21 de outubro de 2020

Tempos insensatos e loucos


É fácil concluir: o atual presidente da República não tem apreço algum à vida humana. Ele pensa unicamente em seu mandato, no sonho de reeleição e aceita qualquer desafio para conseguir alcançar esse objetivo. E se milhares de brasileiros morrerem em consequência de seu desvario? Paciência, são os riscos que se corre... E daí?

Hoje mesmo disse no grupo de assessores e em mensagem dirigida ao seu gado que o atual ministro da Saúde, um general do Exército que nada entende do assunto, está querendo aparecer. Teria ficado entusiasmado com os holofotes. Então o desmoralizou publicamente dizendo que a aquisição de vacinas produzidas pela Sinovac, empresa chinesa, não virão para o Brasil. Qualquer ministro com vergonha na cara teria pedido demissão, mas... O pensamento desse cidadão presidente é muito simples: essa vacina está sendo produzida em parceria com o Instituto Butantan, e a instituição paulista estaria hoje ligada a um governador seu desafeto. Então não.

Não existe vacina chinesa, inglesa, norte-americana ou de outra procedência. Existem vacinas sendo produzidas no mundo todo para o combate a uma pandemia responsável por mortes que já atingiram o milhão em todo o  mundo e que hoje colocam a Europa novamente em pânico. Ela e os Estados Unidos onde um presidente irresponsável, belicoso e desesperado para não perder uma reeleição fala até mesmo em não aceitar um resultado desfavorável porque, nesse caso, houve fraude. E isso porque milhões de cidadãos daquele país estão votando pelos Correios, o que o tal presidente também sempre fez.

São tempos insensatos, para dizer o mínimo. Tempos nos quais uma situação da maior gravidade virou artigo político. Até poucos dias atrás a roda girava em torno de uma droga de nome cloroquina e que foi usada politicamente - de forma irresponsável - pelo presidente. Agora o inimigo é a vacina. Isso num mundo onde os últimos cem anos assistiram à salvação de milhões de pessoas graças a elas.

São tempos loucos. E neles as mensagens de rede social impulsionadas por fanáticos seguidores da horda presidencial - ou seriam robôs? - determinam o que ele vai fazer em benefício ou malefício de mais de 200 milhões de pessoas. E daí se muitos morrerem? O candidato à reeleição é Messias mas não faz milagres... Não, nós nunca antes vivemos tempos como esses.

A solução mais uma vez deve nos remeter ao Poder Judiciário para que o Executivo seja obrigado a oferecer aos cidadãos - um direito deles - as medicações das quais necessitam e necessitarão. E, ao mesmo tempo, se é para dar ao gado o direito de não se vacinar, também uma decisão judicial deveria garantir que esses seguidores, sem atestado vacinal, não tenham direito a usar o SUS caso corram risco de vida. Afinal, se isso acontecer que eles procurem ajuda e internação no Palácio do Planalto.            

           

14 de outubro de 2020

Precauções!


Um dia o governante de extrema direita de um país hipotético acordou com a missão de assinar o decreto para a construção de novas penitenciárias. A criminalidade aumentava no lugar e ele temia não ter mais vaga para detentos em breve. Esse negócio de criar empregos, fazer justiça social, essas coisas de comunistas poderiam ficar para depois, num projeto do tipo "Meu país verde/amarelo", coisas do gênero.

Os auxiliares estavam ao lado. Projeto com portas de aço reforçado, celas com espaço exíguo, privada de buraco no chão, nada de banho de sol, canceladas as visitas de parentes, comida sem controle de qualidade, andrajos como vestimenta, enfim, os projetos que ele havia desenvolvido durante anos, nos tempos em que não precisava fazer nada como deputado na Câmara Federal de Brasilândia, onde os dias transcorriam entre assinaturas de nomeações e demissões, desvio de dinheiro de "rachadinhas", feitura de discursos de elogios a ditadores e torturadores de seu credo político, essas coisas sempre necessárias.

Um dos assessores falou: "Quero que o senhor veja o projeto dessa área afastada da ralé, inspirada nas prisões cinco estrelas de Monte Carlo, às quais a gente deve acrescentar ar refrigerado, TV de 80 polegadas, chuveiros eletrônicos e outras mordomias mais". O governante ficou maluco: "Vai tomar no cu, porra! Que prisão de luxo merda nenhuma. Por que eu faria uma coisa dessas na penitenciária?". O assessor respondeu: "A gente não pode prever o dia de amanhã. E também temos nossos filhos, né!". Então  governante deu um tapa na bunda do outro e completou: "Bem pensado, faça isso".

Voltando para o mundo real, o presidente Jair Bolsonaro não vetou o trecho da lei que impediria a soltura do chefe do PCC, hoje em liberdade quem sabe no Paraguai, quem sabe na Bolívia, quem sabe em outro lugar. O Congresso também não votou definitivamente a lei que leva à prisão todo e qualquer indivíduo com condenação em segundo instância. O Supremo só está se movimentando agora. A gente não sabe do futuro! São necessárias precauções!

Em tempo: a foto acima é da prisão de Monte Carlos. Onde Salvatore Caccciolla esteve por algum tempo. Ele é capaz de jurar que essa aí dá de dez a zero na Papuda.            

8 de outubro de 2020

A reedição necessária


Dentro de menos de dois anos estaremos comemorando o bicentenário da Independência do Brasil. E será a hora de darmos aos brasileiros, além de desfiles militares, tiros de canhão, discursos vazios de sentido, falsas demonstrações de patriotismo e cargos comissionados bem remunerados aos bajuladores, coisas muito mais palpáveis. Caras! Sobretudo daquelas que nos remetem ao passado, como o livro "A expedição de Pedro Álvares Cabral - e o descobrimento do Brasil".

Explico melhor: em 1919 (alguns dizem que em princípios de 1920) o governo brasileiro incluiu nos festejos do centenário da independência um livro que seria - como efetivamente foi - encomendado ao político, historiador, e escritor português Jaime Zuzarte Cortesão (1884/1960. Contaria a história da viagem de Cabral aos brasileiros, pois pouco de real se conhecia então. Ou se sabia errado. Cortesão mergulhou na tarefa, pesquisou até onde foi possível e escreveu um livro riquíssimo.

Essa obra da Livrarias Aillaud E Bertrand (Paris-Lisboa) foi impressa nas oficinas gráficas da Biblioteca Nacional e distribuída em 1922. Com 330 páginas, logo se esgotou aqui e em Portugal. O autor começa dizendo que "Em boa verdade, não nos pertence a iniciativa dêste livro. Convidados a colaborar na História da Colonisação do Brazil, a obra monumental, com que a Colônia portuguesa em terras brasileiras celebra o Centenário da Independência da nação irmã, e tendo-nos cabido, dentro do seu lago plano, o relato da expedição de Pedro Álvares Cabral..." e seguiu adiante para dizer que, ao final e ao cabo a tarefa esgotou proporções que excediam o âmbito marcado.

Pesquisa de fôlego. Contém até um "Exame das fontes e primeiros textos sôbre a expedição". Não se esgota como uma simples narrativa e nem contém apenas a carta de Pero Vaz de Caminha ao rei Dom  Manoel, como é comum por aqui. Resgata vários documentos. Contém ilustrações belíssimas. Enfim, tem peso como documento histórico.

Mas o livro se esgotou. E ao menos no Brasil não teve o tratamento e a perenidade que deveria ter. Foi relegado a um plano inferior, sua edição sumiu das livrarias e hoje quase poucos sabem dele. Mas existe. Comigo guardo, em perfeito estado e com sobrecapa dura, um dos raros exemplares existentes no meu país. Ele deveria ser reeditado. Merece ser reeditado. Tem que ser reeditado porque há tempo para isso, os brasileiros precisam ter esse trabalho e ele nos pode ser entregue antes de 7 de setembro de 2022, inclusive acrescido de novas pesquisas.

Sim, existe o risco de a Secretaria da Cultural federal não achar que isso tenha a menor importância. A gente sabe quem é o secretário... E que seu chefe presidente deverá se perguntar o que ele estaria a fazer em um lançamento de livro, sobretudo em biblioteca, livraria ou editora, esse ambiente de contestadores e terroristas comunistas sanguinários. Mas mesmo assim vale a pena alguém levar essa sugestão a ele.

Não foi possível? Mal menor. Há no Brasil empresas e instituições que podem se ocupar disso com o maior compromisso e prazer. Como a Academia Brasileira de Letras (ABL), o Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB) e muitas outras. Será preciso tentar. Em nome de nossa história, é oportuno fazer isso. Ou então, 50 anos depois, vamos nos condenar a ver uma nova edição atualizada daquele sesquicentenário de pobre recordação.

Quem toca o projeto? Mão à obra, ainda que a gente corra o risco de continuar a ver mais livros raros sendo jogados ao lixo ou queimados como volta a acontecer hoje no horizonte do Brasil.                                   

6 de outubro de 2020

Nosso deserto de ideias


Somente nas últimas 24 horas recebi por WhatsApp ou Facebook, produzidos pelas fábricas de fake news a serviço dos interesses do atual governo federal, dois envios de mensagens propagandísticas. Num deles um homem sustenta o corpo faminto de certa mulher idosa (a própria mãe?) e o texto nos remete à "crueldade dos comunistas venezuelanos". A foto bem pode ser da Venezuela, posto que a miséria lá é grande.

No Brasil varonil dos tempos modernos, temos agora em números do IBGE informações de que nossa pobreza passou de 26,7 por cento para 27,4 por cento da população nos últimos dados fechados. Os extremamente pobres, aqueles que não têm sequer para comer, chegam a 13,5 milhões de pessoas. Isso porque a pobreza extrema é medida para quem recebe até R$ 145,00 por mês e, no caso atual do estado fascista brasileiro essa cifra cai para R$ 89,00 mensais. O contingente é muito superior ao Venezuelano, mesmo com a "amizade" entre um fritador de hambúrgueres e os filhos do atual presidente dos Estados Unidos.

No outro envio o cidadão Ricardo Salles, hoje ocupando o cargo de ministro do Meio Ambiente, diz que o atual governo protege os milhões de moradores das regiões amazônicas enquanto os anteriores, de esquerda, teriam feito o inverso só pensando na manutenção de árvores e com seus membros acumulando condecorações. Fala isso de forma falsa - os números não são reais - enquanto o Brasil queima por obra e graça de incendiários incentivados a colocar a cada dia mais fogo no país justamente pela ideologia do governo federal. Ao menos o título da postagem é real: enquanto o ministro fala a palavra "Avassalador" aparece em grande destaque logo acima de suas palavras vazias de sentido, mas feitas do fogo que avassala.

E por que esse tipo de discurso tem efeito, arregimenta apoiadores e alimenta a rede de fake news mantida pelas dezenas de sites a serviço do fascismo atual? Porque a oposição não tem um discurso uno, não tem um horizonte definido. Não denuncia com força! No caso dos seguidores de Bozo, o que eles fazem é lembrar a cada dia os roubos atribuídos aos governos anteriores, sobretudo ao PT - e vamos combinar que se roubou mesmo muito naquelas administrações! - e atribuir ao atual todas glórias e todas as virtudes.

Ora, sabemos dos vínculos dessa administração com milícias criminosas, sabemos das rachadinhas, das agressões ao Estado Democrático e de Direito, dos atentados contra os princípios de país laico, das empresas chocolateiras ou não de lavagem de dinheiro e do imenso esquema montado para evitar que o presidente e seus filhos respondam a processos criminais. Sabemos dos acordos com o Centrão e que o presidente é oriundo dele. Sabemos disso e de muito mais coisa. E não fazemos nada.

Quando o atual governo terminar deixaremos aos nossos filhos e netos não apenas a miséria absoluta desse cidadão da foto aí acima, passando fome enrolado na bandeira do Brasil, mas também a herança de um país com o meio ambiente destruído. E poderemos, se sobrevivermos a isso. dizer àqueles que nos sucederão que além de um Brasil destruído estamos deixando a eles um deserto de ideias.