22 de dezembro de 2011

O herói banalizado

"Mostre-me um herói e eu escreverei uma tragédia".
O  texto acima é de um gênio da literatura mundial, Francis Scott Fitzgerald, o simpático senhor da foto ao lado. E ela descreve como é difícil ser herói, como os verdadeiros são poucos e como não se deve banalizar esse termo que faz parte de episódios sublimes da história dos países.
No Brasil a gente não faz isso. O jogador que marca um gol aos 47 minutos do segundo tempo torna-se herói. O medalhista olímpico, idem. O sujeito que encontra o recém nascido jogado na lixeira e o leva ao hospital, muito mais. Parece até que temos necessidade de construir com barro. No caso, moldar heróis de pés de barro.
O jogador do gol deve ser um craque. E estava inspirado. O medalhista olímpico viveu seu instante de superação e glória. Quem encontrou e salvou o bebê merece uma medalha como exemplo de solidariedade humana. Mas herói é coisa muito mais séria. No Brasil temos Joaquim José da Silva Xavier, que conhecemos como Tiradentes. Algumas outras expressões da luta contra os portugueses, contra os holandeses e nada mais. Não são muitos.  Dizem que o Duque de Caxias foi herói. Luiz Alves de Lima e Silva comandou uma guerra genocida contra um país pequeno para atender a interesses mercantis ingleses. A Inglaterra da época era o Império.
Por falar em Época, minha revista semanal preferida publicou um dia desses uma lista dos cem maiores brasileiros do ano e uma categoria era a dos heróis. Um deles, um artista talentoso que luta com denodo contra o câncer.
Herói, minha gente, é coisa muito maior do que isso. Embora os citados na revista sirvam de exemplo.   

14 de dezembro de 2011

Os malandros de sempre

O Poder Legislativo brasileiro aplica, todo final de legislatura, um golpe contra o povo de seu País. Funciona assim: durante quatro anos os parlamentares mantêm inalterados os salários e outros penduricalhos que vereadores, deputados (estaduais e federais) e senadores recebem. Ao final da legislatura, corrigem os valores. Mas aí sempre aplicam percentual bem acima da inflação. E o golpe vem dando certo.
O correto seria os reajustes do Poder Legislativo, da mesma forma que os demais reajustes, serem atrelados à inflação e aplicados anualmente como ocorre, por exemplo, em quase toda a iniciativa privada. Mas não. Nos inícios de legislatura o Poder Legislativo passa a ganhar mais do que a iniciativa privada, somados os percentuais aplicados, em número de salários mínimos. Os vencimentos de vereadores, deputados ou senadores são sempre ascendentes a cada correção feita. O céu é o limite para eles.
Na cauda de cometa dessa brincadeira às vezes entra também o Poder Judiciário. Como este sabe que veredadores, deputados e senadores jamais votam contra suas pretensões - um quarto do Congresso responde a processos e o restante tem medo desse "fantasma" -, reajustes acima da inflação são pedidos da mesma forma. E conquistados. Argumentos, há: para corrigir "distorções" é o mais usado.
Agora, a esse banquete de final de ano, soma-se outro: o PSD, partido político criado poucos meses atrás para ser massa de manobra do Executivo, quer 60 cargos no Legislativo de Brasília e outro tanto ainda não definido nos Estados e municípios. Tem o direito constitucional a isso, embora sem ter eleito ninguém mas apenas cooptado parlamentares oportunistas que já têm seu séquito de assessores e demais apaniguados nos mandatos que exercem. Um partido que politicamente não sabe para onde vai, conforme mostra a ilustração, já sabe o que fazer e vai botar no bolso dinheiro público. Muito, de preferência. 

7 de dezembro de 2011

Doutor Brasileiro

Ele era grande como o nome: Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira. Seu futebol era do mesmo tamanho, assim como a sede por cervejas e derivados. Não foi um jogador de futebol que se tornou médico. Foi um médico que durante algum tempo jogou futebol. Um velho cronista paulistano, Lourenço Diaféria, disse certa vez que o Corinthians não é um clube que tem uma torcida. É uma torcida que tem um clube. Hoje, tem um clube e mais um ídolo. Daqueles que não morrem jamais.
E ele queria morrer num domingo com o Corinthians campeão. O destino fez-lhe a vontade. No dia em que seu time foi pentacampeão brasileiro, Sócrates era a notícia mais importante. Foi-se de madrugada, notívago que era. Seu enterro aconteceu às 17 horas, momento em que começou o jogo do Corinthians com o Palmeiras. Pouco menos de duas horas depois seu time vencia o 40º Campeonato Brasileiro de Futebol. E se tornava a segunda notícia mais importante do domingo no esporte nacional. Tive um único contato pessoal com Sócrates. Em 1983, quando seu clube comemorava um campeonato paulista num hotel da região central de São Paulo. Um dileto amigo que estava comigo, o jornalista Aroldo Schiorino, da Folha de S. Paulo, apresentou-me ao Doutor. "Dá cá um abraço, capixaba bom da porra!", disse ele abraçando-me e derramando cerveja por minha camisa. Não conversamos mais de dois minutos.
Todos os que conheceram Sócrates são unânimes em suas avaliações. Tratava-se de um homem sincero, ético, amigo dos amigos, admirador de boas bebidas e mulheres bonitas. Se um dia fez mal a alguém, fez a si próprio. Sua morte, portanto, entristeceu a todos, embora já sendo esperada.
Foi um ser pensante e politicamente importante. Numa época em que era difícil e perigoso afrontar o regime militar, ele o fez. De peito aberto. Intelectual de formação humanística, será lembrado pelo conjunto da obra. E não só pelo futebol refinado, capaz de tratar a bola como "meu amor". 
O Doutor vai deixar saudade. Esse paraense bom da porra, que honrou a camisa do Sport Clube Corinthians Paulista e está enterrado na Ribeirão Preto que escolheu para sua casa.