7 de agosto de 2024

A regra do jogo


Fui admirador do jornalista Cláudio Abramo 
(foto), que lamentavelmente morreu novo, do coração. Ele escreveu, dentre outras obras, o livro "A regra do jogo", que tenho comigo. Nele cita a história de uma vez em que um estudante perguntou-lhe qual era e é a ética do jornalista. Abramo respondeu dizendo ser filho de marceneiro. O pai sempre entregava o que prometia. Jacarandá? Então era essa madeira nobre mesmo. Outra? Então era aquela combinada. Nunca cometia qualquer tipo de deslize e era pautado na ética, na verdade. Essa ética do marceneiro e de outros é a mesma do jornalista, do médico, engenheiro, advogado, etc. De todos aqueles que honram a sua atividade. No caso do jornalista ele deve sempre ter em mente que lida com a verdade factual e não pode abdicar disso. Nunca!

Minha primeira razão para me afastar do governo federal que antecedeu o atual foi essa: o ex-presidente não tinha ética, honra, nada disso. Sobretudo, renunciava totalmente à verdade. E esse posicionamento, superior até mesmo ao meu compromisso político/ideológico, afastou-me de qualquer tentativa de aproximação com aquele genocida agora inelegível. Por isso, e para defender a regra do jogo, votei na oposição ao sujeitinho. E ele perdeu, felizmente.

Agora estamos diante de um fato grave que acontece na Venezuela e onde o atual presidente, o socialista (sic!) Nicolás Maduro, fraudou uma eleição e se recusa e deixar o poder para o eleito Edmundo González, o "poste" de María Corina Machado, a que vai mandar realmente. Quem é ela? Trata-se de uma das fundadoras do Fórum de Madrid, entidade de extrema direta que reúne pessoas como Javier Milei, Giorgia Meloni, Eduardo Bolsonaro, Bia Kics e outros. Filha do magnata Enrique Machado Zuloaga, morto ano passado, quer de volta o império siderúrgico familiar Sivensa e a privatização da PDVSA e de todo o restante das empresas públicas da Venezuela, bem como o fim das conquistas sociais dos governos anteriores. Quer à disposição de seus interesses os 303,8 bilhões de barris de petróleo das reservas do pais, cerca de 18 por cento de tudo o quanto existe no mundo. Só isso por enquanto...

Então por que defender a retirada do poder de  Nicolás Maduro para entregá-lo a tal pessoa?  Simples: a reeleição de Maduro foi um golpe, um jogo sujo, imundo. Uma fraude. E se hoje Corina Machado e seu poste têm a preferência dos venezuelanos, isso se deve à corrupção e aos desmandos do atual presidente. Essa candidata à qual se quer dar a presidência de fato da Venezuela é um bom negócio para seu país? Não, ela é muito ruim. Mas o "poste" ganhou as eleições da mesma forma como aconteceu com Lula, que sobreviveu a uma tentativa de golpe de estado concretizada no 08 de janeiro do ano passado.

Nem sempre é possível escolher o melhor. Mas sempre de deve respeitar a regra do jogo.

PS: creio com esse texto ter explicado a uma pessoa que respeito porque estou apoiando uma fascista.                    

4 de agosto de 2024

Campanha de saúde política


Quando estive no Chile pela última vez a presidente era  Michelle Bachelet. Nós, turistas, fizemos um city tour pela capital e subimos uma colina de onde se tinha bela paisagem de Santiago. O guia disse a certa altura que iria voltar antes de chegar ao topo porque ele não queria passar diante da residência do ex-ditador. Argumentei que Pinochet já não mandava nada, mas o rapaz simplesmente completou: "Não vamos passar por lá". E ponto final!

O que acontecia era simples: ainda havia no Chile milhares de viúvas da ditadura deles, todas saudosas dos tempos de prisões ilegais, torturas e assassinatos. Como aconteceu no Brasil... Tudo o que um guia de turismo não queria fazer era colocar em perigo as pessoas que estavam sendo levadas a passeios. Durante o tempo que se passou após isso, Bachelet governou para mostrar aos chilenos que democracia é muito melhor. Foi sucedida por um presidente de direita, mas que jogou com a regra do jogo. Depois veio Gabriel Boric, socialista moderno e capaz de entender que o antiamericanismo é hoje um cadáver insepulto na maioria dos países onde se elegeram presidentes de visão socialista. Como na Colômbia de Gustavo Petro, por exemplo.

Lula ainda não entendeu como se faz política internacional em 2024 e conversará muito com o chileno amanhã (vejam os dois juntos na foto). É teimoso como uma porta, mas talvez atenda a alguns conselhos sobre a insensatez de demorarmos a considerar a Venezuela como um feudo de Nicolás Maduro. Autocratas não são de direita nem de esquerda como muitos pensam; eles governam para si próprios e seu grupo político/familiar. Nesse ponto não há diferença entre Maduro e Bolsonaro além do fato de que na Venezuela as forças armadas foram todas compradas pelo Chefe de Estado enquanto aqui o ex-presidente não conseguiu ir além do Centrão. Ao menos nesse ponto estamos bem melhores...

Precisamos lançar uma campanha de interesse público: Maduro faz mal à saúde!

Se Boric conseguir ajudar ao menos um pouco talvez alguém consiga fazer Lula entender que se seu apoio cair muito mais por causa desse autocrata decrépito, não será apenas ele o derrotado. O projeto político do Brasil perderá junto porque abrirá caminho para a volta do inelegível genocida ou quem ele nomear seu sucessor. Há muitos extremistas de direita se candidatando a esse cargo e todo dia um discursa. Hoje foi o candidato a prefeito de São Paulo, aliado do governador carioca importado por lá. Em Minas um outro governador caipira e iletrado também sonha com a chance de se hospedar no Planalto. Oportunistas em busca de oportunidades não faltam.

Sonho para que o sol de Santiago, mesmo nesse inverno sul-americano, areje a cabeça do presidente brasileiro. Os tempos da "ditadura do proletariado" ainda presente na cabeça de muitos dirigentes do PT, já passaram. E pode haver um caminho de luz para todos nós, brasileiros, no horizonte de 2026. É só evitar o que faz mal â saúde política.

2 de agosto de 2024

O escárnio legal


Mais dois magistrados capixabas foram pegos pela Polícia Federal na "Operação Follow de Money" (ilustração) o que, literalmente, quer dizer "siga o dinheiro". Tudo bem, essa não é a primeira vez que isso acontece, deve haver mais muitos outros casos ainda não descobertos e, como em todas as vezes passadas, os magistrados criminosos bem como advogados e outros a eles ligados vão responder a processos. Mas há um escárnio legal nessa situação: o máximo que vai  acontecer aos dois juízes será uma aposentadoria com remuneração proporcional ao tempo de serviço. Isso é um prêmio, gente!

O Projeto de Lei Complementar 277/20 altera a Lei Orgânica da Magistratura (LOMN), torna magistrados ao alcance de todas as penas dos demais cidadãos e isso significa serem, ao final dos processos, além de condenados, exonerados a bem do serviço público sem direito a nada. Tanto corruptos quanto praticantes de faltas disciplinares graves. Então porque esse novo texto legal ainda não vigora, mesmo passado tanto tempo: por causa da inércia da ação do Poder Legislativo!

Ora, de onde vem essa inercia? Simples: desde o processo de redemocratização, em 1988, mais 500 parlamentares foram investigados, responderam ou respondem a ações penais no  Supremo Tribunal Federal (STF). Pasmem, mas destes somente 16 - eu estou dizendo dezesseis! - foram condenados no exercício do mandado por crimes de e outros delitos. Os demais são "perseguidos políticos". O Congresso em Foco, do Jornal O Globo, mostra que hoje tramitam no Supremo 358 processos contra 172 parlamentares: 141 deputados e 31 senadores, cerca de um terço do Congresso Nacional. E eles respondem a cerca de 60 tipos de crimes. Mais: apenas sete dos 28 partidos políticos nacionais têm ficha limpa. Não é uma beleza?

Eis, de forma muito resumida, porque o escárnio legal sobrevive e a ação legislativa é inerte!

Os magistrados que estão sendo punidos agora eram parte de um esquema de roubo de bens de pessoas mortas que deixavam dinheiro em contas bancárias, na maioria dos casos na forma de herança não reclamada. Não consigo imaginar patifaria maior do que essa! Isso é a meu ver inclusive maior do que a venda de sentenças, prática que vira e volta acaba sendo detectada e denunciada. E quando acontece um fato como esse, e como o de agora, os "punidos" vão viver de suas aposentadoras relativas num país onde esses casos são logo esquecidos pela opinião pública. E é um vidão, sem dúvida alguma, principalmente se eles conseguiram esconder no todo ou em parte o que roubaram ao logo da vida criminosa.

Dá vontade de vomitar!