25 de abril de 2024

Sejam heróis vocês!

"uns dizem a sua "história"
outros fazem história
e hão-de viver no exemplo e na memória"

O texto que abre esse artigo é do poeta português José Magro (José Alves Tavares Magro). Esse escritor revolucionário português também vai encerrar meu texto. Trata-se do homem que lutou a vida toda contra o salazarismo, contra a ditadura de seu país, passou 21 anos na prisão - na maioria do tempo em Peniche, para onde a PIDE de Salazar mandava os presos políticos - e só viveu por apenas quase seis anos depois do 15 de abril de 1974, data que hoje completa 50 anos. Morreu pouco antes de completar 60 anos de idade, debilitado que estava por inúmeras torturas e privações. É de gente como José Magro que é construído o futuro do gênero humano. Por essa gente vale a pena viver e lutar!
E foi uma senhora portuguesa, Celeste Caeiro, dona de casa e na época com 40 anos, quem deu nome ao movimento civil e militar que tirou do poder o salazarismo. Ela voltava para casa e viu aquele movimento todo, blindados nas ruas, parou e ficou olhando. Um soldado de entre os amotinados chegou a ela e pediu-lhe um cigarro. Celeste não tinha, não fumava nem nunca fumou. Tirou um dos cravos vermelhos do maço que havia comprado no mercado para enfeitar sua casa e o entregou ao soldado que colocou a flor em seu uniforme. Em pouco tempo outros amotinados encontravam mais cravos, muitos foram colocados até nos canos das armas e as flores acabaram dando home ao movimento que encerrou em Portugal seus tempos mais tristes. A imagem que ilustra esse texto recria o momento em que Celeste entra para a história. Hoje aos 90 anos, debilitada pela idade ela foi instruída pelos médicos a não se emocionar. Como, doutores?
A Revolução dos Cravos é um exemplo. Foi a mais longa ditadura europeia, mais longeva que a de Francisco Franco. E nos 50 anos que se seguiram a ela Portugal deixou de ser um país inexpressivo para se tornar modelo na Europa. Nem mesmo os riscos dos tempos atuais, quando uma extrema direita criminosa tenta dominar o mundo, surge como divisor de águas naquela terrinha de meu avô materno. Como eu gostaria de estar lá hoje! Que pena não estou e só posso ver tudo isso via satélite!
O texto abaixo chama-se "Sê herói, José". Eu digo a todos: sejam heróis vocês. Todos nós. É nessas horas decisivas que o homem se impõe ou tem que viver se escondendo e camuflando suas condições subterrâneas que às vezes afloram em posts de internet enviados para lugares errados e por engano dos diversos milhares de membros dos gados fascistas modernos daqui e de muitos outros países. Aqui, por exemplo, chegamos ao cúmulo de ver durante meses sociopatas acampados em frente a unidades militares pedindo golpe de Estado, rezando para pneus e extra terrestres. Nenhum povo foi mais bizarro que o nosso. 
A mulher de José Magro chamava-se Aída, viveu 102 anos e durante esse tempo todo dignificou o nome de seu companheiro de vida e de Partido Comunista de Portugal. Ela colecionou as poesias do marido que depois seriam publicadas em dois livros. São uma história de vida, de lutas e de ideais que sobrevivem aos homens, como aconteceu na Revolução dos Cravos. Eis o poema feito na prisão de Peniche:

SÊ HERÓI, JOSÉ

tarde de domingo
no largo da vila
toca um realejo que se ouve daqui
no pátio interior prossegue o recreio
e ouço o sussurro da voz dos amigos
não sinto mais nada
o mundo é a cela
veleiro sem vento num mar de vazio

a vida é tão curta e a tarde tão longa!
como hei-de passá-la se só tenho um livro
que li e reli e já nada sugere?!...
deitar-me não quero que logo não durmo
cantar não me deixam falar é de doido
passear os três metros pior que funâmbulo?!...

José que fazer se sei que não gostas
Da introspecção seguro que estás
Que a chave do mundo não cabe no umbigo
E temes ser santo que os santos não têm
O travo salgado do gosto da vida
E os traços de classe que a luta te dá

Que coisas heroicas José que farias
lá fora esta tarde
aqui por teu mal
o grande heroísmo é não fazer nada
Pois é:
- sê herói, José, e sorri…

“TORRE CINZENTA - Poemas da Prisão”
José Magro. C
oleção “Resistência” editora AVANTE!)  

23 de abril de 2024

A política que eles fazem


Alguns se assustam com o fato de o atual governo estar perdendo prestígio junto à população brasileira de modo geral. Não é para assustar. Esse é o resultado da política que eles fazem em confronto com o que se tenta fazer hoje na luta pela reconstrução do Brasil vilipendiado durante quatro anos pelo movimento de extrema direita intitulado "bolsonarismo", e que se instalou no país na calda de cometa do episódio pouco explicado da tentativa morte do então candidato a presidente durante a campanha política.

O ex-presidente não conseguiu se reeleger, mas deixou a reação plantada em solo muito fértil. Legou a seus seguidores um Congresso que é em parte sua cara e defensor incondicional de seus projetos, uma classe média ainda mais reacionária e de garras afiadas, um setor chamado evangélico com pretensões de poder, uma base policial e militar capaz de conspirar a céu aberto e seguidores hoje colocados à frente do poder estadual de algumas das unidades mais importantes do Brasil. Não seria preciso mais do que isso...

Mas a essa reação instalada se soma a inegável capacidade que a reação tem de controlar as chamadas redes sociais e fazer com que elas divulguem todos os dias um número incontável de mensagens mentirosas, torpes, capazes de construir falsas realidades, destruir as que temos e monitorar sem parar um só segundo o rebanho de gado que distribui esse projeto de poder via narrativas de laboratório. De vez em quando um dos milhares de membros do gado reacionário da extrema direita se equivoca e envia os posts muares para endereços errados. Erros às vezes hilários, às vezes lamentáveis...

O que fazer contra isso? Não entrar no jogo, não descer ao nível deles e entender que agem explorando a ignorância popular - vejam os novos evangélicos! - e incitando o ódio instalado em parcelas pouco instruídas da população brasileira, sobretudo na classe média que sonha escalar a montanha da riqueza com a ajuda de um messias qualquer que seja capaz de alimentar esse delírio muito parecido com o que mostram os pastores das "confissões" cheias de vontade de abarrotar seus cofres de dinheiro dos dízimos.

Saber também que isso tudo vai passar. Basta àqueles que combatem o reacionarismo entenderem que combatem o bom combate. Mas que nessa luta não se pode errar muito, nem ao menos falando o que não se deve em hora errada. Acertem na mosca! E nos vermes!                      

21 de abril de 2024

Democracia, sempre!


Parece, e é uma ironia do destino: há 50 anos, no dia 25 de abril de 1974 os portugueses derrubavam a ditadura de Salazar na Revolução dos Cravos. Há 40 anos, no dia 25 de abril de 1984 o Congresso Nacional recusava por 22 votos a Emenda Dante de Oliveira e atrasava mas não evitava o fim da ditadura militar brasileira que nos infelicitou por 21 anos. Os comícios das "Diretas, Já" (foto), lembravam a emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas para presidente da República. Os estertores do regime militar não tinham mais forças para impedir a queda do estado de exceção no Brasil.

O mais irônico é que nosso país se repete de tempos em tempos. Faz sua história como uma sequência de ondas que avançam e recuam, e isso só nos serve para atrasar o progresso do país e provocar a cada dia mais divisão e distância entre os brasileiros. A ditadura nasceu através de grande apoio da classe média - sempre ela! -, que gerou as "marchas da família com Deus pela liberdade". Deram gás ao golpismo incorporado às forças armadas e tiveram então o descarado apoio dos Estados Unidos através, até, da "Operação Brother Sam", que enviou uma frota da marinha dos EUA à costa de nosso país para ajudar no golpe.

Hoje os golpistas agem da mesma forma que antes. Eles não mudam! Geram instabilidade política, sonham com um golpe de Estado, vão às ruas acusando uma eleição lícita de ter sido fraudada e ainda de o Brasil estar se aproximando de uma ditadura através do Supremo Tribunal Federal (STF), quando acontece exatamente o contrário e foi essa mesma Justiça apoiada por grande parcela da população quem impediu a quebra da normalidade democrática no ato culminante do esquema de golpe, em 08 de janeiro do ano passado. Até para tentar reescrever a história essa gente é canalha. Incompetente! Não se trata de conservadores, embora alguns o sejam. A enorme maioria é composta por reacionários sem princípios e  apreço às normas democráticas que sempre marcaram nossa história desde o primeiro dos golpes, a Proclamação da República do final do Século XIX.

A democracia mais uma vez vai sobreviver e a população brasileira continuará a ser soberana para escolher seu destino. Enquanto estamos comemorando os 40 anos das "Diretas, Já", populacho reacionário ocupa Copacabana para ouvir discursos pobres e mentiras construídas com o objetivo de derrubar um governo legal. Como em 1964, como em outras oportunidades mais anteriores. Mas vão perder, como sempre perderam. Porque não têm substância e nem um projeto de progresso, mas só de destruição. Vivem num universo paralelo, construído só para eles e sustentado pelo pântano político onde estão.

Democracia, sempre!

15 de abril de 2024

Ao fim, o sionismo!


Ao fim de tudo e justificando as ações que nos remetem aos dramas do Oriente Médio está o sionismo. Ele é a fonte de todos os crimes daquela região e do crescimento de um apoio injustificado ao expansionismo de Israel que não parou desde 1948 quando, sob o peso dos traumas provocados pelo genocídio dos nazistas na II Guerra Mundial, milhares de palestinos foram expulsos de seus lares para a criação do Estado de Israel circunscrito a fronteiras que os sionistas jamais aceitaram. Esse é o ovo da serpente!

O sionismo político foi gerado na Europa no final do século XIX, em um contexto de crescimento do antissemitismo (aversão aos judeus) naquele continente. O movimento surgiu de ações do jornalista húngaro Theodor Herzl, o responsável pelo surgimento de uma organização internacional para defender a ideia de constituição do Estado Nacional Judeu na Palestina. Esse movimento, o sionismo, foi influenciado pela obra "O Estado Judeu" (Der Judenstaat), escrita por Herzl. Ela resultou do crescimento do antissemitismo no continente europeu e sua produção foi motivada pelo caso Dreyfus, a condenação de Alfred Dreyfus, oficial do Exército francês, acusado de alta traição. Ele era inocente e, mesmo sem provas, acabou sendo condenado à prisão perpétua. Por esse motivo surgiram questionamentos sobre sua punição, que ocorreu pelo fato de ser judeu. Ou seja, foi uma pena antisemita!

Desde 1948 o sionismo expande as fronteiras de Israel. Sim, o Estado Judeu sofreu ataques por parte das diversas nações árabes, sobretudo dos Palestinos, ao longo desses anos. Mas é preciso não nos esquecermos de que os judeus invadiram aquelas terras. Israel poderia ter se dedicado a fazer a paz com os estados vizinhos através de  concessões ou outras formas de aproximação. Mas não. Eles queriam e querem não apenas o que lhes foi destinado pela ONU, mas muito mais. Querem toda a "Grande Israel" e por isso hoje ocupam ilegalmente a Cisjordânia de onde não pretendem sair nunca mais, e as terras anexadas a partir das guerras acontecidas. Aliás, só o que foi tomado ao Egito voltou às suas fronteiras históricas. Eis um retrato do drama, feito em poucas palavras.

Por isso a ONU não considerou o bombardeio de uma embaixada por Israel antes de condenar o ataque do Irã e por isso os atos terroristas do início de outubro passado foram condenados como deveriam ser, mas sem que se considerasse que o Hamas atacou terras ilegalmente ocupadas pelo estado judeu. Por último, a maior parte da população de Israel apoia hoje o sionismo e a política de Estado do seu país, o que é um erro.

Poucos são inocentes nessa guerra, além de mulheres, velhos e crianças palestinos.          

10 de abril de 2024

É disso que eles estão atrás


Em um dos dias que se seguiram à eleição do presidente hoje genocida e inelegível, encontrei-me com um conhecido para tomar vinho no supermercado Carone que fica localizado no início da Avenida Rio Branco, esquina com a Leitão da Silva. Ele é um bolsonarista fanático, formado pela Escola Superior de Guerra, e não vou revelar seu nome aqui em respeito à confidencialidade. Mas ele me disse o seguinte: "Não foi Bolsonaro quem ganhou a eleição. Fomos nós. E se tentarem nos tirar do poder vai haver ruptura!" Não houve a quebra da normalidade democrática que estava programada desde o início porque o presidente era e é muito burro, mas a extrema direita fincou os pés no Brasil.

Hoje mesmo o presidente da Câmara, o milionário "coronel" Arthur Lyra, que quer defender seu patrimônio construído sabe-se lá como, disse que não vai levar à votação a PL da regulamentação das redes sociais como a "X", por exemplo, porque não há consenso. Não há e nem haverá. É a extrema direita, que tem Lyra na coleira, quem rejeita regulamentar as fábricas de mentiras que assolam o país. Ele precisa continuar à frente do poder, fazer seu sucessor na Câmara, e esse é o preço a pagar. Ele o paga e nós que nos danemos.

Elo mundial dessa cadeia de extrema direita com fome de poder, o bilionário Elon Musk já atacou o governo brasileiro de todas as formas. O alvo dos ataques, hoje, é o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, mas o objetivo maior é destruir os Poderes Executivo e Judiciário para fazer a rapina mineral brasileira, onde os objetivos maiores são o lítio, o nióbio e o grafeno, minérios que ele precisa e o ex-presidente aceita dar de graça à Tesla em troca de apoio e poder: é disso que eles estão atrás: de poder!

A fome é imensa e o projeto extremista envolve tomar tudo o que for possível abraçar. Até aqui no Espírito Santo, um Estado pequeno, já são fortes na política regional, no comércio, indústria, serviços e colocaram as patas sujas até na Academia Espírito-santense de Letras. Sim, uma entidade mantenedora da cultura interessa pois uma das metas dessa gente é dominar as mentes e a produção científica de modo a que seu progresso seja atrelado, amarrado a fronteiras medievais onde estão encastelados os novos "evangélicos" hoje com enorme sede de ocupar os governos centrais.

Eles querem tudo. Inclusive o Palácio do Planalto!  

9 de abril de 2024

Musk, os outros e os tempos estranhos


De repente, como que surgido do nada, um megaempresário sul-africano naturalizado norte-americano, Elon Musk, se volta contra o Brasil (foto). Mais precisamente contra o Poder Judiciário brasileiro, dizendo com todas as letras que não vai mais respeitar as normas legais de nosso pais. Como se este fosse um apêndice de suas empresas. E isso me remete a um fato passado, quando um ex-presidente, montado num palanque da Avenida Paulista disse também com todas as letras que não iria mais respeitar as normas do Supremo Tribunal Federal. Ambos ameaçaram e ficaram por aí mesmo. Os dois, sobretudo o segundo, sente um medo grande de dar um passo à frente e terminar na prisão.  

O bilionário joga um jogo de alto risco ao comando de uma rede social que se chamava "Twitter", agora virou "X" e que perdeu mais de 70 por cento de seu valor de mercado desde a compra. Ninguém sabe ao certo o que ele pretende com seu negócio. E nem porque escolheu o Brasil como inimigo preferencial. Mas sabemos todos que ele tem contra si o Poder Judiciário, o Poder Executivo e parte do Poder Legislativo brasileiros, todos dispostos a enfrentar a arrogância desse cavaleiro da triste figura. Ele certamente pode estar enfrentando um inimigo superior à sua capacidade de combate e ainda não percebeu isso.

O lamentável é que o ataque desse tal Musk atinge em cheio a soberania nacional, pois ele desafia nosso país no que tem de mais caro: a inviolabilidade da Constituição. Nenhum Estado do mundo aceita ser atacado dessa forma sem uma reação pronta e legal. Mas causa espanto, embora não seja surpresa, que parte do Congresso Nacional, sobretudo e principalmente sua extrema direita não se insurja contra a aberração. Ao contrário, a apoia como se isso se tratasse de fato banal, corriqueiro e possível de ser trazido para o tanque de lavar roupa suja da política brasileira e ao abrigo da inépcia e do adesismo do presidente da Câmara, Arthur Lyra.

As postagens que foram retiradas do ar no "X" referiam-se a comentários mentirosos e divulgadores de mensagens falsas produzidos pela extrema direita do Brasil e que tinham por objetivo difundir o ódio entre brasileiros. Existe uma central de difusão de mentiras entre nós, gestada durante o período da última presidência e que continua em atividade enfrentando as normas legais apesar dos esforços das cortes judiciais superiores de agirem rigorosamente dentro do que pregam as leis. E isso persiste graças ao medo e ao adesismo de ocasião de pessoas como o presidente da Câmara, que age pensando unicamente na defesa de seus interesses privados e corporativos.          

Não mais, não será assim. O Brasil haverá de reagir contra isso.  

4 de abril de 2024

Teologia do Domínio, o inimigo!


Muitas vezes a gente se depara com esforços voltados ao domínio do inimigo errado.  Aqui no Brasil estamos às voltas com o combate ao que se chama de "bolsonarismo" e que é representado pelos projetos e ideais (sic!) dos seguidores do penúltimo presidente da República. O maior inimigo, o mais poderoso, se esconde por trás dele. E não está só no nosso país, mas sim tentando tomar boa parte do mundo através das falas grosseiras e provocativas, belicosas sim, da extrema direita mundial. Refiro-me ao que se chama de "Teologia do Domínio", e que cresce nos esgotos da extrema direita religiosa.

Recentemente, na maior exposição pública do bolsonarismo em São Paulo, a mulher do ex-presidente, Michele Bolsonaro, deixou claro que sua intenção como representante desse grupo é levar o extremismo religioso a tomar o poder. Fazer no Brasil um "estado cristão" em substituição e contraposição estado laico que temos e no qual foi construída a identidade nacional multiétnica, plurirreligiosa e que não congrega apenas cristãos, mas praticantes de diversos outros credos, alguns de povos originários, outros trazidos da África e que constituem um universo de crenças e valores responsável por nossa identidade como povo.

E também por nossa paz interna! 

O candidato a presidente do Estados Unidos, Donald Trump, lançou uma "bíblia". Nela ele insere a fina flor do pensamento extremista dos EUA onde também quer um estado cristão e onde identifica seus maiores inimigos como sendo imigrantes dos mais diversos lugares, mas preferencialmente de estados latinos. Chama-os de "animais", dentre outras coisas. Segue a cartilha de extremistas da Hungria, Itália, Israel, Portugal e outros países onde essa parcela do pensamento político escala o poder usando meios legais que depois serão destruídos porque o extremismo de direita vive em função de domar os detratores que faz.

Eis nosso inimigo mais perigoso. Ele vai tentar tomar o poder para depois destruir o Estado Nacional que temos e colocar em seu lugar um arremedo de Brasil, um monstrengo de inimigos uns dos outros e onde, como já preconizou o ex-presidente que comanda seu exército de idiotas, inocentes úteis e outros nem um pouco inocentes, para tentar destruir toda a estrutura do país erguido a tão duras penas por nós, sobretudo após a ditadura militar. Essa a hora de começarmos e combater o aleijão teológico e político. Depois pode ser tarde.

Quem viver, verá!

1 de abril de 2024

Faz 60 anos... (final)


O tempo destrói seus símbolos... Agora mesmo, pela manhã, fiz essa foto da antiga casa de meus avós, no Centro de  Vitória (foto). Depois da morte de vovó ela foi vendida para uma família que em seguida a passou para outra e daí em diante. Hoje, até a sorveteria que nunca teve placa com essa identificação voltou a se chamar "Garagem". Não tem mais o charme de antes. Já não remete mais a 1964 quando, acho que no dia 02 de abril minha avó atravessou a rua para conversar com a amiga Mariazinha Monjardim e tentar obter informações mais confiáveis sobre a situação em que se encontrava o Brasil. E ele estava mal!

No pequeno pedaço da rua do Centro de Vitória muitas pessoas já começavam a adorar a ditadura que nascia! Assim como hoje! Era muito melhor do que o "comunismo" que estava chegando. E esse medo foi totalmente infundado. Na verdade vivíamos as vésperas da perda de direitos civis, o prelúdio das prisões sem mandado judicial, das invasões de locais de trabalho ou residências para a detenção ilegal de cidadãos que não apoiavam o novo regime. Policiais violentos se apresentavam aos órgãos de repressão para formar fileiras em torno da "nova ordem". Não seriam apenas os militares os algozes dos brasileiros. Os civis também estavam a postos para cumprir a sua parte na tarefa de fazer o serviço sujo.

Meu avô português morreria em 1974, 15 dias antes da Revolução dos Cravos, de Portugal. Ele não viveria para ver o fim do salazarismo. Minha avó ainda viveu mais nove anos, morrendo em setembro de 1983. Também não assistiu ao fim da ditadura, que foi extinta por inanição dois anos depois. Nem sei se naquela época Mariazinha ainda era viva... A solteirona era um caso único, ao que parece. Durante 50 anos foi noiva de um também solteirão e jamais se casaram. Às vezes eu os via sentados em poltronas da varanda da casa dela, conversando e tomando refresco. Não me recordo sequer de um pegar na mão...

Os outros vizinhos todos morreram. O prédio ao lado com quatro casas alugadas foi derrubado depois que o último inquilino desocupou o lugar. Lá morou durante um bom tempo o major Orlando Cavalcanti, homem violento, sicário que foi morto com mais de dez tiros um belo dia em Nova Almeida, atraído a uma cilada. A família Schuab Pinto, dona do terreno, construiu lá seu novo prédio. Está totalmente desvirtuada a residência que pertenceu a Edgard Castro, marido de dona Abigail, muito amiga da minha mãe e dona da primeira boutique de Vitória. Ela precisava ser consolada quase todos os dias depois que o filho Ronaldo foi o principal acusado pela morte da moça Aída Cury num crime de estupro tristemente famoso no Rio de Janeiro.

Lá morou um dos donos do frigorífico Frincasa, de Cariacica. Também Oswaldo Magalhães, o Careca, peão da Vale do Rio Doce e gente muito fina, apaixonado por caçadas das quais participava juntamente com os amigos ricos. O fotógrafo Moacyr Rodrigues da Silva, que foi referência em Vitória. Também Castorino Santana, cuja papelaria ficava na Rua General Osório. Lá uma vez vovó pediu nota fiscal e ele disse que "essa mercadoria está em falta". Pouco mais de 150 metros de rua que nasce atrás do Palácio Anchieta desemboca no Viaduto da Rua Caramuru, e um universo inteiro estava lá. Também havia o Centro Espírita e até a casa do professor Zaidan, que lecionava no Colégio Americano onde estudei eu por dois anos. Aquele mundo, para o bem e para o mal, deixou saudades em muita gente, como em mim.

Mas ditadura, isso nunca mais!    

31 de março de 2024

Faz 60 anos... (7)

Na Rua Francisco Araújo daqueles tempos - 1964 incluído - um dos pontos de encontro do lugar era a sorveteria do Seu Zé Maria, que vinha a ser meu avô, o velho imigrante português de Trás os Montes que havia se casado com a baiana Almerinda Villela dos Santos. Inicialmente o lugar seria a garagem da casa, mas como o velho nunca teve carro, quando se aposentou do serviço público, ele montou a sorveteria lá. Meu pai mandou, de São Paulo, a primeira máquina de fazer picolés de Vitória. Era elétrica e trabalhava com as formas girando em salmoura. De lá saíram milhares de picolés, a maioria vendidos para as normalistas da Escola Normal D. Pedro II. Ali era o caminho delas. As meninas que vinham da região do Parque Moscoso, Cidade Alta e mesmo outros bairros como a Vila Rubim e Santo Antônio, passavam pela nossa casa. E era quase inevitável parar na sorveteria onde eu sempre estava sempre à espreita... Nos dias 1º e 2 de abril de 1964 foi a mesma coisa. E Seu Zé Maria, como sempre fazia, acordou cedo para preparar seus milhares de sorvetes. Melhor dizendo, picolés...

A cidade parecia calma então. Mas ontem como hoje... só parecia... Grupos políticos locais conspiravam uns contra os outros. O governador Francisco Lacerda de Aguiar, o Chiquinho, era alvo da família Monteiro Lindenberg, agora dona do jornal A Gazeta. Eles acusavam o chefe do executivo de ser corrupto, ladrão - um velho expediente -, embora quem tivesse o apelido de "Papa Terra" fosse o senador Carlos Fernando Monteiro Lindenberg... A campanha só faria crescer até o dia em que, sentindo que seria cassado, o governador abreviaria seu suplicio e renunciaria ao mandato, voltando para sua fazenda no interior do Estado. O melhor caminho.

Era um clima pesado que a garotada do futebol não conhecia enquanto jogava bola em seu microcosmo da Rua Francisco Araújo, na quase inocente Cidade Ata. Quase, porque nas casas o reacionarismo travestido de conservadorismo iniciava seu movimento de apoio à ditadura, apontando os dedos para aqueles dos quais não gostava. O começo de um movimento dito de cunho político, mas que escondia por trás de suas vestes o ódio ao próximo e a vontade de lucrar com a nova situação política, a ditadura.  Ontem como hoje...

Nas redações de jornais isso era visível. Temeroso de que o jornalista Darly Santos, o Michey, titular de uma coluna de esportes no jornal A Gazeta viesse a ser preso - isso antes do episódio da ida dele ao quartel do Exército em Vila Velha -, o também jornalista e colunista social Hélio Dórea o chamou à sua sala. Darly foi. Hélio então jogou sobre a mesa um molho de chaves e disse: "São as chaves da minha casa em Guarapari, na Praia das Virtudes. Vá para lá e fique quieto até a tempestade passar". Incrédulo o velho Darly . disse: "Mas eu posso ser preso lá!". O colunista, por detrás de sua máquina de escrever, sorriu e disse: "A Polícia não vai procurar comunista na casa de Hélio Dórea!"

Desde aquela época ele era gente muito bacana!

30 de março de 2024

Faz 60 anos... (6)


No dia 1° de abril de 1964, isso eu saberia depois, a caça aos comunistas do Espírito Santo começou rapidamente. No jornal A Gazeta havia muitos jornalistas ligados a grupos de esquerda e a partidos comunistas, como eram os casos do PCB, o Partidão, e o PCdoB. Em A Tribuna também, mas o número era menor. Eles se tornaram alvos fáceis dos militares e civis ligados à ditadura muito rapidamente. Muita gente acabou perseguida desde o primeiro momento como foram, dentre outros, os muitos casos o jornalista Darly Santos e o músico Maurício de Oliveira. Darly ainda se escondeu por alguns dias na casa de praia de outro jornalista - vou contar esse episódio no artigo de amanhã -, mas depois retornou para enfrentar as feras de peito aberto. Maurício foi encontrado logo e detido. Ambos foram parar o 38º Batalhão de Infantaria, em Vila Velha, e deram sorte de não serem alvo de torturas ferozes. Mas isso os marcou, embora até de forma hilária.

Um oficial, Darly não se lembrava da patente, ficou diante de ambos. "Você é comunista?", perguntou para o primeiro. "Não, sou jornalista", respondeu ele. "Você é comunista?", questionou o músico em seguida. Maurício gaguejava quando ficava nervoso, o que estava acontecendo naquele momento, e tentou responder de pronto: "Não, sou vio-vio-vio-lo-lo-nista!" Sabe-se lá porque motivo, mas os dois foram liberados logo em seguida. E isso se deu nos primeiros dias da ditadura, quando o nível de selvageria dos fascistas ainda não era tão grande.

Mas isso duraria pouco tempo. O fotógrafo Gildo Loyola Rodrigues, que trabalhava em A Gazeta, era militante comunista. Um dia chegava à pensão onde morava e foi preso. Os policiais que o interrogaram tinha nas mãos o quadro com o prato do dia para o almoço. Coisa como "arroz, feijão, bile, macarrão, salada". O policial perguntou a ele: "qual é a senha?" Gildo tentou desesperadamente dizer que aquilo era o que comeriam no dia. Não adiantou. Foi torturado para revelar a "senha". Depois, transferido para o Exército, em Vila Velha, seu suplício continuou. Ele chegou lá com um dedo machucado e seu verdugo, ao ver aquilo, disse: "Está dodói? Vamos resolver logo." Com o cabo do fuzil, praticamente esmagou o dedo do rapaz. Ele, que nunca n vida fez mal a ninguém, precisou de internação psiquiátrica para se recuperar do trauma das dores lancinantes.

Mas na tarde do dia 2 de abril a garotada da Rua Francisco Araújo foi jogar uma pelada na parte plana da rua, logo abaixo da outra, a Comandante Duarte Carneiro e ao lado da escadaria. Isso depois das aulas, pois lá os que não estudavam no Americano eram alunos do Colégio São Vicente de Paula ou então do Estadual, esse último público e situado no Forte São João. Não tínhamos ainda como acompanhar os fatos que se desenrolavam, a não ser por relatos de terceiros. Era melhor jogar futebol, mesmo tendo que descer a escadaria vez ou outra para pegar a bola na Rua General Osório. A gente ainda não tinha noção de que em muito breve os cartazes de denúncias contra a ditadura ocupariam as ruas de todo o Brasil (foto). Viriam as passeatas, as greves, outras formas de protesto, e o erro da resistência armada nas áreas rurais, em confronto com a ditadura.

Vivíamos um prelúdio! 

             

29 de março de 2024

Faz 60 anos... (5)

Vista aérea de Vitória em 1964, ano em que houve o golpe de Estado no Brasil. Triste ano! 

Para crianças e adolescentes a noite do dia 1º para o dia 2 de abril foi como outra qualquer. Para os adultos, não. Muita gente teve dificuldade para dormir por não entender exatamente o que acontecia. Ainda com o presidente João Goulart no Brasil a ditadura tomou sua primeira medida: investiu, de madrugada, Ranieri Mazzilli no cargo de presidente interino  onde ele ficaria 13 dias sem mandar em absolutamente nada, já que um triunvirato militar exercia o poder de fato. Estava sendo preparado o palco para a posse de Castelo Branco, o primeiro dos cinco presidentes que se revezariam no poder até 1985, quando o regime ditatorial, totalmente exaurido, se encerrou. No dia 2 de abril acordei cedo, fiz o que fazia todos os dias e depois de ouvir inúmeros conselhos da minha avó, fui para o colégio devidamente escoltado por Élia, a fiel empregada que atendeu à família por muitos anos.

No Colégio Americano os rituais de todos os dias foram seguidos. Os professores deram aulas, a cantina funcionou normalmente e havia por parte do corpo docente a preocupação de não se falar de política, sobretudo da deposição do presidente Goulart. Quem quisesse saber desse tipo de assunto deveria ouvir rádio, televisão e comprar jornais que tinham mais ou menos a mesma linha. Ou conversar com os pais. Meu avô chegaria em casa com o "Diário da Noite", do Rio de Janeiro, exemplar trazido por um amigo que chegou a Vitória de avião pela manhã, e a manchete dizia: "Decidiu o Congresso essa madrugada - Ranieri Mazzilli é o presidente" Todas as letras em caixa alta (maiúsculas). Esse jornal ficou anos lá na casa da família até que alguém sumiu com ele. Jogou fora.

A quase totalidade dos outros seguiu o mesmo caminho. Mas não todos. A história registra que três jornais defenderam o respeito à Constituição: "Última Hora", "A Noite" e "Diário Carioca", sendo que os dois últimos tinham poucos leitores. A revista "Fatos & Fotos" noticiou "A grande rebelião", tentando dar um verniz de imparcialidade ao noticiário. "O Cruzeiro", que chegaria à nossa casa, deu uma edição extra com "Edição Histórica da Revolução". E surgia assim o termo "Revolução" ligado ao golpe de Estado e que a imensa maioria dos meios de comunicação usou desde então, o mesmo acontecendo com os militares. "O Estado de S. Paulo" não perdeu tempo e noticiou: "Vitorioso o movimento democrático". Estava decidido que o governo Goulart era antidemocrático! Bebeu do próprio sangue: inconformado em ter censores na redação, o Estadão passou a se opor à ditadura, não substituía as matérias censuradas e no lugar delas colocava receitas culinárias ou poesias. Todo mundo sabia o que aquilo queria dizer. 

Eu, uma vez no colégio fiz o que sempre fazia todos os dias: vi as aulas com atenção, no recreio comi um sanduiche de mortadela e tomei um refresco de groselha (como gostava daquilo!), conversei muito com os amigos e mais uma vez não pude sair no intervalo. Estava no ginásio e sair do colégio entre as aulas - na maioria dos casos para fumar um cigarrinho - só era permitido aos alunos e alunas do científico. Coisas do velho Americano! E na saída do colégio, uma surpresa: meu avô foi me buscar para "escoltar" até em casa. Andava com seu passo apressado de sempre, praticamente me rebocando e pedindo para que eu me adiantasse. Queria me ver dentro da residência o mais depressa possível. À noite, juntamente com a TV, ouvimos um pouco de rádio e ele vaticinou: "O novo governo vai ser portador de um tempo de muita paz para o Brasil."

Ele nunca tinha sido bom de vaticínios!      

28 de março de 2024

Faz 60 anos... (4)


A noite de 1º de abril de 1964 foi de busca de informações para muita gente em Vitória e cidades do mesmo porte. Afora Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre (para onde o presidente João Goulart havia se deslocado para ficar junto ao governador Leonel Brizola e tentar a resistência) e outras metrópoles, poucos tinham informações precisas sobre o que acontecia no Brasil e particularmente em Brasília. Era preciso esperar pelo noticiário noturno das TVs já controladas pelo novo governo ou adesistas a ele, ou nas rádios que estavam na mesma toada. Os jornais, esses circulariam no dia seguinte ainda sem sensores nas redações mas já com "orientações" sobre como noticiar o movimento que havia "salvo" nossa frágil democracia.

A cidade, com o por do sol, ficou ainda mais vazia. A maioria das pessoas não obrigadas a trabalhar à noite, preferiu se recolher mais cedo. E isso porque naquele mesmo dia começava, por parte dos militares a para eles incansável busca dos "subversivos". Garoto, na época, eu não conhecia ninguém do gênero. Mas depois de adulto, trabalhando com jornalismo, acabei amigo de muitos dos que sobreviveram.       

Os jornais, por sinal, eram precários e impressos em máquinas chamadas rotoplanas, com péssima qualidade de impressão. Na época nem existia diagramação em Vitória. Diagramação que por aqui chegou pelas mãos do artista gráfico e chargista José Antônio Nunes do Couto, o Janc, trazido para cá pelo diretor de A Gazeta Carlos Fernando Monteiro Lindenberg Filho, o Cariê, diretamente da Rio Gráfica e Editora (foto jornal de 1969). Diagramar era "desenhar" as páginas do jornal ainda na redação, numa reprodução das paginas chamado diagrama, colocando nelas todas as matérias, fotos, ilustrações, etc. Antes o que se fazia era descer tudo para oficina e lá, depois que os textos eram compostos, eles iam sendo colados nas páginas pelos gráficos. Quando o espaço era insuficiente, cortava-se o final das matérias e era colocado um "continua na página X". Ficava tudo cheio de "joelhos", mas era vida que segue... Por isso na época se dizia que pé de galinha e pé de matéria tinham sempre o mesmo destino, a faca ou tesoura. Então os repórteres concentravam o importante dos textos no início e deixavam o irrelevante para final. Os jornais de Vitória eram assim e não havia plantão para atualizar textos.

Sem informações precisas para obter e só com noticiário das TVs e rádios, vivemos do burburinho das conversas de rua com os vizinhos trocando impressões. A maioria, sem saber absolutamente em detalhes o que estava realmente acontecendo, achava que as autoridades estavam certas. Fui dormir naquela noite, assim como grande parte das pessoas de Vitória, sem ter um noção mais real do que se passava. Bom, porque muita gente não sabia de nada. Vovô e vovó tomaram a iniciativa de dizer que nos recolheríamos cedo. Mas antes uma informação ele tinha: haviam telefonado do Colégio Americano e dado uma boa notícia.

Ia haver aulas no dia 2 de abril!

27 de março de 2024

Faz 60 anos... (3)


Pode-se dizer que o dia 1º de abril de 1964 foi, por todos os ângulos, muito diferente dos outros, e já a partir do fato de que um golpe de Estado sem muitas explicações prontas, com dúvidas e medos, aconteceu justamente no dia dos mentirosos. Mas eu não tinha estrutura para pensar nisso naquele momento, em vésperas dos 14 anos, e voltei para a casa dos meus avós depois de passar pelas partes mais conhecidas do Centro de Vitória logo após o almoço. Deixando a Praça Oito de Setembro, em vez de ir em direção à Praça Costa Pereira (foto) andei pela Avenida Jerônimo Monteiro no sentido Parque Moscoso, passando por pontos que conhecia como as Lojas Helal Magazin, Casas Santa Terezinha e Hudersfield. Nessa última meu avô comprava, quando o dinheiro dava, os tecidos de seus ternos.

Em vez de subir a Escadaria Barbara Lindenberg, fui mais para baixo e entrei pela Rua General Osório. Ela me levaria à Escadaria Doutor Carlos Messina, de onde a gente às vezes tinha que descer correndo para pegar as bolas das peladas que eram desviadas durante os rachas na Rua Francisco Araújo. Passei pelos números 78, 92, 120 e 130, os prostíbulos da cidade e que rivalizavam com os da Volta de Caratoíra. Esses últimos não eram conhecidos pelos números, mas sim pelas cores ou acabamentos que ostentavam: Casa Branca, Casa Verde, Casa Caiada, etc.

Na porta de um dos prostíbulos da General Osório, sei lá eu hoje qual, uma das "primas" estava parada na porta vendo certa batida policial. Não, nada tinha a ver com o golpe de Estado que se desenvolvia no Brasil e que já havia afastado o presidente da República. Era só um bêbado que estava sendo colocado no "camburão". "Aprende a respeitar a Policia, safado", ouvi o policial dizer enquanto o empurrava para dentro do veículo e sapecava um tapa na cara do preso. Tão forte que o estalo pode ser ouvido à distância.

Na casa de vovô e vovó um "conselho de estado" estava formado. Meu tio Walter, um dos irmãos de mamãe, havia se reunindo com o pais e fui autorizado a participar das conversas. Ele, funcionário do Banco do Brasil, explicava com base em "fontes confiáveis" que um regime militar iria se formar para ajudar a salvar o Brasil do comunismo, mas que, mais uma vez segundo as fontes, essa intervenção se daria até as próximas eleições. Só isso, Um pequeno intervalo para tirar os contestadores e subversivos do raio de ação. Mas seria coisa pouca. insistiu meu tio respondendo a uma interrogação de vovó.

Sim, só duraria 21 anos...  

25 de março de 2024

Faz 60 anos... (2)


No 1º de abril de 1964 minha mãe, que morava em São Paulo juntamente com todo o restante da família, ligou para Vitória na hora do almoço, o que não era fácil. Queria saber de mim e conversei com ela rapidamente. Tive que ouvir o relato sobre um tal de "movimento democrático militar" que estava assumindo o poder no Brasil em lugar do "outro". Pediu-me para ficar em casa. Então almocei juntamente com meus avós - eram pais de mamãe - e fomos ver televisão. Nos velhos tubos de imagem que nos traziam o preto e branco cheio de chuviscos e sombras tomamos conhecimentos da deposição do presidente João Goulart no linguajar de justificativas que os militares já estavam controlando.

Ainda não se tinha a exata noção do que estava acontecendo, mas de boca em boca já se ouvia que o presidente não se encontrava mais em Brasília (estava a caminho do Rio Grande do Sul) e que logo um presidente interino (Paschoal Ranieri Mazzilli) assumiria a presidência (por 13 dias, até a posse de Humberto de Alencar Castelo Branco). Tudo era confuso, principalmente numa Vitória provinciana de meados da década de 1960. Meus velhos logo foram dormir a sesta de todos os dias e recomendaram a mim não sair de casa naquele dia. Saí tão logo eles dormiram.

Subi a rua Francisco Araújo passando ao lado do prédio da Legião Brasileira de Assistência (LBA) e saí na lateral do Palácio, a que dá para a Praça João Clímaco e ao lado da casa da família Barbosa Leão, hoje pertencente à Academia Espírito-santense de Letras e chamada de Casa Kosciuszko Barbosa Leão. Aparentemente estava tudo calmo, apenas com uma quantidade de soldados bem maior que o normal para a segurança da sede do governo estadual.

O governador Francisco Lacerda de Aguiar, o Chiquinho, não estava na rua. Consta que em seu gabinete palaciano. Poucos dias antes ele havia dado entrevista e dito que ficaria ao lado do presidente João Goulart para o que acontecesse. O que desse e viesse... Mas já eram dias perigosos! Segundo o anedotário de então, naquela manhã do golpe militar o comandante do 38º BI telefonou para ele. A conversa teria sido rápida: "Governador, fui incumbido de perguntar ao senhor de que lado está?". Ele respondeu de pronto: "Estou ao lado da Escola Normal!". A velha Escola Normal Dom Pedro II, de tanta saudade para mim...

Sentado em um dos bancos da praça, olhei para o prédio da Assembleia Legislativa ao lado e decidi andar em direção à Praça Oito de Setembro, descendo pela Escadaria Bárbara Lindenberg e dobrando à esquerda. Gostava muito de andar na região da Praça Oito (foto) para onde ia, dentre outras coisas sempre que precisava postar uma carta. Lá ao lado, na Avenida Jerônimo Monteiro, ficava a principal agência dos Correios.

Sim, era época de cartas...     

Faz 60 anos...(1)


Parecia um dia comum e todos estávamos em aulas naquela quarta-feira, até sermos chamados para ouvir o diretor do Colégio Americano de Vitória no auditório. Iam turmas grandes, uma a uma. O professor Alberto Stange Júnior, ar preocupado, disse rapidamente que o País estava vivendo um momento grave, de muita conturbação e, por precaução, as aulas daquele 1º de abril seriam suspensas. "Saiam agora da escola e todos para casa. Não fiquem nas ruas. Quem quiser pode usar o telefone e chamar os pais para virem buscar. Já há muitos parentes de automóvel por aqui. Vamos torcer para tudo dar certo".

Saí. Morava na casa dos meus avós quase ao lado do Palácio Anchieta, bem perto do Americano. Tudo no Centro de Vitória. Eles não tinham carro e eu sabia que voltaria a pé mesmo. Preferi passar pelo Parque Moscoso e vi que ele estava quase deserto naquele meio de semana. Uma falsa calma. Um veículo militar passou devagar e havia soldados armados olhando para os lados, como que procurando por alguma coisa "errada". Ao longo das horas eu veria muitos outros mais. Andei devagar e parei num ponto muito frequentado naquela época: o Bar Dominó. Estava com fome e naquele horário costumava lanchar na escola.

Hoje não me recordo mais o que pedi. Deve ter sido uma Coca-Cola e um misto quente. Sentei-me a uma das mesas do lado de fora, na calçada, e notei que os garçons estavam começando a fechar o bar. Um deles me fez sinal para comer logo o lanche e ir embora. Fiz isso. O que estaria acontecendo? É preciso entender que naquela época não havia celular, internet, nada disso. Os telefones eram pretos, de discar e ligações interurbanas tinham que ser feitas com a ajuda das telefonistas. Comecei a andar o trecho final.

Na lateral do Centro de Saúde, passei por um homem de meia idade, passo apressado, aparentemente indo para casa. "Ande logo, menino", disse ele. Eu apressei o passo e cruzei com um carro da Polícia Civil que também rodava bem devagar. Logo após a rua General Osório, subi a escadaria Doutor Carlos Messina (foto) e cheguei à Francisco Araújo, "rua de vovó". Ela estava na varanda, corpo debruçado para fora e me viu. Imediatamente fez sinal para que eu entrasse. Tudo aquilo era muito estranho para mim.

Meu avô havia saído sei lá eu o motivo e chegou em seguida dizendo que a cidade estava cheia de veículos militares e policiais. De onde eu estava era possível ver a então Escola Normal D. Pedro II e parte de uma das laterais do Palácio. Aparentemente estava tudo OK. Afinal, era um 1º de abril de 1964 e alguém deveria estar passando trotes.

Só que não!       

17 de março de 2024

Até quando, Bolsonaro?


- Até quando, Bolsonaro, abusarás da paciência nossa? Por quanto tempo a tua loucura há de zombar de nós? A que extremos se há de precipitar a tua desenfreada audácia?

Assim mesmo, trazendo para o português a pergunta/denúncia em latim feita por Cícero a Catilina é permitido adequar aos dias de hoje os acontecimentos da Roma antiga. O denunciante havia descoberto que seu inimigo estava querendo dar um golpe através de um complô que previa vários assassinatos de autoridades romanas - cônsules - e um incêndio na cidade. Viram como o caso é próximo de nós? Então ele gritou: "Quosque tandem abutere, Catilina, pacientia nostra?" Corria o ano de 65 a.C. Cicero escreveu então suas célebres "Catilinárias" em resposta àquele que era acusado de trair a confiança do povo. Desde então o termo Catilina, antes apenas o nome do senador, ficou com o significado de temerário, amoral e outros, pela incapacidade para o cargo governativo a que se propunha Lucius Sergius Catilina e que morreria condenado três anos depois e numa rebelião promovida por ele. Esse é um episodio da vida humana que merece ser estudado com mais profundidade por todos os que se interessam em não reescrever a história. 

Mas estou me propondo agora a somente traçar paralelos. Bolsonaro, esse Catilina de triste figura, abusa da paciência de todos. Segundo juristas com os quais conversei, ele só não foi preso ainda porque é preciso que todo o procedimento jurídico seja respeitado, sobretudo com ele tendo amplo poder de defesa. Motivos para a prisão já há aos montes, mas tem que ser preservado o princípio do "devido processo legal" no qual se ancoram as leis. 

Só que nesse meio tempo o ex-presidente continua a conspirar. A atentar contra o Estado Democrático e de Direito. Não perde uma oportunidade sequer de falar em público, de viajar, arrotar valentia e, como fez ontem no Rio de Janeiro, dizer em público que não teme ser julgado, contanto o seja "por juiz isento". E o poder de julgar essa isenção é apenas dele e do gado que muje à sua passagem. Só que isso já ultrapassa a nossa paciência, a capacidade de suportar esse golpista e ditador de aldeia, esse projeto fracassado de chefe de Estado que decidiu não respeitar a Constituição do Brasil. 

Chega! Até quando? O ex-presidente brasileiro tem que ser contido, preso. Tem que passar muitos anos na prisão pagando pelo crime de ter tentado de todas as formas destruir a democracia brasileira tão arduamente construída entre 1964 e 1981 (foto). E é preciso lembrar: ela foi um projeto nosso, dos que hoje estão no poder tentando evitar a volta dele e dos fascistas que mantiveram a ditadura militar brasileira por 21 anos.                

9 de março de 2024

Os comícios de Lula


 A queda na popularidade do presidente Lula, medida essa semana por institutos de pesquisa sérios, deve ser motivo de apreensão. Mas, sobretudo, pode servir como parâmetro para que um novo norte de atuação do governo seja implementado e desenvolvido daqui para a frente. Parece claro, cristalino, que a comunicação dos últimos 15 meses está falhando e a oposição vai se aproveitar disso a cada dia mais e com maior força.

Os comícios de Lula, aqueles feitos no início da carreira política dele no ABC (foto) e que levaram à fundação do PT, ainda não desembarcaram da agenda do presidente. Ele saiu do sindicalismo, mas o sindicalismo não saiu dele e esse é um erro crasso. Nos dois primeiros mandatos do atual presidente como governante maior, o PT era visto como um símbolo da oposição à ditadura e ao presidente quase tudo era permitido. Uma espécie de "efeito teflon" manteve-o sempre com avaliação elevada. Mas hoje as coisas são muito diferentes. O PT não é mais símbolo de autoridade moral para milhares como era e o antipetismo surgiu como força no Brasil juntamente com o conservadorismo, o reacionarismo e o extremismo de direita puro e simples. Esse último é o perigo mais claro, mais pujante!

Quando assumiu o governo, Lula disse que não queria bajuladores, mas sim críticos de sua atuação. E como esse que aqui escreve torce pelo sucesso do governo para que a extrema direita não possa voltar, aqui vai uma contribuição sincera: Lula, saia do comício sindical! Desça desse palanque!  Ouça antes de falar, escreva antes de ter um discurso pronto e não fale de improviso. Noventa por cento de tudo o que você fala, Lula, é correto. Mas existe o modo exato de colocar as palavras, sobretudo em política internacional, sobretudo em reuniões de Estado, onde tudo, até mesmo uma tosse, vai repercutir.

A economia do Brasil está bem. Os projetos do governo que focam educação, saúde, inclusão social, apoio ao homem do campo e às atividades econômicas nas cidades é acertada. Há uma clara preocupação oficial para com o desenvolvimento nacional com justiça social e isso sempre faltou a nós. A oposição cria todos os obstáculos possíveis e imagináveis, mas isso já era esperado. Os chamados "evangélicos" formam um grande contingente de oposição, mas temos a exata noção de que esse bloco está nas "confissões" chamadas de neopentecostais e não nas religiões tradicionais. É a picaretagem travestida de religião quem impera nesse segmento e que quer ver o governo fracassar.

Se tudo isso é tão claro, voltar a subir nas pesquisas pode ser um trabalho de resultados positivos possíveis e talvez até rápidos. Basta corrigir o rumo. O brasileiro tem que conhecer mais as ações do Governo Lula. Falta comunicação, repito! O presidente precisa sempre agir e falar como estadista, tomando cuidado com os improvisos. Não pode aceitar provocações nem fazer bravatas em palanques. Esse tempo e o "efeito teflon" passaram. 

O tempo de mandato ainda é longo, mas o de correção de rumos urge. A extrema direita lambe os beiços de vontade de voltar. Ela se esconde nas trevas, nas redes de fake news, nas ações subterrâneas. Claro que isso pode e deve ser combatido sobretudo com processos judiciais e eles deveriam ser mais considerados hoje. Se ações como essa se somarem a um governo no rumo certo, Jair Bolsonaro e sua gang verão o mandato de Lula ser renovado ou quem vier a ser indicado por ele, eleito em 2026 para mais quatro ano no Planalto.

Mais do que isso: verão da cadeia.             

1 de março de 2024

Os novos nazistas atacam


Enquanto as forças armadas de Israel atacam os palestinos na Faixa de Gaza e promovem o maior massacre de que se tem notícia em tempos recentes, uma quantidade grande de pessoas teme denunciar governo de Israel para não sofrer acusações de antissemitismo. Bobagem. Esse termo é uma palavra moderna que serve para designar o ódio aos judeus e à sua cultura milenar. Isso não está em questão. O que se denuncia hoje é o crime de limpeza étnica cometido pelo governo israelense de extrema direita comandado por Benjamin Netanyahu e mais todos os novos nazistas que ele conseguiu reunir em seu "gabinete de guerra".

Esse governo ressuscita o antigo pensamento judaico que autoriza a morte de gentios, ou seja, não judeus e com base em princípios contidos na Torá, o livro sagrado do judaísmo e que contrapõe o Antigo com o Novo Testamento. Essa é raiz de todos os ódios nascidos, ainda segundo os textos religiosos, com a morte de Jesus, considerado um falso profeta e desprezado pelos judeus que não o têm como filho de Deus. Não pretendo entrar mais fundo nesse tema.

Se o leitor olhar bem a foto que ilustra meu texto vai ver a figura de um soldado israelense deitado no berço de uma criança palestina e, debochando dela, abraçado a um seu bichinho de pelúcia. O bebê havia sido morto, assim como milhares de outros desde que Israel invadiu a Faixa de Gaza como resposta ao ataque do Hamas em início de outubro último. Não apenas recém nascidos são mortos, mas também mulheres, idosos e demais civis palestinos que nada têm a ver com as atividades bélicas do Hamas.

E por que os soldados israelenses fazem isso? Porque desde jovens, sobretudo quando ingressam no serviço militar obrigatório de seu país, eles aprendem que os palestinos são pessoas frias, cruéis, a serviço do mal, da destruição da Grande Israel. Portanto, são gentios que não merecem viver. E esse pensamento é também compartilhado por boa parte da população civil de Israel, sobretudo e principalmente a parcela que adota como sua ideologia oficial o extremismo de direita, discricionário e fomentador de ódios.

Foi a extrema direta alemã ocupada pelo nazismo quem gerou o episódio hoje chamado de holocausto e que matou seis milhões de pessoas. Para o nazismo os principais seres inferiores eram os judeus, mas não apenas estes. Também o eram comunistas, deficientes físicos, deficientes mentais, negros, ciganos, homossexuais e todos aqueles que não comungavam totalmente com os valores arianos. Transportado para os dias atuais, esse pensamento é rigorosamente idêntico ao do extremismo político de Israel que mata palestinos. A intenção é a de elimina-los da face da terra ou pelo menos da região onde só deve ficar a Grande Israel! Afinal, como os governantes atuais do Estado Judeu dizem, palestino não é povo e apenas se constitui em um grande bando de animais.

Por isso os novos nazistas atacam. Eles não são diferentes em nada dos velhos nazistas!          

27 de fevereiro de 2024

O Estado Laico é o alvo


O domingo dia 25 de fevereiro representou os estertores dos esforços do genocida inelegível para não se tornar também presidiário. Não vai funcionar, tomara. Mas o perigo não estava nas palavras explícitas que foram ditas ao longo daquela tarde pela maioria sobre um trio elétrico, mas no que escondia o evento pago pelo "pastor" Silas Malafaia com dinheiro de seus fieis, sobretudo nas palavras da ex-primeira dama Michele Bolsonaro (foto) e através das quais ela defende claramente a invasão do controle político pelas tais "igrejas neopentecostais" do Brasil. O que eles querem é atacar as bases do Estado Laico onde se ancora nosso país desde sempre.

Foi triste ver um batalhão de pessoas perdidas na mais importante avenida de São Paulo. Não foi engraçado ouvir algumas delas enaltecendo o "cristianismo" de Israel. Ou então outras tentando cantar sem saber a música "Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores", de Geraldo Vandré, um hino do combate à ditadura militar de 1964. Vimos velhas carcomidas pela idade e ignorância tentando sambar uma espécie de samba do crioulo doido fascista nas calçadas ou no asfalto daquele ponto famoso da maior cidade do Brasil e que hoje é administrada pela pobre figura caquética do prefeito Ricardo Nunes.

Assustava o pauperismo intelectual da maioria daquela gente!

E digo isso para citar inclusive aquelas que estavam aboletadas sobre o trio elétrico principal e o outro. São um retrato fiel e desesperador do que é o bolsonarismo, a extrema direita no Brasil. Ontem mesmo, enquanto eu esperava a abertura da agência do Banestes de Jardim da Penha, aqui em Vitória, uma senhora idosa resolveu gritar a plenos pulmões e sem ser provocada nem nada, um "Quando vai sair o impeachment do Lula?" Afora um senhor também carcomido pelos anos que defendeu o fuzilamento de todos do atual governo, ninguém mais se manifestou. Eles foram embora.

Conforta o fato de que a imensa maioria dessa gente envelheceu. Há jovens, sim, mas são a minoria. Mas assusta sabermos que parte deles, sobretudo a mulher do ex-presidente, representam o projeto das correntes neopentecostais de atacar as bases do Estado Laico, em um plano de mudar a Constituição. Esse é o caso de Malafaia e dos demais chefes das principais correntes existentes, principalmente a Igreja Universal do Reino de Deus. Por isso insistem sempre em anunciar o Brasil como "país cristão". Por isso cresce a bancada evangélica aliada à da bala e à do boi, todas interessadas em criar para nós um novo caminho distante daquele que nos trouxe até aqui.

Esses "evangélicos" estão espalhados por todos os partidos de direita ou extrema direita. E isso é um projeto! Para eles o partido é apenas uma sigla sem sentido que pode ser descartada em qualquer momento. Por isso é importante que eles se espalhem nas câmaras e no Senado. O projeto visa principalmente as eleições para a renovação senatorial, quando serão eleitos dois senadores de cada Estado. Se fizerem maioria estarão com a faca e o queijo nas mãos e poderemos ver morrer o Brasil que construímos um dia.

Repito, esse é o projeto. E o Estado Laico em que vivemos é o que nos trouxe paz até hoje e uma vida distante de movimentos separatistas e de perseguição política e religiosa institucionais. Resta lutar e denunciar. Caminhando e cantando e vivendo a canção. Ainda creio que somos todos iguais, braços dados ou não! 

22 de fevereiro de 2024

Diplomata de botequim


A diplomacia é um terreno sutil e difícil de ser trilhado com perfeição. Por isso exige tanto preparo. No Brasil, ingressar no Instituto Rio Branco e se tornar diplomata é sonho de muita gente e realização de poucas. Quem consegue se dedica de corpo e alma a essa atividade necessária ao bom relacionamento entre nações. Por isso jamais concordei com um costume que vez ou outra o Brasil trilha e que é o de dar cargos de diplomacia como presente a políticos, sobretudo ao final de mandatos. Isso pode prostituir a atividade porque vai colocar leigos oportunistas como chefes de missões.

Não é raro governantes meterem os pés pelas mãos e cometerem impropriedades nos momentos mais delicados do relacionamento entre nações. Como aconteceu exatamente agora, quando o presidente dos Estados Unidos usou um "son of a bitch" para se referir ao presidente russo Vladimir Putin. Talvez ele realmente possa ser assim considerado por seus detratores, mas um chefe de estado de nação que mantém relações diplomáticas com os russos deveria se abster de falar. Mas, enfim, falou.

Muitos estão criticando Lula por ter, numa entrevista, dito que "Hitler matou judeus" na Segunda Guerra Mundial no episódio do holocausto. E é verdade. Não era uma declaração oficial, nem ele estava falando para nações em uma assembleia geral, mas foi tocado um ponto delicado da história recente da humanidade. Lula não é diplomata e o Itamarati tem meios e modos de corrigir esse tipo de gafe por intermédio de seus profissionais.

O assustador é todos vermos o chanceler de Israel, homem que deveria estar em sintonia com os hábitos e linguajares de sua atividade, descer a nível rasteiro em rede social para atacar o presidente brasileiro como numa discussão de botequim. E ainda mais levando para o centro do debate uma brasileira que havia sido sequestrada e resgatada do Hamas (foto). Mais do que isso, esse chanceler Israel Katz mentiu o tempo todo, distorcendo a fala do brasileiro e tentando capitalizar o episódio para deslocar o foco da crise que seu país enfrenta num momento em que  autoridade do primeiro ministro é questionada internamente. Ainda humilhou o diplomata brasileiro falando em uma língua não dominada por ele e portando um microfone de lapela para gravar a fala do "oponente".  

Israel já tem um chefe militar em cargo de ministro que se refere aos palestinos como "animais", uma ministra de pasta ligada a colonização de terras estrangeiras roubadas ilegalmente capaz de dizer que o palestino não é um povo, e agora uma outra que fala: "Estou orgulhosa das ruínas de Gaza. os bebês palestinos lembrarão de nós". Todos são do Likud, o partido da extrema direita israelense. Todos são tão nazistas como foram os da Alemanha entre 1933 e 1945 quando houve a derrocada do nazifascismo.

Qual é a diferença entre o episódio da Segunda Guerra Mundial e o massacre dos palestinos agora? Talvez somente uma questão de escala. A extrema direita precisa de inimigos para sobreviver. Não sabe fazer nada sem eles. Hitler uniu grande parcela do povo alemão no ódio aos judeus. Bons alunos. os nazifascistas de Israel usam a receita para exterminar os palestinos, seus inimigos. Todos, sem exceção alguma. só sabem odiar e destruir.  

19 de fevereiro de 2024

Sionismo é morte


Erra por ignorância ou absoluta má fé quem confunde um ataque ao Estado de Israel com uma dura crítica aos desvarios de extrema direita do sionismo israelense encastelado no governo que é hoje liderado pelo extremista genocida Benjamin Netanyahu. Talvez o único erro do presidente Lula tenha sido não deixar isso bastante claro na crítica que fez ao se despedir da África domingo. Todos os que agora investem contra o Brasil em decorrência das declarações dadas pelo governante passam por cima dessa evidência.

Desde o massacre de Sabra e Chatila entre 19 e 20 de setembro de 1982, quando de 800 a 2000 pessoas, a maioria palestinos, foram assassinadas por milicianos maronitas que agiam apoiados pelas forças armadas de Israel, sabe-se que o plano da extrema direita israelense, mais precisamente do sionismo daquele país, é a completa aniquilação da população palestina. Ontem isso foi feito no Líbano. Hoje, na Faixa de Gaza. A extrema direita de Israel quer que o povo palestino seja exterminado para que não haja a menor possibilidade de haver uma "solução de dois estados", como se pede para aquela região.

Aliás, só para constar, a "solução final para o caso judeu", de Hitler, não era diferente.

Se nós formos agora imaginar que crimes de facções políticas extremistas podem e devem ser confundidas com as imagens dos países aos quais elas estão ligadas, seria o caso de acusarmos os alemães e a Alemanha de serem responsáveis pelos crimes perpetrados pelos nazistas no período compreendido entre 1939 e 1945. Ou então, pelo projeto da medíocre extrema direita do Brasil, que a partir de 2018, pretendia criar em nosso país um nazifascismo tupiniquim, que ele envolve todos os brasileiros e que o povo é cúmplice dos projetos megalomaníacos de um capitão expulso do Exército de nosso pais.

Não e assim. As forças armadas de Israel cometem crime de genocídio em Gaza desde outubro passado para se vingarem do ataque do Hamas feito pouco antes. E se alguém ainda acredita no discurso de Netanyahu que justifica as ações de seu governo como tendo apoio no direito internacional, deve dizer em que leis o sionismo se baseia para invadir ilegalmente a Cisjordânia e montar lá inúmeras colônias de judeus violentos que aos poucos estão massacrando as populações locais. Famílias que deixam suas casas pela manhã para trabalhar, à tarde não têm para onde voltar porque seus bens foram todos tomados.

Sim, Israel, por seus governantes atuais, comete crime de genocídio e quer eliminar os palestinos de sobre a face da terra. Não há como questionar isso. Desgraçadamente. E também desgraçadamente, sionismo é morte.              

17 de fevereiro de 2024

Dia 25, o ato final


Parece mentira, mas o genocida inelegível encontrou forças para convocar um ato para o domingo dia 25 deste mês na Avenida Paulista, icônico endereço de São Paulo (ilustração). Quantas vezes fiz esse trajeto, na maioria dos casos saindo da Rua Maestro Cardin onde moravam meus pais para a Consolação, onde iria ver algum filme no lindo Cine Belas Artes. Até hoje me recordo com saudade daqueles quase quatro quilômetros em linha reta que são historia pura. Pois mais uma vez a Paulista vai ser palco de um ato espúrio.

Esse ex-presidente pretende fazer do dia 25 os estertores de sua aventura nazifascista, na derradeira oportunidade em São Paulo onde conta com o beneplácito de um prefeito medíocre e simpatizante. Que seja preso nesse dia, logo em seguida ou antes de embarcar para lá. Dizer que vai receber seus correligionários em defesa da democracia é um escárnio. Um atentado à inteligência das pessoas mais informadas. O indivíduo que infelicitou o Brasil por quatro anos passou esse tempo todo planejando um golpe de Estado. Fez o que era possível fazer e só não teve sucesso em seu projeto porque, acredito, ficou sem o apoio da maioria dos comandantes militares com poder de decisão.

Fomos nós, a centro esquerda e a esquerda do espectro político brasileiro os responsáveis pelo fato de estarmos hoje numa democracia renascida das cinzas com a Constituição Cidadã de 1988. Se isso tivesse dependido da vontade da extrema direita brasileira estaríamos ainda agora entregues à ditadura militar que prendia ilegalmente, torturava e matava brasileiros todos os dias. Então como pode esse canalha fazer uma convocação popular em nome da defesa de uma democracia que ele tanto despreza?      

Há registros de centenas de falas do sujeitinho e nas quais ele tece loas aos chefes da ditadura militar brasileira, a elogia e diz apoiar tortura, fechamento do Congresso, do Supremo Tribunal Federal, além de adotar como de seu governo o slogan "Deus, Pátria, Família", que era de Benito Mussolini e ao qual acrescentou um "liberdade" para disfarçar. E mal, porque quem gosta de ditadores, de tortura e do fechamento do Legislativo e do Judiciário sabe que, para ele, a liberdade só serve a seus capangas.

É impossível enumerar aqui os crimes praticados pelo genocida inelegível, tantos são eles e tão pequeno é o espaço ao qual me imponho nesses artigos. E quem estará a seu lado dia 25 patrocinando o ato espúrio da Avenida Paulista? Silas Malafaia, prova viva de que as chamadas "igrejas neopentecostais'" são o melhor lugar para se lavar dinheiro no Brasil de hoje. Juristas de renome dizem que só faltam detalhes para que esse pústula, representante do nazifascismo brasileiro seja preso e condenado a longa pena. Tomara esse tempo se esgote quando chegar o último domingo de fevereiro.       

8 de fevereiro de 2024

Até quando?


"Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra"

As catilinárias, cuja expressão principal roubo acima, são uma série de quatro discursos do cônsul romano Marco Túlio Cícero (ilustração), feitos em 63 a.C. Ele denunciava a conspiração que fazia o senador Lucio Sérvio Catilina para tentar tomar o poder romano. E prosseguia num texto que agora para mim trago do latim para o português: "Não vês que tua conspiração foi dominada pelos que a conhecem?"

Nos dias de hoje essa expressão na qual Cícero pergunta até quando Catilina, um político falido mas que não queria deixar o poder vai abusar na paciência alheia, foi em diversas ocasiões transferida para o nome do genocida inelegível que desfila em carros de trio elétrico pela orla da Baixada Santista discursando pobre e livremente aos seus correligionários. Ele quer retornar ao poder de qualquer forma e faz isso ao abrigo de uma central de construção de narrativas falsas e que pretende levar uma parcela da população brasileira a acreditar que estamos diante de uma quase revolta popular.

Fazem uma espécie de samba de uma nota só, mas bem pobre em conteúdo. Vira e volta passo os olhos por endereço de redes sociais nas quais essa gente pontifica. E eles distribuem textos idênticos. Essa espécie de central, que já foi chamada de gabinete do ódio produz o 'conteúdo' que o gado divulga. Tudo igual, sem sentido. Bem diferente do que faço e do que fazem milhares de outras pessoas quando estas escrevem sobre política brasileira denunciando o golpismo explícito do exército de criminosos das redes sociais.

Agora mesmo eles, o gado destronado, distribuem uma 'denúncia': milhões de brasileiros inconformados com os desmandos do Judiciário, Legislativo e grande parte do Executivo se preparam para invadir a Avenida Paulista e outras grandes artérias brasileiras para derrubar essa ala podre da vida nacional e instalar um governo que os represente. Seria engraçado se não fosse ridículo. Mas o discurso se sustenta em parte ancorado na nada desprezível parcela golpista das Forças Armadas que sonha com novo golpe de Estado apoiada pela extrema direita despida de ideias e armada de ódios.

É triste. E mais triste ainda é ver como o genocida inelegível se movimenta livremente pelo Brasil e fora dele pregando atos inconstitucionais sem ser detido. Falando todas as asneiras possíveis sem que o braço da lei o impeça. E assim "ri-se a orquestra irônica, estridente,..E da ronda fantástica a serpente faz doudas espirais..." (obrigado, Castro Alves).

E eu, da minha incompreensão para com essa imobilidade que alimenta o golpismo desenfreado dos loucos pelo poder, apenas pergunto: "Até quando?" 

     

2 de fevereiro de 2024

"Meninos, eu vi!"


"Meu canto de morte,

guerreiros, ouvi:

Sou filho das selvas,

nas selvas cresci;

guerreiros, descendo da tribo tupi."

Foi ouvindo na TV a notícia do encontro de remédios destinados aos povos Yanomami jogados numa fossa em Roraima que me veio à mente o monumental poema "i-Juca Pirama", de Gonçalves Dias. Ele cantou a saga dos guerreiros timbiras e usou como título a expressão tupi que significa dizer "aquele que deve morrer". Foi uma professora minha da época de início de ginásio em São Paulo quem nos botou a todos os alunos em contato com essa poesia épica. Tenho certeza de que o grande poeta jamais imaginou que num dia desgraçado medicamentos seriam jogados numa fossa para que indígenas morressem em suas terras, definhando como se em campos de concentração nazifascistas.

Como surgiu isso no Brasil?

No meu romance "O faxineiro" descrevo uma passeata ocorrida em São Paulo às vésperas da edição do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, quando a Avenida São João estava tomada por estudantes, soldados da Polícia Militar e os brucutus, carros blindados que jogavam água e areia sob alta pressão contra os manifestantes que combatiam a ditadura militar capaz de nos infelicitar por 21 anos. A gente usava bolas de gude para derrubar cavalos...

Ali estava o ovo da serpente!

Foram os 21 anos de negação dos princípios do Estado Democrático e de Direito o que gerou o Brasil de hoje. Muito mais do que um ex-presidente inelegível e genocida, muito além daquelas "marcha da família com deus pela liberdade", o despertar de nosso extremismo de direita, do reacionarismo de grande parcela da população brasileira veio ao mundo nos anos que nasceram pouco antes do AI-5 e sobretudo depois dele. De 1964 - foi em primeiro de abril, OK? - até 1985 todos os pudores se foram e essa parcela do Brasil passou a ter orgulho de dizer "sou de direita", na maioria dos casos sem saber o que é isso, sem separar conservadorismo do reacionarismo crescente e desfilar pelas ruas impune e desavergonhadamente pedindo intervenção militar em nossas vidas.

E, pasmem, as rezas para extra terrestres, pneus e o ajoelhar patético diante dos quarteis militares não foram o ápice dessa onda de enlouquecimento sem sentido. Nem mesmo a tentativa de explodir um artefato terrorista próximo do aeroporto de Brasília para gerar uma ditadura fabricada e encomendada pelo genocida e seus asseclas. Por mais desgraçado que possa parecer, é o encontro dos medicamentos enviados aos indígenas descartados numa fossa o que representa esses tempos, esse desvario. É a tentativa de massacrar nossos povos originários o ápice do plano de destruição do Brasil brasileiro, esse que construímos em 524 anos.

Se amanhã ou depois alguém duvidar disso, de que os brasileiros levaram milhares de indígenas à morte pela fome e por doenças como a malária, nós se estivermos vivos poderemos dizer, ainda que com lágrimas nos olhos um: "Meninos, eu vi!"

Eu pelo menos vi!