20 de agosto de 2019

O eliminador de rastros

Desde cedo o presidente Jair Bolsonaro ficou preocupado. Muitos rastros ligavam seu filho mais velho, Flávio, a milicianos do Rio de Janeiro. Havia evidência de contratações destas pessoas e parentes delas nos gabinetes do primogênito e dos outros, o 02 e o 03. Isso era muito mais sério do que contratar mais de duas centenas de parentes para todos os gabinetes ou então tentar emplacar 03 como embaixador nos Estados Unidos. Depois disso ele começou a tirar de sua frente aquelas pessoas com os maus hábitos de seguir rastros. Sobretudo de maus hábitos.
A Polícia Federal começou a sentir o peso da raiva do senhor que diz para quem quiser ouvir: "Quem manda sou eu!". Ele disse que cabeças iriam rolar e rolaram. O negócio é eliminar rastros!
Mas o COAF estava se recusando a ser dócil. Azar dele porque o presidente é mais forte e acabou com ele. Dane-se o fato seu maior mandatário, Roberto Leonel, ter sido indicado pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro. Afinal, essa não seria a primeira vez que uma escolha ministerial seria desconsiderada. E também havia o fato de que Leonel - como ele foi capaz? - teve cometido o desplante e o descaramento de criticar o presidente do Supremo Tribunal Federal, que tinha determinado ao COAF para não mais ceder elementos e provas de investigações. A pedido de Flávio...
E essa tal de Receita Federal, como teve a coragem de continuar investigando fatos, analisando dados, revirando documentos, à revelia da vontade presidencial? O Porto de Itaguaí é intocável, mesmo que um delegado da PF veja lá suspeitas de contrabando de armas. Quem disse que não pode haver indicação política para a substituição de um auditor? Pode sim. E se os auditores fiscais ficarem zangados e resolverem cruzar os braços? A gente vê o que acontece.
Hoje mesmo o braço direito do presidente no Rio de Janeiro, Wilson Witzel, maldosamente chamado de AuchWitzel por essa camarilha comunista, comemorou como quem comemora um gol da Seleção Brasileira a morte de um sequestrador na Ponte Rio Niterói. Afinal, ele pode. Desde janeiro último a Polícia do Rio de Janeiro já matou quase 900 pessoas em confrontos naquele Estado. Muita eficiência. Mas ninguém foi morto em regiões dominadas pelas milícias...
Vamos entender uma coisa de uma vez por todas: ninguém pode atacar os projetos e interesses desse clã. Jamais. Afinal, o jovem Renan - que aparece na foto ao lado direito do papai - está sendo preparado para entrar em campo e jogar o jogo na posição que for escolhida para ele.
E por último, quem manda é o Messias. Mas até quando?

13 de agosto de 2019

E ele respeita alguém?

Bolsonaro não tem por hábito respeitar os outros. Mas exige que o respeitem
Uma pessoa das minhas relações e bem de direita mesmo, reagiu chamando de "desrespeitosa" a manchete de um jornal da Áustria que mostra foto do presidente Jair Bolsonaro tirada domingo último num evento evangélico de Brasília vestindo camiseta de propaganda de correntes religiosas. O título diz: "O Brasil elegeu um idiota". Também o ministro do meio ambiente Ricardo Salles, num programa da Globo News de nome Painel, acusou o e-diretor do INPE, Ricardo Galvão, de também ter sido desrespeitoso com o presidente. Bolsonaro não gostou de números de desmatamento divulgados e disse que o INPE "deve estar comprometido com alguma ONG". Como organizações não governamentais são para o presidente instituições desonestas, foi disso o que ele chamou Galvão, sem qualquer prova, antes de o cientista especialista em clima responder de maneira dura.
Pergunto: Bolsonaro respeita alguém?
Nos últimos tempos as declarações do presidente têm horrorizado todas as pessoas mais esclarecidas. E isso por uma razão muito simples: a presidência da República tem uma liturgia que os ocupantes do cargo não podem desconhecer. É preciso que os presidentes respeitem a dignidade da chefia de Estado, sem o que eles se diminuem e tornam o conceito do País água de sarjeta.
Já ouvimos de Bolsonaro que para defender o clima o cidadão deve "fazer cocô" dia sim, dia não. Em viagens ao exterior ele teve a coragem estúpida de elogiar ditadores sanguinários de Argentina, Chile e Paraguai na terra destes, para horror de cidadãos locais. Agora mesmo disse no Rio Grande do Sul que se a "esquerdalha" vencer na Argentina haverá um êxodo. Cito apenas alguns episódios constrangedores porque o texto não deve ser longo. Vou deixar o "embaixador" para outra hora.
Tudo o que um presidente diz tem repercussão ampla e imediata. Seja ele de que país for. Além disso, um chefe de Estado é cobrado todos os dias, todas as horas e mesmo que considere as perguntas pouco importantes ou pouco inteligentes, tem a obrigação de tratar os jornalistas com respeito. Afinal de contas eles representam a interface do poder com o povo.
Bolsonaro foi durante 28 anos um dos deputados federais mais apagados do Congresso. Não é absurdo dizer que ele nada fez de útil. Além disso empregou mais de 200 parentes em gabinetes. Seus filhos políticos também fizeram isso e nas listas de contratações com dinheiro público figuram até mesmo milicianos que atualmente infernizam a vida dos moradores do Rio de Janeiro.
Ninguém é desrespeitoso com o presidente. Pessoa alguma é obrigada a respeitar quem não merece respeito por seus atos grosseiros, por suas atitudes sem propósito. E esse é o caso.         

6 de agosto de 2019

Democracia de bancadas

Congresso cheio para a defesa de interesse de bancada. Qual? Não importa
Um dos aspectos mais característicos e determinantes das democracias ditas representativas são os partidos políticos. Em grande parte dos países essas organizações carregam consigo suas ideologias e são apegadas a elas. Fazem política a partir de seus pressupostos básicos. Em outros são visões diferentes de uma única ideologia. Nesse caso o maior exemplo fica nos Estados Unidos onde os partidos Republicado e Democrata representam aspectos diferentes do capitalismo. O Brasil talvez seja uma das raras democracias do mundo onde partidos políticos são espécimes em extinção.
Nossos aleijões começam pela inexpressividade das organizações partidárias. Quase totalmente despidas de ideologias ou de projetos políticos claros, acabam sucumbindo a uma figura estranha na vida dos outros países: as bancadas. Aqui temos principalmente a evangélica, a ruralista e a da bala. Distribuídos por diversas organizações partidárias ao sabor de conveniências regionais ou corporativas, seus membros se unem para a defesa dos interesses primeiros: imposição de dogmas religiosos, projetos de grandes latifundiários ou de fabricantes e defensores de armas. E os partidos? Muitos de seus membros sequer sabem qualquer coisa acerca deles. Ou para que servem.
A situação chegou a tal ponto que o nome "Partido" está desaparecendo em muitos casos. Hoje temos organizações com nomes como Democratas, Verde, Avante, Democracia Cristã, Solidariedade, PROS, Patriota, Rede e até mesmo Cidadania, apelido agora adotado pelo PPS, nascido PCB.
É uma situação esdrúxula, no todo ou em parte...
Recentemente surgiu aqui em Vitória, no Espírito Santo, a informação de que policiais militares estariam se unindo para concorrer às próximas eleições municipais. Como conheço um coronel aposentado, perguntei a ele como isso vai ser feito e a que partido os militares se filiariam. Eles querem lutar sobretudo por salários melhores - aqui são pagos alguns dos mais baixos do Brasil -, concorrendo para os cargos de prefeito e vereador, se possível em todos os municípios. Partido? Isso cada um vai escolher o seu. Em suma, vem mais uma bancada por aí!
Dos muitos de nossos problemas o maior hoje talvez seja esse: na política, salvo raras e honrosas exceções, entram aqueles que vão defender suas bandeiras pessoais e/ou corporativas. E os maiores, mais importantes e urgentes interesses para o País? Isso não está no horizonte dessas pessoas. Seria uma função exclusiva de organizações político partidárias robustas, conhecidas e respeitadas, caso elas ainda existissem no Brasil. Mas, pobres de nós, elas são espécimes em extinção como há outras nas florestas.       


















 

2 de agosto de 2019

A lei da selva nos jornais

Tenho um amigo contador, dono de empresa de contabilidade e "ex-assinante" de A Gazeta. Hoje eu me encontrei com ele e ouvi: "Álvaro, quando eu vi o balanço de AG do ano passado fiquei impressionado. A empresa estava com patrimônio líquido negativo. Quebrada. Publicou o balanço porque isso é exigência legal, mas creio que a família dona do negócio o estava sustentando".
Eu, que conheço aquela história há muito tempo, também tinha conhecimento  disso. E os jornalistas que trabalham na empresa em cargos de chefia, embora não avisados com antecedência do que iria acontecer, já sabiam que as coisas iam de mal a pior e poderiam mudar. No caso da Rede Gazeta isso era inevitável. O "desenlace" acabou chegando mais cedo do que se imaginava. Do que eu imaginava, pelo menos.
O Globo, Folha de S. Paulo, Estado de São Paulo, Zero Hora e outros jornais - ficaria difícil fazer uma listagem agora - são dirigidos por gerações de famílias de jornalistas. Eles conhecem seus negócios e sabem como tocar o barco. Outras grandes, médias e até algumas pequenas empresas são administradas não por jornalistas mas por administradores de empresas profissionais. Daqueles que recebem a incumbência com carta branca para agir e ganham, além do salário, mais um adicional pelo lucro líquido obtido. A empresa lucra. E se mantém, mesmo em mercado adverso.
No mundo capitalista as coisas funcionam dessa forma. Há um movimento de pêndulo na vida e no formato dos negócios e todos, sem exceção, tendem a passar por situações de bonança e de dificuldades. Mudanças são inevitáveis e só os competentes sobrevivem. Como na lei da selva, onde até mesmo a reprodução preserva os mais fortes e sacrifica os mais fracos.
O capitalismo é a reprodução da lei da selva no mundo dos negócios!
No jornalismo, o fechamento de um jornal diário tradicional é péssimo, sobretudo, quando somente um outro sobrevive na praça. Por mais que a gente queira dizer que o mundo agora é digital, olhar notícias pela tela de um computador, celular ou o que quer que seja é muito diferente de ter uma publicação em mãos. A nova geração talvez discorde, mas ela não tem ainda a força de ser formadora de opinião como as anteriores. Um jornal de internet está longe de ser, hoje, o que é a TV. Afinal, esta está formando opiniões só no Brasil há cerca de 70 anos. É um bom tempo.
Terminei minha conversa com meu amigo contador às gargalhadas. Ele me disse: "E agora, depois de 30 de setembro o que eu vou fazer com o cocô do Mike?". O cachorrinho da família, afinal, era o destinatário do jornal diário já lido. Recomendei a ele assinar o concorrente!
Mas insisto: existe em Vitória, Vila Velha, etc, espaço para um jornal diário de âmbito estadual no Espírito Santo. Isso é saudável até mesmo para manter a democratização da informação.