borrão os diversos crimes praticados por um saudoso da ditadura, um admirador de torturadores, um político de terceiro escalão, do baixo clero do Legislativo e que nunca fez nada de útil ao Brasil além de conspirar, conspirar e conspirar.

Chega. Anistia, não!

11 de abril de 2025

Folha com sangue 2


Nos dias que antecedem a exibição do documentário "Folha Corrida", que conta os crimes cometidos pelo Grupo Folhas, de São Paulo, é preciso ir mais adiante no assunto porque a crônica postada ontem está longe de o esgotar. Estamos falando da década de 1970, quando ser preso ilegalmente, torturado e assassinado pelos órgãos de repressão política da ditadura militar era muito fácil. Vários brasileiros caíram e cerca de meio milhar morreram na garras dos porões repressivos. E ser jornalista não dava passaporte a ninguém, a não ser para terminar no lugar mais sujo e violento dos cárceres nazifascistas.

Ninguém naqueles anos sabia o que um dia seria a internet. Nós, os correspondentes, escrevíamos nossas matérias em laudas de papel, nas máquinas de escrever, e depois levávamos esse material para ser digitado em uma agência dos Correios, no meu caso na Agência Central, que ficava ao lado da Praça Oito de Setembro. Lá o diretor Aderson de Brito Inglez Bonates, pai do hoje psiquiatra e jornalista Paulo Bonates, facilitava a vida de todos e pedia a um funcionário que digitasse o material e o transmitisse rapidamente, via teletipo, para as redações dos jornais. Dessa forma, era o próprio aparato tecnológico de então do governo que nos ajudava. Uma doce ironia...

A gente podia também passar informações por telefone, mas era perigoso. Um perigo chamado "grampo", e não valia a pena correr o risco de ir parar no pau de arara. Quando alguém precisava muito falar, o fazia por códigos vários. Reuniões do PCB, por exemplo, só em lugares sem suspeitas. Como aconteceu num colégio da Ilha do Príncipe ou na ginecologia do Centro de Saúde de Carapina. Lá descobrimos porque uma das mesas tinha duas "pernas" articuladas e que eram abertas para exames. Os médicos do Partidão, cujos nomes ainda se omite, tinham as chaves desses lugares e eles eram os mais seguros.

Revejo na memória o dia em que o velho comunista Vespaziano Meireles, o Meirelinho, se deparou comigo numa reunião dessas. Levou um susto antes de abrir sorriso de orelha a orelha. Era o encanador da casa dos meus avós e jamais poderia imaginar o neto do patrão comungando dos mesmos ideais da militância operária. Velho militante comuna, havia sido craque do Rio Branco com o nome de Parafuso e tinha orgulho de ter conseguido formar os filhos, um dos quais era excelente médio e cirurgião neurológico em Colatina.

Mas voltemos ao assunto. A gente sabia que jornais como a Folha apoiavam a ditadura. Mas não a ponto de serem pombos correios do sistema repressor, ajudando até mesmo na prisão de jornalistas. Que o inferno, se houver, tenha os Frias no seu lugar mais quente. E não é por outro motivo que carros da empresa foram cercados e queimados quando se descobriu que eles eram usados com essa finalidade (foto acima). Até mesmo naquela época havia reação contra as violências governamentais, apesar de todos os perigos.

Por isso é de grande importância o trabalho de dois anos que o grupo liderado pelo diretor premiado Chaim Litewiski realizou para concluir o trabalho "Folha Corrida", que conta toda a história vivida no período ditatorial pela empresa da Rua Barão de Limeira, centro de São Paulo. Os quatro capítulos da obra serão exibidos no domingo dia 27 deste mês às 20 horas pela plataforma ICL. É o retrato de uma época na qual mais de 80 empresas colaboraram com a ditadura militar brasileira, algumas como a Volkswagen, Ford, Kodak, Caterpillar, Toyota, Brastemp, Johnson's do Brasil, Embraer, Petrobrás e inúmeras outras, que a lista é grande. Responsável, esse documentário é fruto de pesquisa conduzida por seis universidades: UFRJ, UFRRJ, UEM, UERJ, FCRB e PUC e levará quem o assistir aos bastidores da repressão, aos anos de terror que o Brasil viveu faz pouco tempo e para os quais não quer voltar nem com anistia, como na (acima, na segunda foto).

Não devemos perder esse tempo atual com os devaneios criminosos da nova extrema direita brasileira que se esconde nas sombras, saída dos esgotos onde dormitou por um longo período de tempo. Ela não se compara nem em sombra ao que houve antes. Recordo-me agora e até com saudades de fatos passados na redação de A Gazeta, a da antiga Rua General Osório, 127. Numa determinada época Carlos Fernando Monteiro Lindenberg Filho, o Cariê, convidou para ser diretor do jornal José Antônio de Figueiredo Costa, o Zé Costa. Era preciso haver um "vaselina" na empresa para proibir publicações passando a mão na cabeça, como se desse conselhos. Coisa que aquele Diretor Executivo de então não fazia bem.

Um dia o secretário de redação Chico Flores ficou em dificuldades porque queria no jornal material sobre a questão da região do contestado Espírito Santo/Minas Gerais, assunto litigioso que vira e volta retornava como tema, e o editor de Política, Gutman Uchoa de Mendonça, já tinha ido embora. Eu havia enviado matéria sobre isso para a Folha de S Paulo na véspera e Chico me pediu as laudas emprestadas para "refundir" e usar em A Gazeta. Entreguei. Horas depois, indo embora da redação para o encontro protocolar com os amigos no Britz Bar, fui abordado por Zé Costa: "Meu filhinho, não repara, mas sua matéria não vai sair". Eu apenas sorri. As opiniões contidas no texto e dadas por entrevistados eram contrárias ao que a empresa da família Lindenberg pensava sobre esse espinhoso assunto. Era essa uma forma indolor - e rara - de censura jornalística.

10 de abril de 2025

Folha com sangue 1


Trabalhei como correspondente da Folha de S Paulo durante os tempos duros da ditadura militar brasileira. Era contratado informalmente pela "Agência Folhas Interior Estados", a figura jurídica que permitia à Empresa Folha da Manhã S/A usar material jornalístico em todos os sete jornais da rede de então, seis de São Paulo e um de Santos, pagando um único pró labore. Meu dileto amigo Rogério Medeiros era o correspondente de O Estado de S Paulo, e este usava os colaboradores para abastecer a Agência Estado. Trabalhando em A Gazeta eu recebia todos os dias o material dessa agência e conseguia identificar vez ou outra as matérias feitas pelo velho Rogério. Os jornalistas têm "impressão digital" em seus textos.

Eram os tempos da censura a tudo. Em O Estado havia censores dentro da redação e quando um material era retirado publicava-se receita de bolo ou trecho de poesia clássica no lugar. Em outros, como o que eu trabalhava, um serviçal da Polícia Federal passava lá todos os dias para entregar a lista das matérias censuradas. O Globo tinha em Roberto Marinho o diretor de redação que não permitia à ditadura se meter na redação. Mas a apoiava. Também eram aliados do regime jornais como o Jornal do Brasil, Estado de Minas, Zero Hora e muitos outros da chamada "Grande Imprensa". Uns mais, outros menos. Hoje, quando se sabe que a Folha ultrapassou todos os limites da falta de dignidade humana isso é muito triste. Só não é inacreditável.

É preciso dizer que nós, correspondentes, não participávamos em nenhum grau dos modos de apoio ao regime militar. A não ser quando éramos informados de que determinada matéria havia sido retirada por "ordens superiores". Em todos os dias, afora raras pautas de iniciativa se o assunto era muito importante, recebíamos ordens das redações e cobríamos fatos. Ninguém era mal informado para desconhecer que a ditadura prendia ilegalmente, torturava e matava. Tomávamos cuidado. Para quem participava de partido proscrito as reuniões eram sempre cercadas de muito cuidado, mas ninguém em momento algum deixou de lutar pelo fim da ditadura militar, o que veio apenas em 1985, após 21 anos do 1964.

O documentário "Folha Corrida", que conta em quatro episódios a história dantesca do jornal para o qual trabalhei, era algo que precisava ser feito. A família Frias, dona daqueles meios de comunicação, cometeu uma série imensa de crimes. Como os artífices das tramas já estão mortos, resta contar a história, o que vai ser feito a partir de maio pela plataforma ICL. Já está havendo pre-estreia e depois da plataforma outros meios divulgarão o resultado do trabalho. Documentos não faltam, imagens também. Vai ser possível saber que durante a ditadura carros de distribuição de jornais do Grupo Folhas eram usados para transportar tropas de choque e policiais que prenderiam ilegalmente, torturariam e matariam brasileiros nos porões da ditadura. Não podemos perder o documentário.

É por isso, dentre outras coisas, que muita gente como eu sente nojo quando ouve a extrema direita atual, descendente da daqueles tempos, pedir "liberdade de expressão" ao falar sobre os demais fascistas atuais. É muito triste ouvir certo débil mental eleito deputado federal pelo Espírito Santo dizer que quer ver morto um presidente da República sem que nada aconteça com ele. É triste ver essa gente desfilando sua até agora impunidade como se não houvesse amanhã. E até mesmo em entidades culturais. Chega a dar arrepios.

Mas também vontade de seguir lutando.  

8 de abril de 2025

A cota do fim do mundo


De repente, não mais que de repente, surge no Brasil mais uma denúncia de corrupção envolvendo um órgão público do Governo Federal. E como sempre a Codevasf, ou Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, empresa criada pelo Estado para permitir roubo de dinheiro do erário. Não tem outra função. E para permitir que caibam nela todos os projetos e ambições sobretudo do Centrão, essa anomalia política brasileira, tem nada menos que 17 unidades administrativas e 16 superintendências regionais. Uma enormidade de cargos e mesmo assim sai briga lá por espaço político.

Agora o alvo é José Juscelino dos Santos Rezende Filho, médico maranhense filiado ao União Brasil, partido do Centrão, deputado federal e ministro das Comunicações, assunto do qual não entende rigorosamente nada. Ele está sendo acusado de desviar dinheiro de emendas parlamentares ligadas às suas atividades na Codevasf do Maranhão, e com muita "classe": a partir de organização criminosa e lavagem de dinheiro. Juscelino já foi pego utilizando aviões da FAB para assuntos privados "por segurança" e outras coisitas menores. Entende de malandragem com recursos do erário e de muito mais, exceto de Comunicação. Tanto que para melhorar a imagem do governo o presidente Lula chamou para perto dele o publicitário Sidônio Cardoso Palmeira, hoje ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social do Brasil. Entenderam como isso funciona?

Sempre houve corrupção no Brasil quando a política se acercou dos governos. Durante os quatro anos de Jair Bolsonaro ele entregou a administração pública ao Centrão para não sofrer impeachment, pois havia mais de 100 pedidos no Legislativo. E esse monstrengo politico fez uma grande festa, inclusive com o crescimento desmedido, inacreditável das emendas parlamentares que chegaram hoje a mais de CR$ 50 bilhões para júbilo de Juscelino e muitos outros. Para apoiar ou então não derrubar o governo o Centrão cobra espaço para ficar lá dentro, de preferência com todos os cargos ministeriais à disposição, a tal "porteira fechada" que permite desviar muito mais dinheiro público. Fome é isso!

Lula teve que atender a várias cotas para montar seu ministério com capacidade mínima de gestão e risco menor de impeachment, pois governa com um Legislativo hostil e um "mercado" que gostaria de vê-lo morto. Juscelino é cota do Centrão, mas hoje o dano que provoca - sempre foi corrupto, todo mundo sabe disso e agora a Justiça está em seu pé - é grande demais. Felizmente ele revelou no início desta noite que vai embora "se defender". Excelente. Lula sabia que precisava mandá-lo embora rapidamente, não importando quem vai entrar depois, não importando se com ou sem o aval do União Brasil pois ,caso contrário, estaria na alça de  mira da cota do fim do mundo. Essa da qual Bolsonaro se salvou. 

6 de abril de 2025

O ato patético


Enquanto escrevo esse artigo, os milhares de manifestantes pró-Bolsonaro que foram à Avenida Paulista nesse domingo pedir anistia para o ex-presidente e seus asseclas golpistas (foto) ouviram ou ouvem várias pessoas falarem as mesmas mentiras em nome da não punição de crimes cometidos no dia 08 de janeiro de 2023, mas sobretudo e principalmente um longo discurso de encerramento da manifestação feito pelo ex-presidente que joga todas as suas fichas na aposta desse perdão - o que só é concedido a culpados -, a única fórmula que talvez o mantenha fora da prisão nos próximos anos. Foi patético.

Num esforço de inversão de fatos que talvez nunca tenha sido visto antes no Brasil de tantas surpresas, o ex-presidente genocida e inelegível, ao lado até de governadores que o apoiam, chegou a dizer que "só um psicopata para falar que o 08 de janeiro foi um golpe". Não foi apenas e tão somente porque as Forças Armadas brasileiras se recusaram a aceitar participar dessa aventura. De mais uma. Gato escaldado tem medo de água fria...

Há carradas de provas nos autos dos processos que correm no Supremo Tribunal Federal mostrando o que se tentou fazer. E aquele 08 de janeiro foi apenas o ápice, ato final de um plano monstro de golpe de Estado que começou a ser engendrado no mesmo dia em que o ex-presidente tomou posse quatro anos antes, pois jamais foi intenção dele deixar o poder. Ao contrário, seu projeto era o de se perpetuar com a ajuda das Forças Armadas. Essas mesmas que literalmente o expulsaram da corporação do Exército depois dos vários crimes que cometeu lá. Todos os que o acompanharam desde o início da aventura da presidência sabiam e sabem disso.

No trio elétrico do ato da Paulista estavam os governadores que dependem do apoio desse indivíduo para concorrer ao Planalto em 2026. Precisam daquele percentual de votos do gado bolsonarista que vai acompanhar esse Bozo até a sepultura, caso precisem. Cerca de 25 por cento. Só assim eles podem enfrentar o atual presidente Lula numa disputa nacional com chances de vitória. O dono da festa sabe disso e usa seus apoiadores como bem entende. Sempre usou.

Ao lado do carro de som havia na Paulista, dos dois lados, duas quadras tomadas por apoiadores da extrema direita. Segundo levantamento do Data Folha, feito de forma profissional, cerca de 45 mil manifestantes, o que mostra que Bolsonaro desidrata a cada dia que passa. Muito pouca gente para eleger um presidente, mas número capaz de fazer bastante barulho. Só que não o suficiente para transformar o Brasil, oficialmente, no País onde o crime político compensa. Nem mesmo quando se pretende tomar da figura de uma criminosa golpista para transformá-la na pobre diaba vitimada pela sanha assassina daqueles que não permitem o uso de batom em manifestações de protesto. Parece piada!

3 de abril de 2025

O Rolex de ouro

Houve um pedido dos senadores reunidos hoje com o presidente Lula na casa da presidência do Senado, em Brasília: a recriação por parte do governo do Ministério da Segurança ou qualquer coisa parecida com esse nome. Uma exigência para diminuir a pancadaria que em parte está jogando para o chão o prestígio pessoal do presidente. Além de o Brasil já ter ministérios em excesso isso preocupa por causa do que ter um aparato de segurança nacional lembra à maioria de nós. No meu caso, recorda um grande Rolex de ouro igual ao da foto acima.

O Brasil havia vivido, em1964, o golpe de Estado que tirou do poder o presidente João Goulart fazia pouco tempo e meu pai, Nelson de Albuquerque Silva usava para todos os atos um relógio dessa marca, bordas em ouro 24 quilates, comprado na época das vacas gordas da família. Amava sua joia e um dia chegou em casa do trabalho sem ela. Depois o vi dizer perto de minha mãe que o havia perdido. Não se falou mais no assunto. Era tema proibido dentro da nossa casa. 

A ditadura aconteceu há 61 anos e lá pelos idos de 1990, com o velho já vivendo em Vitória, provoquei o assunto e veio a história. Papai era dono da Thermoflux, fundição de alumínio que ficava no bairro da Mooca, em São Paulo, onde fabricávamos peças de motor de Simca. Um belo dia meu pai tirou o relógio para limpar as mãos, colocou-o sobre a bancada e não o encontrou mais ao voltar. Procurou, procurou e chamou a Polícia. O delegado ouviu os empregados um a um e depois falou com o velho Nelson: "Tenho três suspeitos e se eles forem comigo para  delegacia o relógio aparece. Só não sei se o ladrão volta vivo e também como vou fazer para proteger o senhor depois disso. Esse povo é daqui e barra pesada". Ele ouviu mamãe e mandou deixar para lá. Os suspeitos foram demitidos algum tempo após.

Décadas depois, na conversa que tive com ele ouvi de meu pai que ficou com receio de deixar a mulher viúva com cinco filhos pequenos. O delegado, conhecido ou amigo de Sérgio Paranhos Fleury, sabia como obter confissões rápidas e dolorosas. Eu disse: "Então você sabia como tudo acontecia, mesmo sendo politicamente de direita?" Ele balançou a cabeça afirmativamente. "Mas eles achavam que aquilo era necessário. Enfim..."

Trago esse fato à memória numa época em que  extrema direita política brasileira é muito mais violenta, inconsequente e irresponsável do que antes. Além do que, não tem respeito pelo Estado Democrático e de Direito, como mostram os fatos de 08 e janeiro de 2023. E a nossa democracia foi obra de muito trabalho. Os canalhas atuais não podem encontrar um caminho para tentar outra aventura como a de 64. Esse ministério proposto jamais deve servir como atalho para a canalhada fascista. Ele precisa ser cercado de cuidados!  

27 de março de 2025

Cheirando fumaça de óleo diesel

Ontem, dia em que um ex-presidente da República e outros sete asseclas, a maioria deles militares, se tornaram réus por diversos crimes junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), pela primeira vez oficiais de Estado Maior das Forças Armadas do Brasil julgados por um tribunal civil, há clima de calma no nosso país. Aquela calma que antecede a reparação por um grande crime cometido. Aquela calma que dá a todos a quase certeza de que brasileiros não mais conviverão com a impunidade absoluta. Não mais viveremos cheirando fumaça de óleo diesel como aconteceu em um passado recente.

No dia da condenação desse ex-presidente inelegível e genocida, dois ministros do STF, Carmen Lúcia e Flávio Dino disseram em seus pronunciamentos de aceitação da denúncia da PGR, que "ditaduras matam". E matam mesmo. Flávio Dino ainda explicou que podem não matar no mesmo dia, no mesmo mês, no mesmo ano. Mas matam. E isso é uma verdade incontestável.

Em 14 de junho de 1971, sete anos depois da implantação da ditadura e em plena vigência do AI5, Stuart Edgar Angel Jones (foto), 25 anos de idade, foi supliciado e morto na Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Depois de espancado e torturado, acabou amarrado a um jipe militar de motor ligado, com a boca dentro do cano de descarga. Arrastado pelo pátio da instalação militar, esfolado vivo, a boca totalmente queimada e cheirando fumaça de óleo diesel como diz a música "Cálice", teve também os pulmões destruídos. Estava descarnado. Gemendo e pedindo água, morreu sem assistência alguma. Havia ficado três dias escondido na garagem de remo do Flamengo, clube pelo qual torcia, remava e havia sido campeão, pouco antes de ser preso. Sua mãe, a estilista Zuzu Angel, passou longo tempo tentando localizar o filho até ser ela também assassinada por agentes da ditadura militar em um acidente forjado.

Stuart fazia parte de grupo paramilitar de contestação da ditadura. Então, se isso era crime, que fosse preso, processado, condenado e forçado a cumprimento de pena. Hoje mesmo o ex-presidente que adora a ditadura, as torturas, homenageou torturadores durante seu mandado e já disse mais de uma vez que, podendo, fecharia o Congresso, o STF e governaria de forma despótica como fizeram seus ídolos ditadores, responde a vários processos. Ele foi assassinado? Não, está sendo julgado na forma da lei. Acusa o Judiciário brasileiro de ser uma ditadura enquanto anda de jetski, discursa, aglomera pessoas nas ruas, ataca a todos e ainda promete voltar a infelicitar-nos. Que beleza de ditadura, essa!

No primeiro dia em que a Primeira Turma do STF se reuniu para a apreciação do caso dele e de sua quadrilha, estava presente. Quase a seu lado, na primeira fileira de poltronas destinadas a advogados e outras pessoas credenciadas ficaram Hildegard Angel e Ivo Herzog, respectivamente irmã de Stuart e filho de Vladimir Herzog, o jornalista que se apresentou voluntariamente para depor no Exército, em São Paulo, e foi assassinado sob tortura logo em seguida. Hildegard e Ivo foram os heróis daquele dia. Conseguiram passar um longo tempo ao lado de um sociopata assassino, às vezes olhando para ele, sem sequer vomitar.          

25 de março de 2025

"Sem chão" estamos todos



A reação nazifascista veio rápida. Menos de um mês após a conquista do Oscar por parte da equipe que rodou "Sem Chão", colonos judeus israelenses atacaram Hamdam Ballal, um dos coprodutores do filme que denuncia os crimes de guerra de Israel em Masafer Yatta, pequena comunidade árabe palestina, e o deixaram ferido. Mas não foi apenas isso. O cineasta está desaparecido desde então. Segundo Yuval Abraham, outro produtor, foi necessário pedir uma ambulância para socorrer o ferido e então, diz Abraham "os soldados invadiram a ambulância que ele chamou e o levaram. Nenhum sinal dele desde então".

"Sem chão", documentário feito da forma como era possível fazer, com o uso de celular e outros meios precários, mostrou como foi realizada a destruição de Masafer Yatta por parte de militares israelenses. Os produtores foram Yuval, Hamdam, além de Basel Adra. Este último fez outra denúncia: "Estou de pé com Karam, o filho de sete anos de Hamdam, perto do sangue de Hamdam em sua casa, depois que os colonos o lincharam. Hamdam, co-diretor do nosso filme "No Other Land" (título original) ainda está desaparecido após ter sido sequestrado por soldados, ferido e sangrando. É assim que eles apagam Masafer Yatta".

O documentário é duro e mostra tudo o que foi possível ser mostrado, quase sem sangue escorrendo. Em meio a cenas com imagens tremidas porque os filmadores corriam enquanto filmavam, aparece um soldado de Israel atirando a queima roupa contra morador local que ficou ferido, tetraplégico e foi colocado numa caverna até morrer porque não era possível à mãe o tratá-lo convenientemente naquela situação. Outro foi ferido a bala por colono judeu diante de soldado de Israel que apenas viu a cena sem esboçar qualquer reação. Uma escola foi destruída por máquina com crianças dentro. Mas ao menos para mim o mais cruel foi ver um caminhão betoneira transportando concreto jogar sua matéria nos poços de água que abasteciam a comunidade, concretando a boca desses poços. Sem água ninguém sobrevive.

Todas as imagens lembram outros episódios, tais como o de Sabra e Chatila (foto à esquerda). Trata-se do  massacre de refugiados civis palestinos entre 16 e 18 de setembro de 1982, quando a milícia maronita executou mais de mil pessoas como retaliação pelo assassinato do presidente eleito do Líbano e líder falangista Bachir Gemayel, invadindo o campo de refugiados onde eles estavam e atirando indiscriminadamente em todos, inclusive mulheres e crianças, enquanto o Exército de Israel cercava o perímetro para que ninguém fugisse e sobrevivesse ao ataque.

"Sem chão" merece ser visto. A foto principal acima e que também ilustra o texto, tirada durante a filmagem, mostra um blindado de Israel em Masafer Yatta protegendo a destruição da comunidade. Isso foi feito enquanto judeus colonos de assentamentos que os israelenses vão implantando em terras ocupadas apenas olham para os endereços que "ganham". Se um único palestino, árabe ou não, matar um colono ou soldado israelense, ele vira "terrorista" na imprensa ocidental, inclusive na do Brasil. Mas não me recordo de ter visto um único colega da chamada grande imprensa rotular de terrorista soldado ou colono de Israel que promove esses massacres. E ELES SÃO!. Além disso, seu país é um Estado terrorista e genocida. 

22 de março de 2025

100 anos de horror revivido


Talvez não tenha sido Adolf Hitler o primeiro a descobrir o valor da propaganda no universo político, mas certamente foi ele quem explicitou melhor o tema e o colocou em seu livro Mein Kampf  (Minha Luta), que está agora completando um século após ser lançado na Alemanha em julho de 1925. Trata-se do maior compêndio já escrito sobre ódio, megalomania, antissemitismo, ressentimento, xenofobia, apologia da violência e outros "atributos". O autor acreditava estar iniciando o Reich de mil anos, mas só ficou no poder de 1933 a 1945. Pouco tempo? Não, o suficiente para exterminar milhões de vidas e gerar outros milhões de filhotes espúrios, como é o caso de Donald Trump e aqueles que vivem, por exemplo, no Brasil e à sombra do psicopata Jair Messias Bolsonaro.

Trump, em pouco tempo na presidência dos EUA tentou várias vezes enfraquecer a Justiça de seu país, inclusive com propostas de impeachment de juízes, no que é amparado por seu melhor assessor, o sul-africano Elon Musk. A extrema direita nascida com Hitler e Mussolini precisa de um Poder Judiciário atrelado e subordinado ao Executivo e Legislativo para poder prosperar. Isso hoje acontece em vários países além dos Estados Unidos, como é o caso da Hungria de Viktor Mihály Orbán. Os extremistas de direita não são capazes de governar em democracias, mas somente em regimes de poder extremo. Nesses eles podem inclusive desconhecer o Legislativo para deportar para prisões de El Salvador as pessoas que não querem lá em seu pais, sem consultar ninguém. O que está sendo feito hoje mesmo.

É atribuído a Hitler o pensamento de que "qualquer cabo pode ser um professor, mas não é qualquer professor que pode ser um cabo", pois ele foi cabo do Exército Alemão na Primeira Guerra Mundial. Notem a "coincidência": Eduardo Bolsonaro, hoje fugido nos Estados Unidos, disse que para derrubar o Supremo Tribunal Federal (STF) bastaria apenas um Jeep, um cabo e um soldado. Ele é um dos filhos do projeto fracassado de ditador de aldeia Bolsonaro, que chegou a capitão do Exército Brasileiro antes de se envolver com sabotagens e ser reformado para não acabar expulso da corporação. Já defendeu publicamente torturadores da ditadura militar 1964/85, cuspiu em um busto do deputado federal Rubens Paiva, ameaçou e xingou colegas parlamentares, além de outras aberrações.

Trump agora ataca o funcionalismo público dos EUA porque quer ver a plutocracia norte-americana tomando conta de todos os ramos de atividade de seu país. Quer acabar com a pesquisa científica e a educação pública, pois nada disso o interessa posto que pode vir a contestar suas "verdades". Bolsonaro fez igual no Brasil durante seus quatro anos de desgoverno, quando produziu trocas de titulares na pasta da Educação, por onde passaram de Abraham Weintraub e Milton Ribeiro. Na Saúde, onde interessava a ele contestar as vacinas e patrocinar a cloroquina como meio de combate à COVID-19, nomeou o general da ativa Eduardo Pazuello, autor da frase "um manda e o outro obedece".

O reich de mil anos durou 12, mas o suficiente para espalhar o inferno sobre a terra. Como por exemplo em Israel onde a extrema direita judaica comandada pelo neonazista Benjamin Netanyahu está promovendo o genocídio dos palestinos diante de um poder mundial incapaz de reagir para deter os crimes de guerra cometidos contra estes e o povo do Líbano. Isso reforça em quem pretende continuar a luta contra a extrema direita política aqui e em qualquer outro lugar, a certeza de que o poder político mundial ainda vai continuar a assistir por muito tempo de braços cruzados a esse genocídio sem sentido.  

Nos Estados Unidos e onde quer que a extrema direita se manifeste, existe a certeza de que o combate a essa gente não pode parar. Bastou um Bolsonaro no Brasil para que os fascistas tupiniquins, antes encastelados na Frente Integralista Brasileira (FIB) saíssem de seu esgoto para voltar a tirar o sono daqueles que lutam por um Brasil de todas as suas correntes de pensamento democrático. Agora até mesmo manifestações claramente nazistas são vistas em terras brasileiras, sobretudo e infelizmente no Paraná e em Santa Catarina. Se as forças democráticas brasileiras não permanecerem atentas o extremismo de direita continuará sua ascensão, inclusive com novos personagens como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que participou de discursos pró Bolsonaro num domingo para três dias depois fazer manifestação em São Paulo elogiando a Justiça Eleitoral. Eles são assim.                        

15 de março de 2025

Sarney e a democracia


No fim da vida e próximo de completar seus 95 anos o ex-presidente José Sarney (foto) tem dado algumas entrevistas que devem marcar sua biografia positivamente. E de propósito. O maranhense que foi filiado à ARENA, defensor da ditadura militar 1964/85 e indireto criador do Centrão, assumiu a presidência da República vaga pela morte de Tancredo Neves e tornou-se um defensor da democracia plena. Ferrenho defensor! Primeiro falou para O Globo e agora, em seu último pronunciamento, para gilvanmelo.blogspot.com onde ele diz textualmente: "Fui um presidente marcado para ser deposto". E é verdade, desgraçadamente nesse Brasil de golpistas.

Oriundo da UDN onde foi auxiliar de Carlos Lacerda, chegou a ser oposição a Tancredo, que se filiara ao PSD. Quando chegou a hora de assumir a presidência vaga por um Tancredo morto, soube que o ministro do Exército do ditador João Figueiredo, Walter Pires, havia dito que iria aos quartéis para inviabilizar sua posse. Estivemos mais uma vez diante da iminência de um golpe de Estado. E Sarney precisou de muito jogo de cintura e de engenharia política para se manter na chefia de Estado, afastar os riscos de ser deposto e ainda fazer com que a democracia brasileira, frágil como era, pudesse consagrar outro presidente civil em seguida.

O golpismo brasileiro nunca deixou de existir. Ele vem de desde a proclamação da República, que custou o exílio do imperador D. Pedro II, um homem digno, até os tempos atuais. Funciona como um movimento de marés, subindo e descendo na vida nacional de acordo com os momentos políticos pelos quais passamos. Em 1918 infelizmente os brasileiros elegeram um filhote bastardo da ditadura militar para a presidência e este fez renascer com mais força o golpismo explícito exercido durante seus quatro anos de mandato. Mais do que isso: separou definitivamente - ou ao menos até agora - o país em dois grupos antagônicos, inimigos. Antes, eram só adversários. Até no auge da ditadura!

Ontem mesmo o mais ferrenho defensor do novo nazismo, o presidente dos Estados Unidos Donald Trump declarou que a imprensa de seu pais, citando nominalmente alguns órgãos de Comunicação, é corrupta e ilegal. É que esses meios combatem os projetos ditatoriais do tal presidente. Tática idêntica ao de nosso ex-presidente eleito em 2018 e que passou seus quatro anos de poder sonhando com outra ditadura militar e, como fiel defensor do totalitarismo atacava a imprensa ao mesmo tempo em que defendia falsamente uma "liberdade de expressão" que não cabe nos elogios a torturadores como Brilhante Ustra.

Quando o Brasil vai entender que se tornou refém de projetos de ditadores de aldeia da extrema direita, não sei. Presumo que isso ainda vá demorar e que brasileiros como Sarney não viverão para ver esse dia. Mas ele haverá de chegar. Basta ensinar a toda a nova geração que, como disse um dia o Primeiro Ministro britânico Winston Churchill, a democracia é a pior forma de governo que existe, afora todas as outras. 

13 de março de 2025

A democracia de aluguel


Ninguém ainda distribuiu pela imprensa uma publicidade anunciando aluguel de partido político. Até porque a legenda pareceria com a charge que abre esse artigo (acima). Mas falta pouco. No último dia 10 o jornal O Globo publicou matéria de página inteira listando os 11 partidos brasileiros que correm o risco de serem inviabilizados pela cláusula de barreira da legislação em vigor. Vejam: PDT, PSB, Podemos, PSOL, PSDB, Avante, Pro, Solidariedade, Cidadania, Novo e Rede. Seus dirigentes tentam formar federações, união de duas ou mais legendas em uma única para tentar alcançar o número mínimo de parlamentares eleitos em cada uma ou então o menor percentual de eleitores votantes exigido para que eles não sejam extintos. É a luta para manter o pescoço fora do cepo!

E porque isso acontece? Também recentemente e às vésperas de completar 95 anos o ex-presidente José Sarney falou ao mesmo jornal sobre política. Lembrou os 40 anos de nossa democracia sacramentada na Constituição Cidadã de 1988 e o fato de os partidos políticos serem a base do regime democrático. E foi assim no Brasil. Foi, disse eu, usando o verbo no passado. Isso na época de Sarney, quando cada partido representava uma corrente de pensamento, tinha um programa de conhecimento de todos os membros e grande parte dos seus eleitores, dentre outros atributos. Nos tempos em que o ex-presidente começou na política pontificavam por aqui legendas como UDN, PSD, PTB e outras. Durante breve tempo, até mesmo o PDB. Cada um tinha e mantinha sua própria cara.

O golpe de Estado de 1964 destruiu toda essa história. No lugar das legendas antigas surgiram Arena e MDB, que fizeram a política durante os 21 anos do arbítrio militar brasileiro. E as velhas correntes, sobretudo a oposição à ditadura, se bandeou para o MDB, hoje PMDB, e que representava a oposição consentida. Com o término do regime de exceção foram surgindo legendas novas e a política de aluguel se formou no Brasil como uma forte tendência. A ponto de hoje a legenda partidária não ter significado algum além de ser o endereço provisório de alguma corrente ligada ao coronelismo moderno.

Tomo emprestado o termo "coronelismo" para transportá-lo até aqui, às grandes cidades, onde se sustentam as legendas de aluguel atuais. São elas que mantêm a bancada da bala, a bancada evangélica, a bancada ruralista e o que mais houver de errado na política moderna na qual o clã Bolsonaro troca de partido a cada eleição, levando para uma nova legenda toda a sua entourage de oportunistas travestidos de conservadores, mas que na verdade são reacionários sem o menor pudor, sem sequer sombra de dignidade política ou pessoal. A rapidez com que a quadrilha enriquece mostra qual é a sua "ideologia". E também a maneira como as bancadas se distribuem pelas legendas "conservadoras" denuncia a forma como elas mantêm seu poder de modo mais eficiente...    

O que deixa saudoso o ex-presidente às vésperas de completar 95 anos é a maior perda da democracia política brasileira ao longo dos últimos tempos. Lá se vão 40 anos! Por causa disso hoje tantos partidos correm o risco de deixar de existir. Alguns nem deveriam ter nascido, enquanto outros não foram escolhidos como bancada de aluguel pelos grupos de ocasião ou então não abrigam o saudoso da ditadura militar brasileira. Então minguam no Brasil sem compromisso ideológico ou político/programático. A cláusula de barreira, criada para impedir até partidos de fundo de quintal no Brasil deve fazer essa faxina em breve.

E a democracia brasileira sobreviverá! Torço por isso!                   

3 de março de 2025

Sim, ainda estamos aqui

Somente hoje pela manhã, ao ler um texto de Marcelo Rubens Paiva sobre sua família, soube que "ainda estou aqui" foi uma frase dita por Maria Lucrécia Eunice Facciolla Paiva durante a enfermidade de Alzheimer e num raro momento de lucidez. Ela, desde essa madrugada é a inspiradora do primeiro Oscar que o Brasil ganhou para nosso cinema na categoria Internacional e na foto acima aparece junto com a imagem do marido. Isso rompe um longo predomínio dos filmes europeus em vitórias nessa categoria de premiação e dá à nossa sétima arte um empurrão necessário ao sucesso.

Sem o retorno do Brasil à democracia nada disso seria possível. Nem mesmo um filme como esse do Oscar. Durante o governo do fascista Jair Bolsonaro tudo foi feito para que as artes nacionais terminassem estranguladas, e inclusive que um filme sobre Carlos Marighella de 2019, obra de Wagner Moura, nunca fosse terminado ou entrasse em cartaz. Ficou pronto e acabou exibido em todo o Brasil. Também a música, o teatro e outras manifestações de caráter cultural sofreram ataques. E essa gente é justamente a que fala de liberdade de expressão...

Hoje mesmo, no grupo da Academia Espírito-santense de Letras, um "acadêmico" publicou fala do falecido picareta Olavo de Carvalho e na qual este diz: "O carnaval é a expressão mas genuína da cultura brasileira. É o tempo em que o povo brasileiro se reúne para celebrar sua própria ignorância e sua própria miséria". Incrível a forma como o picareta se referia a uma de nossas maiores manifestações de cultura popular e a forma como até hoje ele é homenageado pelos insignificantes de plantão. Por sinal, esse mesmo literato (sic!) durante uma última campanha política botou no ar relação grande de partidos políticos brasileiros que seriam aliados ao comunismo internacional. Poucos minutos depois, apagou o post.

Mas nós ainda estamos aqui. Não fossem as esquerdas combaterem o fascismo que reinou no Brasil de 1964 a 1985 e foi revivido em parte pelo desgoverno de Bolsonaro, nada do que existe hoje no Brasil moderno estaria por aqui. A começar pelas nossas múltiplas manifestações artísticas e culturais e a terminar na produção científica brasileira. Impossível é entender como as imensas hordas de fascistas emergiram dos esgotos onde se encontravam para assombrar os demais brasileiros. Para acampar diante de quarteis, marchar ao som de hinos desconexos, rezar para pneus e apontar os celulares ao céu para contatar extraterrestres. Isso antes de invadirem Praça dos Três poderes e tentarem destruir Executivo, Legislativo e Judiciário numa busca fracassada de golpe de Estado.

O Brasil que sobreviveu a tudo isso para estar hoje com sua democracia forte e estabelecida vai continuar fortalecendo todas as instituições democráticas nas quais se fundamenta. A extrema direita que tenta corroer as democracias de dentro para fora como acontece no Brasil, Argentina, Estados Unidos, Itália, Hungria e outros países, vai perder. Terminará sepultada na mesma vala comum da história onde está hoje Olavo de Carvalho. E para lá seguirão seus apoiadores habitantes das bolhas de internet onde se prega a vida num mundo que só existe para esses "hitlers" de última hora.           

    

28 de fevereiro de 2025

Il capo di tutti capi


Recentemente revi um filme feito na década de 1970 pelo diretor Louis Malle e de nome "Lacombe, Lucien".  Trata-se da história fictícia de um jovem chamado Lucien Lacombe, que durante a Segunda Guerra Mundial denuncia seu professor de matemática a colaboracionistas franceses durante a ocupação alemã na França. Não foi aceito como maqui por "La Résistance", já que era quase criança. O educador é preso, morto e daí para a frente o moço se alia à Gestapo e vai denunciando a todos, inclusive uma jovem judia que não aceitou se entregar a ele após uma declaração de amor. No final, quando guerra termina é preso pela Resistência Francesa - onde pretendeu militar um dia -, julgado e executado por um pelotão de fuzilamento. Punição das mais adequadas!

Lucien vive em cada um de nós. O canalha, o entreguista, o politicamente louco como "Il capo di tutti capi" Donald Trump (o da ilustração), aquele que trai para sobreviver ou obter vantagens está nas nossas vidas. Sempre presente! No livro "Eichmann em Jerusalém", Hannah Arendt diz que "em uma situação de terror a maioria das pessoas vai colaborar com os opressores, mas nem todas". E ela conclui afirmando: "Humanamente falando, nada mais é exigido, e nada mais pode ser pedido de modo razoável para que este planeta continue um lugar adequado para a vida humana". É uma aposta e uma profissão de fé na raça humana.

Hoje o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky foi humilhado e quase agredido fisicamente pelo presidente norte-americano Trump no Salão Oval da Casa Branca. Talvez o país sofra retaliações horríveis daqui para a frente porque o mandatário se recusou a assinar um documento chantagista e absurdo contra interesses de sua pátria pois ele não era a imensa maioria daqueles que habitam a política atual, e sim "mas nem todas". Irritou tanto o novo Hitler dos tempos modernos que sequer foi acompanhado à saída da sede do governo.

Aqui no Brasil vimos um senador pelo Espírito Santo, olhos parado, vidrados, transtornado e falando palavrões pedir em áudio que os Estados Unidos invadam o Brasil. Isso é crime! Um deputado federal viaja todas as semanas para os Estados Unidos com dinheiro do contribuinte para pedir boicote a seu país e ações contra o Supremo Tribunal Federal (STF). Isso é crime! Não estamos em situação de terror - ainda - e nem diante da iminência de que nosso planeta se torne lugar não adequado para a vida humana, mas quando um psicopata pode falar em Terceira Guerra Mundial na Casa Branca a coisa é muito séria.

Lucien Lacombe é ficção, mas vive entre nós. 

         

27 de fevereiro de 2025

E ainda há tempo...


Trabalhei como correspondente de alguns grandes jornais brasileiros em Vitória, tanto representando a esses quanto substituindo os titulares que entravam em férias. Lidava com todas as correntes políticas que no passado eram civilizadas, mas as maiores dificuldades ficavam no trato com o PT e seus dirigentes regionais e/ou nacionais. Era muito difícil penetrar no círculo deles e tentar influenciá-los. Eram impermeáveis. Até mesmo na esfera sindical o partido não tolerava intrusos, reagia a qualquer tipo de interferência externa. E esse modo de pensar nunca mudou ao longo dos anos. Inclusive agora que o presidente Lula, em queda acentuada de popularidade até mesmo no Nordeste, parece isolado no Palácio da Alvorada, tudo continua como dantes no quartel de abrantes.

Os que habitam a Brasília atual dizem que o circulo de Lula se restringe a Rui Costa, hoje na Casa Civil, Sidônio Palmeira, na Comunicação e Janja, no leito. E aí talvez more o maior perigo! Nos últimos tempos o presidente tem demorado a tomar decisões - o que não é uma novidade! - e as toma sozinho. Talvez faça isso no reduzido espaço do Alvorada, em momentos íntimos e cedendo a impermeabilidade de seu pensamento apenas à mulher que é onipresente na cena politica nacional desde que se casou com ele, como pode ser visto na foto. Nem sequer tenta disfarçar seu protagonismo.

Dona Ruth Cardoso, mulher de Fernando Henrique Cardoso, era uma intelectual brilhante, antropóloga, cientista social mundialmente reconhecida e capaz de emprestar muita coisa ao marido no terreno de discussões teóricas, aconselhamento político, etc. Se fazia ou não é difícil dizer porque a tônica de sua existência nos campos minados de Brasília era a discrição. Teve participação segura no programa Comunidade Solidária, modernizou o assistencialismo do Brasil junto com o presidente, outro grande intelectual, e parou por aí.

Hoje até mesmo o assistencialismo brasileiro carece de maior embasamento científico. E de foco voltado para o Brasil moderno. Lula não entende que o mundo mudou e ele deixou de lado até mesmo a preocupação em conquistar apoio da juventude - seu maior erro - e o relacionamento com a classe política é mais de cooptação insegura do que de trabalho conjunto. Frente ampla é algo distante das preocupações do presidente, o que mina seu mandato, compromete o passado político e lança dúvidas sérias sobre o futuro próximo. Mas nem tudo está perdido porque ele pode encontrar um caminho e mudar de rota e recuperar capital político. Ainda há tempo, mas esse tempo urge.         

25 de fevereiro de 2025

Liberdades têm limites


Virou moda entre bolsonaristas gritarem "liberdade de expressão!" sempre que o guru deles, o genocida e inelegível é tocado de qualquer maneira. Um dos filhos o deputado federal Alexandre já viajou várias vezes aos Estados Unidos para conspirar contra seu próprio país tentando interferir no Judiciário, inclusive em ações que tramitam contra o pai golpista no Supremo Tribunal Federal (STF). Isso a ponto de o bilionário Elon Musk, espécie de ídolo do atual presidente dos EUA estar promovendo dois processos contra o ministro Alexandre de Moraes em cortes da Flórida. Trata-se de um esperneio desesperado e sem sentido.

A Constituição dos Estados Unidos dá um valor quase absoluto à liberdade de expressão, defendida desde 1791 na primeira emenda, item da Declaração dos Direitos do Cidadão. Mas digo quase porque se os norte-americanos exercerem seu direito de crítica contra os patrões, podem ser demitidos na mesma hora. Os sustentáculos do capitalismo atropelam o direito de expressão nesse caso. É esse direito quase absoluto o pilar no qual o presidente Donald Trump, um projeto de novo Hitler, se apoia todos os dias para buscar o poder absoluto atropelando até mesmo sua Constituição e as instituições do país.

Recentemente, num embate com a governadora do Maine, Janet Mills, sua opositora e que não aceita veto a atletas trans nas competições em seu Estado, ao ouvir dela que segue as leis federais, respondeu: "Eu sou a lei federal" antes de falar que o futuro político da opositora estava comprometido. Esse resquício de absolutismo governamental vem desde Luís XIV, na França, que teria dito um "l'État, cést moi" (O Estado sou eu). O neto dele, Luís XVI provou a lâmina da guilhotina em 1789. A pauta de costumes vale nos EUA tanto quanto cá, mesmo mais de dois séculos passados...

O Brasil tem a liberdade de expressão na dose certa para que ela não seja confundida com liberdade de agressão e não atropele o direito dos outros, o que nunca pode existir. Mas mesmo assim é largamente desrespeitada até mesmo no Congresso Federal, onde políticos saudosos do bolsonarismo esgoelam para impedir as falas dos opositores, quando eles se manifestam. Os gritos são argumentos de quem não tem o que defender.

Na minha maneira de entender Eduardo Bolsonaro já está cometendo crimes. Não segundo as leis dos Estados Unidos, onde não mora, mas diante das de seu país, que é o meu. E justamente nesse nosso pedaço de mundo empresas estrangeiras têm que respeitar os limites da liberdade de expressão, não a dos EUA, mas sim da República Federativa do Brasil. E viva a liberdade conquistada por nós na Constituição desde 1988!    

19 de fevereiro de 2025

Na casa de Noca


Em São Paulo existe um lugar icônico para quem gosta de sair à noite e ir a shows ao vivo. Trata-se do "Bar Brahma", localizado numa das esquinas entre as avenidas Ipiranga e São João. Lá, durante muitos anos a imortal Elza Soares se apresentou uma vez por semana para cantar e encantar o público com sua voz forte e rouca em interpretações como "Casa de Noca", música que fala de prostíbulos (eis um deles aí acima) onde todo mundo pode ficar se divertindo contanto não brigue, pague a conta ao final da visita e fique bem comportado no salão. Lugar de licenciosidades as mais variadas é no quarto!

"O couro comeu

Na casa de Noca, nego

Não teve jeito

na casa de Noca..."

Isso acontecia quando alguém fazia sacanagem no salão. O couro comia e come, segundo  dizem, na "casa de Noca". E parece que está acontecendo isso agora num lupanar famoso de Brasília, localizado na Praça dos Três Poderes, onde se rouba dinheiro público das emendas parlamentares de forma a mais descarada possível e existe a pretensão de ser feita uma PEC para proibir, não o roubo tão costumeiramente praticado, mas a investigação do roubo e de quem rouba. E também para votar uma outra lei com o intuito inconstitucional de anistiar os milhares de criminosos que acamparam durante meses em frente a quartéis para tentar dar golpe de Estado na zona e, no dia 08 de janeiro de 2023, destruíram as sedes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Essa "casa de Noca" atual tem uma cafetina inelegível em seu entorno e que quer legitimar anistias para todos os baderneiros de 08 de janeiro. Isso em nome da democracia e contra a censura! Essa cafetina, diga-se de passagem, em épocas passadas mas não tão distantes assim fazia discursos públicos onde defendia as torturas físicas de seus inimigos, a ditadura militar brasileira de 1964 a 1985, o ataque ao Poder Judiciário e, pasmem vocês todos, até mesmo o fechamento da "casa de Noca" que hoje ela procura sorridente para tentar anistiar criminosos presos e condenados pela Justiça.

Mas a cafetina que não respeita a "casa de Noca" que a pariu ao longo de 28 anos de atuação no salão onde não se deve fazer aquilo que está reservado aos quartos, agora corre o risco de ser expulsa desse ambiente e das ruas durante 28 anos. Bem feito! Apela inconformada para a "instituição" que um dia pretendeu destruir para comandar os lupanares de todos os lugares sem direito a substituição nem coisa alguma. Quer ser perdoada e ainda que todos acreditem numa história da carochinha: ela é a mocinha da história. Os bandidos são aqueles que sempre foram enganados (?) por suas diatribes ao longo dos tempos.

Pode?

A cafetina merece mesmo ser inelegível. E as prostitutas da "casa de Noca" não podem tentar reformar as leis do salão: lá não se faz sacanagem e nem se rouba emendas...            

16 de fevereiro de 2025

Fechem as portas do inferno

Recordo-me como se fosse agora de que o presidente Lula certa feita disse querer receber críticas e não ficar cercado por puxa-sacos como está acontecendo hoje. Já fiz isso uma vez e vou fazer novamente porque acredito como quem crê na morte que se esse presidente for derrubado nós estaremos abrindo as portas do inferno. E de forma tão eloquente como jamais foi nem nos piores momentos da sanguinolenta ditadura militar 1964/1985.

Aliás, o termo "porta do inferno" tem origem religiosa. Pode se referir a Hades, o reino dos mortos, ou então à promessa que teria sido feita por Jesus de que a Igreja não seria derrotada pelas forças do mal. Nas mitologias da Grécia e de Roma, Hades, também chamado de Plutão, era um deus que governava o submundo. Então, as portas do inferno ou "as portas de Hades" significavam esse poder. Já na Bíblia o
pensamento se refere ao reconhecimento de Simão falando de Jesus como "o Cristo". E este lhe revela: "E eu digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela".

Faço esse início nada agnóstico como sou para argumentar que quem hoje sonha com o autoritarismo político embutido em falsos discursos moralistas e religiosos tenta reviver os idos da ditadura militar nos seus piores momentos! Os discursos de "liberdade de expressão" e outros são balela pura. Todas essas pessoas conviveram com o pior do autoritarismo politico brasileiro e querem fazer voltar a época como vingança e para que ela seja muito mais aguda e desprezível do que foi em tempos passados. Os Estados Unidos mostram como é isso no início do governo Trump e no desmonte daquela democracia de dentro para fora com o ataque a todas as instituições.

Lula está cercado por pessoas que buscam isolá-lo da realidade. Por isso sempre que pode fala de improviso e sobe a cada dia mais degraus na escada do populismo. Essa longa escadaria costuma ser precedida por outra que desce e leva ao reino dos mortos, onde está Hades. Ele, o presidente, não vê isso porque o entorno não deixa e lhe cria um efeito de redoma atuando como falso escudo protetivo. Mas o antigo metalúrgico está cercado de hienas.

Ontem mesmo eu disse que o presidente não tem contato com a juventude e isso é muito mal. Péssimo. Principalmente porque a cada dia que passa mais o cerco contra ele se fecha na busca por espaços num governo enfraquecido. Até Arthur Lira, essa decrépita figura já almeja um cargo de ministro, e da Agricultura, por que não? A expectativa do butim assanha todo o grupo de hienas de Brasília quando esta sente cheiro de carniça. Usam de movimentos em torno de um impeachment, mas querem mesmo ficar à sombra do poder, pois nessa posição é bem mais fácil subir nele. Está ali mesmo o tronco da árvore frondosa...

Há tempo para reação. Para um corte mínimo em despesas, ainda que isso toque em programas caros ao presidente, para um contato mais constante e sincero com a população sem o recurso do populismo barato, para uma reforma mínima e digna do ministério e para um combate efetivo às mentiras que assolam o Brasil com a única e clara intenção de destruir tudo o que está à frente, inclusive as vindas dos Estados Unidos. À frente de nós está o futuro daqueles que realmente querem construir um país de instituições fortes e firmadas com a Constituição de 1988. 

Vivi a ditadura e sei como ela se comporta. Fechem as portas do inferno.            

14 de fevereiro de 2025

Vá a Recife, Lula...


Imaginem um semáforo com as três luzes acesas e todas elas em vermelho. Ou então um conjunto de três semáforos voltados para a mesma direção e com somente as luzes vermelhas acesas, como mostra a imagem acima. Ou ninguém iria entender nada ou sentir muito medo. Imagino que isso deve ter se passado com o presidente Lula e com seus assessores mais diretos, sobretudo ministros, depois da divulgação da pesquisa do Instituto Datafolha de hoje à tarde. Simplesmente um 24 por cento de aprovação do governo contra 41 por cento de desaprovação, o pior resultado de todos os tempos nos governos que ele teve à frente do Brasil. E não é só por causa do preço das comidas...

É claro que ir ao supermercado e não conseguir encher o carrinho de compras causa raiva. O brasileiro votou em Lula depois de estar desencantado com Bolsonaro, dentre outras coisas, por causa das altas nos preços dos gêneros alimentícios durante aquele governo. Esperava uma melhora acentuada e constante durante os quatro anos seguintes. Não importa se por fatores externos ou não, porque fatores não enchem barriga e nem matam a fome, mas o certo é que vivemos uma inflação grande em gôndolas de supermercado. Todos sentem isso e o problema acaba desembocando no governo, principalmente e sobretudo porque o presidente fala demais, fala de improviso e de vez em quando solta muita bobagem.

Há outros fatores influindo nessa questão. O dólar andava muito alto, o clima de constante atrito no Congresso com acusações de lado a lado influía no ânimo das pessoas. A oposição sabe usar as redes sociais para fazer futrica e espalhar fake news melhor do que ninguém. A novela das mudanças ministeriais com episódios de troca de cargos por favores cheira mal. O caso do PIX é exemplar para mostrar como é fácil para os oposicionistas, sobretudo os da extrema direita, enredarem o governo em tramas das quais ele só consegue sair com grande prejuízo. E um prejuízo como aquele não se consegue recuperar com facilidade. Ele derruba indicativos do governo e os percentuais de aprovação do presidente e seu entorno desabam imediatamente.

O que joga a favor de Lula para que o Brasil impeça a volta da extrema direita ao poder, pois ela aqui é tão fascista quanto a de Trump nos Estados Unidos, é o tempo. Ainda tem esse governo 22 meses antes de a eleição decidir o que muda e o que não muda entre nós. Mas o tempo não pode ser lançado fora de maneira nenhuma. É preciso que Lula entenda e faça os demais membros do seu staff entenderem que o mundo mudou. Mudou demais desde os dois primeiros mandatos presidenciais dele até agora. Mas o presidente não acompanhou essa mudança, não a acompanha e não a vê.

Dou um exemplo: ele não fala mais com os jovens. Não consegue se comunicar com eles, trazê-los para seu entorno e torná-los a ponta de lança de um movimento agregador. A juventude é quem leva um país ao futuro porque determina qual é seu norte. Vocês se recordam de como ela tirou Collor do poder? Há mais erros sendo cometidos por Lula, porém esse é o maior. E para começar a corrigir a rota basta o presidente pegar o avião presidencial e mandar tocar para Recife. Lá o prefeito, um engenheiro de nome João Henrique de Andrade Lima Campos, 27 anos, pode conversar com ele e colocá-lo em contato com a juventude e a rota que ela quer para o Brasil.

E isso porque Campos também a quer esse caminho si no futuro.         

13 de fevereiro de 2025

A falência da ética


Essa charge que publico aí acima, do paulista Junião, mostra claramente o que temos hoje no Brasil e irradia de Brasília ao restante do território nacional com episódios diários que nos envergonham a todos: não há mais ética no fazer política deste país. Ela faliu! E me arrisco em dizer que os conceitos de honra foram sepultados na mesma cova rasa onde está enterrado o primeiro dos preceitos tão indispensáveis ao exercício da atividade pública que nasce e morre em mandatos saídos das urnas nas eleições diversas.

Hoje mesmo foi noticiado em vários programas jornalísticos sérios brasileiros que a Polícia Federal tem provas irrefutáveis de que as tais emendas parlamentares tão disputadas pelos políticos sobretudo de Brasília e que já batem na casa dos R$ 50 bilhões anuais viraram mais uma grande modalidade de corrupção. Os políticos que deveriam encaminhar o dinheiro do seu, do meu, do nosso imposto a destinos de interesse público para serviços de real necessidade da população chegaram ao requinte de chamar os endereços que teriam de ser usados para a saúde de "destinação". Quanto requinte!

Eles fazem contratos reais e nos quais aparecem como "intermediários", cobrando 6 por cento sobre o valor como taxa de "intermediação". Mas é propina mesmo, e da grossa. Uma inovação: agora a corrupção tem contrato firmado no Brasil. Só falta colocar no papel que as dúvidas e desentendimentos serão dirimidos na Vara "X" do Fórum "Y", cidade "W".

Um deputado federal do PL - que coisa, quase só dá esse partido! - chegou ao requinte de utilizar agiotas na intermediação do envio das emendas. Josimar Cunha Rodrigues, 48 anos de pura falta de ética, de honra, e de vergonha na cara e conhecido como Josimar Maranhãozinho por ter sido lançado por esse município onde foi prefeito, apresenta sempre emendas com "valores quebrados" porque assim fica mais fácil para o agiota identificar o valor e cobrar pelos pagamento dos serviços. Familiares do ex-deputado federal Bosco Costa (PL-SE) participavam de um esquema de venda de emendas parlamentares. Usar a família, para esse sergipano, deve parecer mais seguro. E vai por aí, a lista é longa...

O mais dramático é que os brasileiros não se revoltam contra isso. Os apoiadores incondicionais do ex-presidente inelegível que antecedeu o atual acham que tudo não passa de perseguição política, como foi feito em reunião de membros de seu grupo com representantes da OEA. Os demais não acreditam que o problema tenha solução. Mas tem! Tanto que as denúncias de ontem foram feitas depois que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, retirou o sigilo das investigações da PF relativas às emendas.

Elas, que antes eram um recurso legislativo nascido do fato de que realmente os parlamentares conhecem mais suas bases que os burocratas de Brasília, tornaram-se um eloquente caso de corrupção com roubo de dinheiro público desde que o inelegível e genocida abriu os cofres do Tesouro a deputados federais e senadores para não sofrer impeachment na legislação passada. Ele, que defendia o fim da corrupção no Brasil (sic!).

Até onde vamos? Um Flávio Dino, está provado, incomoda muita gente mas sozinho não pode mudar um mundo corrompido como o de hoje. Há mais gente digna na Capital Federal, apesar de manietada pelo poder emanado dos movimentos de extrema direita. Salvar o Brasil é possível se aqueles que se horrorizam com os "maranhãozinho da vida" disserem basta e forem às ruas para pedir a vitória da moralidade pública. Lutar contra a corrupção e dizer isso diariamente é uma necessidade imperiosa!   

7 de fevereiro de 2025

Camaleão das 11 posições


No reino animal irracional o camaleão é um tipo de lagarto que tem como habilidade principal a capacidade de mudar de cor para se camuflar e ficar quase indetectável aos inimigos no seu meio. No reino animal racional habita sobretudo o ambiente da política onde vive uma vida inteira tentando ser o maioral entre os menores através da camuflagem. O que raramente o faz o maior de todos no seu grupo. Hoje nós vamos falar do novo espécime surgido na recente eleição do Congresso: presidente da Câmara, Hugo Motta.

Paraibano de João Pessoa, representante da tal "direita nordestina", esse médico foi eleito presidente da Câmara através de um acordo que teve o beneplácito do ex-presidente Arthur Lira, alagoano, cacique político, pecuarista e anunciado como empresário para consumo externo, mas que não esclarece o que empresaria. Agora no "chão de fábrica", como disse, habilita-se a ser ministro do presidente Lula que sabotou durante muito tempo em seus dois mandatos no cargo agora do novato Motta, esse que joga em todas as 11 posições...

Em seu discurso de posse, o novo presidente citou muito Ulisses Guimarães que, vivo, se sentiria ofendido por ter seu pensamento sobre "ódio e nojo à ditadura" citado por alguém que necessitou do apoio indisfarçado do saudoso do regime militar brasileiro, Jair Bolsonaro, para chegar à cadeira de Lira. E como não se pode ao mesmo tempo rezar a deus e ao diabo, o médico paraibano precisou dizer hoje mesmo que o 08/01/23 não foi uma tentativa de golpe e que as penas impostas aos presos nas bandalheiras de Brasília são excessivas. Isso logo depois de dizer que uma anistia não seria apropriada...

Não vai dar certo!

Uma das declarações do novo presidente da Câmara foi a de que pretende acabar com a polarização no Brasil. Dessa forma, cara pálida? E hoje ele já aproveita o final de semana que em Brasília começa às quintas-feiras para falar com Lula e Bolsonaro por telefone, prometendo a um e outro atender a pleitos inimigos irreconciliáveis. Em síntese, daqui pouco, muito pouco tempo mesmo, não haverá camuflagem capaz de disfarçar seu jogo de 11 posições nesse ambiente onde acordos não são coisas que se negocie à luz do dia. Quantos conselheiros Motta terá a seu lado no percurso de dois ou quatro anos na Câmara? Qual deles será capaz de fazer com que capitule ao som do canto das sereias?

Agora mesmo ele já quer apoiar uma PEC da bancada evangélica para mudar a Constituição fazendo com as entidades religiosas não paguem mais impostos até a quinta geração terrena. E isso no Brasil que precisa economizar! Bolsonaro, outra vez desperto de sua longa espera pela condenação falou para dizer que não pede anistia para ele. Para terceiros? Tá bom! E a extrema direita do Congresso, universo dos bolsonaros e o que temos de pior na política brasileira, tipo Magno Malta, espera pela hora da chegada de um improvável butim.

Esse pode ser um novo samba do crioulo doido!

5 de fevereiro de 2025

O mundo cabe em Vilamoura?

Marina de Vilamoura com vidro blindado impedindo a entrada de quem não tem crachá (acima). Foto panorâmica do éden do balneário com seus iates de luxo (à esquerda). Abra as fotos para ver com detalhes.

O mundo que Trump molda para os Estados Unidos já existe esboçado em diversos lugares do mundo. Em Portugal, por exemplo, no Algarve, ele está construído na Marina Vilamoura, um balneário de 22 mil habitantes onde tudo é privado e onde quem tem menos de um milhão de euros não pode viver "modestamente". Fui lá. Não vi um único carro da Polícia - e isso tem muito nas terras lusitanas  -, mas os seguranças privados abundam em todos os lugares. Uma piada que contam é que se você entrar num restaurante de lá e disser "pssiu!" o garçom já anota: "um pssiu, 20 euros". Basta entrar para constatar. Não entrei, claro.

Tudo lá custa uma fortuna, a começar pelas casas que obedecem a módulos obrigatórios. O mais "pobrinho", um milhão de euros, como disse. Mas tem um porém: naquele oásis do "Estado não entra" há postos de saúde, pequenas clínicas, mas nenhum hospital. Se for necessária internação os multimilionários de lá - a maioria europeus de outras nacionalidades - ou pegam um avião UTI para suas bases ou vão a hospitais do SNS (Serviço Nacional de Saúde) em Portimor, por exemplo, porque nessas horas o serviço público de saúde resolve as emergências dos ricos...

Eu me lembrei de Vilamoura na posse de Donald Trump nos Estados Unidos. Atrás dele estavam os maiores magnatas do país, todos donos das big techs da moda. São eles que pretendem invadir o poder de Estado, substituí-lo pelo poder privado e corroer a democracia dos Estados Unidos de dentro para fora. Fazendo assim com o X, com a Space X, com a Amazon Web Services, Palantir, OpenAI, etc. É um "esquemão".

Se tudo der certo para eles, em breve o mundo que conhecemos deixará de existir. Elon Musk, controlador de boa parte da política de expulsão dos imigrantes ilegais dos EUA dirá de forma clara que seu negócio é controlar o Estado de cima para baixo porque, esqueceram-se os otários, ele é sul-africano. Mas é branco, tem olhos claros, dança feito idiota sobre palcos da mesma forma que Trumb - outro imigrante - e jamais, em tempo algum, acreditou em democracia, em constitiução, etc.

Aceitem o que digo: a extrema direita, o nazismo e seu dileto primo o fascismo, nascem, vivem e se exteriorizam no capitalismo. Estão dentro dele. Muito antes de serem anticomunistas eles são anti-estado moderno. Sua tarefa é tomar o poder nos países, atuar acima da Política, das leis e moldando os Estados de acordo com os interesses do capital privado. Por isso necessitam controlar o poder principalmente a partir de órgãos de inteligência. Musk já tem nas mãos até o programa espacial dos EUA. A Palantir, de Peter Thiel - guardem esse nome - está infiltrada nas operações de inteligência do Departamento de Defesa. E assim caminha a humanidade... A deles...

O ideólogo brasileiro dessa corrente - caramba, estou colocando inteligência nesse cara! - tem em Trump, que ontem divulgou seu plano de tomar Gaza para torná-la um céu sobre a terra, um deus. Ele teve o projeto maluco de tornar áreas de preservação permanente do litoral fluminense uma nova Cancun. Quem se lembra disso? Seria uma obra de destruição do meio ambiente. Mas os dois, Trump lá, Bozo cá, também serão meros agentes desse novo modelo que se avizinha, caso ele seja feito real. Meros agentes. Inocentes úteis ou inúteis. Quando o poder dos bilionários tiver seu plano implantado, não existirá mais a "liberdade de expressão" que os bobocas defendem hoje porque a informação chegará filtrada ao povo, que só tomará conhecimento daquilo que interessar ao sistema, aos interesses do ilimitado poder privado de Estado. E nada mais.

Mas ainda há tempo para que evitemos esse mal todo. Tempo de sobra, principalmente porque agora Trump ainda pode falar fora do script e tornar publico um projeto maquiavélico que só seria possível no futuro que as big techs imaginam, de ocupar Gaza e fazer dela um balneário de luxo onde caberiam até "alguns" palestinos. Quem leu "1984", de George Orwell, sabe que nós sempre ligamos aquela realidade distópica à ficção e somente a ele. Mas muitos trilionários, não.

Vamos pensar nisso: ainda é tempo para todos podermos visitar Vilamoura apenas com a restrição do dinheiro. Quando fotografei o pier particular fechado e com vidro blindado um segurança me olhou feio. E me seguiu de forma pouco discreta até que entrei no ônibus da excursão para ir embora. Era um "armário de oito portas" com um grande volume por baixo da camisa, do lado direito da cintura. E  que fazia questão de mostrar...                      


30 de janeiro de 2025

Quando os criminosos vão pagar?


Vira e volta a gente ouve na TV, lê nos jornais, na mídia eletrônica ou toma conhecimento por qualquer meio de Comunicação que a internet, as tais redes sociais aí incluídas, não é mais terra de ninguém. Hoje existem ou existiriam meios de investigações capazes de identificar qualquer pessoa ou grupo que usa essas chamadas redes de manhã, de tarde, de noite ou de madrugada com o intuito de construir mentiras que servirão para destruir. Um governo, por exemplo. O caso do PIX pode ser usado para explicar isso. E ele é só um. Então cabe a pergunta: por que os marginais brasileiros que usam meios eletrônicos com o intuito de cometer crimes ainda não estão pagando caro por eles?

Já vivi o bastante para ver muita coisa. Quase tudo. Mas a cada dia que passa me surpreendo mais. Consta que no caso do PIX as fake news construídas afundaram o governo federal e a figura do presidente da República. Em que tipo de sociedade nós iremos viver se esse tipo de prática for visto como normal, regular, ético? Fico arrepiado só em pensar no termo "ético" que usei. E algumas das figuras ligadas a isso são sobejamente conhecidas.

Um deputado federal de nome Nikolas Ferreira, que quer se governador de  Minas Gerais, foi identificado fazendo esse tipo de coisa mais de uma vez. E ele é só a ponta do iceberg. Muitos outros continuam a montar esquemas milionários com essa finalidade, e mesmo desde antes da eleição do ex-presidente que antecedeu o atual. Hoje mesmo o aumento dos combustíveis está sendo colocado na conta do governo federal, isso quando todas as pessoas informadas medianamente sabem que o reajuste veio pelo ICMS, um imposto estadual. Mas a maioria dos que poderiam esclarecer a questão silencia. Esse silêncio cúmplice é aliado deles.

O tal gabinete do ódio instaurado no governo passado não existe mais no mesmo endereço, mas funciona a pleno vapor. O ex-presidente disse que vai pedir ajuda ao seu "colega" dos Estados Unidos para vencer as próximas eleições. Durma-se com um barulho desses! E quanto mais se avolumam as provas de suas falcatruas e tentativas de golpe de Estado, mais ele se arvora em valente para dizer que disputará a próxima eleição e a vencerá. Afinal, o exemplo vem de cima. Nesse caso, quase literalmente porque surge na noite que se anuncia para os Estados Unidos.

Nosso país tem milhões de habitantes analfabetos funcionais, sobretudo e principalmente no campo político. E por isso os governos jamais se preocuparam em dar aos brasileiros os recursos de educação que eles precisariam para entender o mundo que os cerca e qual é a diferença entre o joio e o trigo. Também por causa dessa fraqueza milhões acharam oportuno que um general iletrado e pau mandado de um protótipo de ditador de aldeia ocupasse o Ministério da Educação impunemente por tanto tempo. E por todo esse conjunto da obra cabe muito bem a pergunta que abre e encerra esse artigo: quando os criminoso vão pagar?