26 de novembro de 2019

O artigo 142 precisa mudar

Em entrevista ontem ao jornal O Globo, o presidente Jair Bolsonaro admitiu publicamente e pela primeira vez o que todo mundo já sabia: seu projeto de lei (PL) que prevê a figura do "excludente de ilicitude", unido à decisão de usar o artigo 142 da Constituição em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) visam unicamente impedir que haja no Brasil protestos contra seu governo. E não existe nada mais antidemocrático do que isso: blindar-se contra os que se opõem a seus atos.
Ou seja: não é possível que um presidente, sozinho, possa convocar as Forças Armadas para irem às ruas reprimir passeatas e outros tipos de protestos civis. Ainda mais quando a isso se soma um PL que nada mais quer dizer além de uma explícita autorização para matar. É preciso que o Congresso modifique o texto constitucional do artigo 142 para impedir que um presidente convoque sozinho as Forças Armadas em repressão de movimentos populares, a menos que esse ato tenha também o respaldo do Senado Federal, da Câmara Federal dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal e nas pessoas de seus presidentes em exercício. Lembremo-nos: Exército, Marinha e Aeronáutica existem para a defesa do Estado quando este está sofrendo ameaça à sua integridade, sobretudo externa.
Tudo o que o atual presidente pretende fazer está amparado em um artigo da Constituição Cidadã do Brasil que diz: "As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem (grifos são meus).
Desde 1988, quando a Constituição foi promulgada, jamais um chefe de Estado fez uso desse artigo. Nem mesmo Fernando Collor ou Dilma Roussef, alvos de protestos que tomaram as ruas e levaram aos seus afastamentos. O primeiro renunciou. A segunda sofreu impeachment. Em todos os 31 anos de vigência da Constituição, os presidentes entenderam que o povo tem o direito de se manifestar, sobretudo nas ruas. Como dizia Castro Alves, "a Praça é do povo, como o céu é do condor..."
O desapreço de Bolsonaro pelos direitos daqueles que se opõem a ele e aos valores da democracia representativa são de conhecimento público. Enquanto ele usa essa falta de princípios apenas e tão somente para seus toscos discursos públicos diários não há problema. Muitos até riem. Mas quando seus atos chegam ao absurdo de ameaçar toda a população brasileira com mortes indiscriminadas sob o argumento de que quem protesta é "terrorista", a coisa adquirem outra dimensão, e se torna muito mais séria.
Não custa lembrar para não nos alongarmos muito: em 1985, quando a ditadura militar acabou no Brasil, a imagem das Forças Armadas estavam incrivelmente desgastadas porque, ao longo dos 21 anos anteriores elas haviam se envolvido em episódios de prisões ilegais, torturas e assassinatos. Não creio que aos militares interesse hoje a volta de tudo isso nos casos de protestos de cidadãos, ainda mais de estudantes (como mostra a foto) ou de trabalhadores sem terra e agora sem futuro.                         

13 de novembro de 2019

Saudades dos meus generais...

Não há meio de Jair Bolsonaro se esquecer dos anos - caros para ele - da ditadura militar. E nem de governar sem pensar em retaliar contra o imenso espectro político de brasileiros que são contrários aos atos, na maior parte das vezes espúrios, de seu governo. Agora, saudoso da ditadura militar, quer criar um partido político só dele, todo dele, para chamar de seu: a Aliança pelo Brasil. Vulgo Aliança.
Por que isso? Porque Bolsonaro não consegue se esquecer da Aliança Renovadora Nacional, a ARENA, partido criado para dar sustentação política à ditadura militar que infelicitou o Brasil  de 1º de abril de 1964 até 1985, quando João Batista Figueiredo botou o pijama. Ao final do regime ditatorial, quando a sigla já estava desgastada, seus líderes pediram aos seguidores para abandonarem o nome ARENA, então símbolo de prisão ilegal, tortura e assassinato, e passarem a chamar o partido de Aliança. Não deu tempo. Logo a ditadura se tornou um passado triste e sombrio.
Capitão forçado a deixar o Exército depois de ter se insubordinado mais de uma vez, militar de raros predicados, Bolsonaro adora viver com oficiais generais no seu entorno, todos batendo continência para ele. Político do baixo clero, 28 anos em Brasília sem fazer nada digno de nota, vibra com o fato de ser ignorante, violento, raivoso e inconsequente. Dentre outras "virtudes". Como justamente hoje, quando fez vista grossa à invasão da embaixada da Venezuela em Brasília por supostos militantes da oposição naquele país. Nem mesmo nas épocas mais tristes da ditadura militar o governo permitiu que nossa diplomacia, de tão caras e honradas tradições, se permitisse a um papel tão rasteiro.
Mas se presta. Principalmente porque o Brasil tem hoje o pior chanceler de sua história. O Ministro da Educação mais inculto. Um ministro do Meio Ambiente já condenado em processo contra o meio ambiente. Alguns outros enrolados com a Justiça. E a grande maioria composta por pessoas sem méritos e, por isso mesmo, que seguem o "líder" como o boi segue a boiada. Não preciso citar Damares Alves, a titular da "Família", sempre em busca de Jesus no pé de goiaba.
Hoje, em plena reunião do BRICS enfrentamos o desconforto, o vexame de receber chefes de Estado quando uma representação diplomática estrangeira está ocupada em Brasília. Fossem ocupantes socialistas ou comunistas e seriam terroristas. Como são fascistas, Bolsonaro os tolera. Acho que diariamente, ao se deitar ou levantar, ele diz para consigo mesmo: "Saudades dos meus generais da época da ditadura militar. Que não vai voltar mais. Nunca mais". Aposto que é assim!