29 de agosto de 2018

Os inquisidores

Entrevista é, em síntese, uma ação na qual um entrevistador faz perguntas ao entrevistado com o objetivo de obter informações de relevância. Em princípio, cabe ao entrevistado o protagonismo, na medida em que ele tem o maior tempo para poder responder apresentando os fatos e explicando-os. Nos manuais da TV Globo esse tipo de explicação não deve ter lugar.
Jair Bolsonaro irrita Renata dizendo que ela ganha menos.
Ontem, na entrevista do candidato Jair Bolsonaro, no Jornal Nacional, William Bonner e Renata Vasconcelos, os entrevistadores, passaram quase a metade dos 29 minutos somados do tempo de TV falando, tentando dar explicações ou simplesmente interrompendo o entrevistado. Questionando-o, até mesmo em sua sinceridade. Mas sem apresentar fatos com substância. Isso já havia acontecido na segunda-feira, quando o candidato Ciro Gomes foi igualmente sabatinado no programa.
Entrevista não é inquisição!
Se uma emissora de TV, uma rádio, um jornal, revista, site de internet ou coisa que o valha, programa uma série de entrevistas a candidatos à presidência da República, notadamente numa época difícil como a nossa hoje, o que interessa realmente são os planos desses candidatos. O que eles pretendem fazer, caso eleitos, nos campos da economia, saúde, educação, segurança, geração de empregos, política externa, etc. Tudo isso é o que interessa ao cidadão. O Bolsa Família vai ser mantido? Como está ou modificado? O Prouni sofrerá cortes ou acréscimo de verbas? De que forma será feito um esforço para gerar empregos? E o déficit público vai ser contido de que maneira? Com o ataque aos privilégios inaceitáveis do serviço público? Quem ouviu as duas entrevistas - e ainda haverá mais duas, hoje e amanhã - não sabe de absolutamente nada disso.
Na entrevista de Ciro Gomes o foco foi Carlos Luppi, um político cheio de problemas. E Kátia Abreu, uma senadora "dilmete". Ontem, com Bolsonaro, focalizou-se o fato de ele teoricamente achar mulher um ser inferior, não gostar de gays, estar dando importância excessiva ao futuro Ministro da Fazenda, Paulo Guedes, adorar armas de fogo, etc e tal. Nada foi perguntado sobre o que interessa.
Ao contrário, o telespectador ficou sabendo que Renata Vasconcelos ganha menos que William Bonner, que o dinheiro público sustenta a Rede Globo, que supostamente Bonner foi traído, que a cartilha do governo pode ser mostrada em escolas mas não na TV, etc. Nada de interesse público.
Quem ganhou o "debate", já que entrevista não houve? Ganhou Ciro Gomes? Ganhou Jair Bolsonaro? Ganhará Geraldo Alckmin? Ou Marina Silva?
Não, meus amigos. Perdeu o jornalismo sério, aquele que é feito com o objetivo de obter informações e não o de desconstruir o entrevistado. Perdeu a ética jornalística. Perderam os inquisidores travestidos de entrevistadores do Jornal Nacional.
É uma lástima!