21 de janeiro de 2011

As tragédias chegam primeiro


As tragédias brasileiras, ocorram onde ocorrerem, quando e por qual motivo acontecerem, têm todas um único e exclusivo DNA: são os filhos legítimos de uma outra tragédia, qual seja, o "casamento" entre um Poder Executivo clientelista, um Poder Judiciário corporativista e um Poder Legislativo omisso. Isso, para dizermos o mínimo.
A verdade e a exata dimensão dessa nossa tragédia brasileira, envolve muito mais coisas. Após cada eleição, o Executivo precisa negociar cargos para poder governar. O Legislativo aprova tudo, rigorosamente tudo o que é pedido pelo Judiciário, porque passarinho que come pedra sabe o ânus que tem. E na ciranda desse jogo de favores e medos, tudo o que representa manter ou aumentar privilégios de poderosos é decidido ou aprovado em questão de minutos. Tudo o mais é protelado ou alvo de demagogias. Quando uma decisão importante depende do Legislativo, ela só sai do papel se for do interesse dos outros dois poderes. E como ninguém quer perder poder, o suposto pragmatismo que cerca essas decisões, prefiro chamar de pusilanimidade.
Em consequência desse conjunto de fatores, deve passar de mil o número de mortos na região serrana do Rio de Janeiro. Serão mais de 25 mil os desalojados ou desabrigados. Haja dinheiro para a reconstrução de tudo o que foi destruído. E não apenas naquela região, mas também em São Paulo e Minas Gerais, também destruídos nesse verão 2010/2011.
Os detentores de poder concederam-se reajustes que passaram, em alguns casos, de 70 por cento. Já o salário mínimo, discute-se se pode ter R$ 30,00 ou R$ 35,00 de aumento. E discute-se já se vai muito tempo. Por esse mesmo tempo, e com toda a demagogia possível e imaginável, negocia-se medidas capazes de prevenir tragédias. Como não se chega a lugar nenhum, as tragédias chegam primeiro. E matam, democraticamente, como aconteceu ao menos agora no Rio, tanto os ricos quanto pobres. Talvez isso acorde algumas pessoas!
A estrutura de poder no Brasil tais fatos. Foi feita para isso. Tanto que havia uma estrutura de detecção de chuvas capaz de alertar para ocorrências fora do normal pronta para uso em Petrópolis, mas estava desligada porque a ninguém interessava ser o responsável por seu uso.
Agora, promete-se mundos e fundos. Da presidente a vereadores dos locais atingidos, medidas de proteção e reconstrução são anunciadas. Bastará a poeira baixar, a cobertura jornalística esmorecer, voltar ao normal, e quase tudo será esquecido.
Restarão os mortos. As famílias destruídas. E os traumas que muitos carregarão pelo resto da vida. A tendência, ao final, será a de vermos alguns paliativos e nada mais. Os pusilânimes continuarão como são. Os corporativistas, também. Os clientelistas, idem. Um novo Brasil poderá até chegar um dia. Mas se vier de baixo para cima. Nunca de cima para baixo.

12 de janeiro de 2011

This is Cinerama


Quero me permitir um pouco de saudade.
Avatar, um sucesso absoluto em cinema 3D, atraiu a atenção de todos para esse recurso cinematográfico realmente fantástico. E muita gente pensa que a filmagem em terceira dimensão foi uma criação de James Cameron ou da equipe de filmagem desse seu grande sucesso. Que o 3D veio para ficar não resta dúvida. E que em breve as TVs e cinemas apresentarão esse recurso diuturnamente, também. Mas isso não é novidade, mesmo aqui no Brasil. Muito pelo contrário.
Em agosto de 1959, em São Paulo, foi inaugurado na Avenida São João, 1.462 (Bom Retiro) o Cine Comodoro (primeira foto à esquerda), em um evento que teve até transmissão ao vivo de rádio e televisão. Era um absurdo de conforto e modernidade para a época, com filas imensas de espectadores que aceitavam aguardar quatro, às vezes seis horas para poder entrar. Isso numa época em que ainda era permitido estacionar na São João, coisa absolutamente impensável nos dias de hoje. Na primeira foto à direita temos o interior do cinema. Alguns dos maiores sucessos do Comodoro eram filmes em 3D. O maior deles - talvez por ter sido o primeiro -, This is Cinerama (segunda foto à direita), transportava os cinéfilos para montanhas russas, aviões de guerra ou outros artifícios. Havia uma infinidade de gritos na sala de projeções quando o carrinho da montanha russa despencava de grande altura. Parecia que todos estávamos lá, no parque de diversões, descendo as rampas em grande velocidade. Eu pelo menos estava, criança ainda, saco de pipoca nas mãos, ao lado dos meus pais, curtindo aqueles momentos caros de ócio dos finais de semana e que as crianças costumam valorizar depois que não existem mais.
E era mesmo um parque de diversões. Cinerama não explorava histórias, como Avatar. Suspense, aventura, romance, terror, nada. Na época, os efeitos especiais, ainda pré-históricos, eram chamados de "truques". E o Cinerama era um dos mais bonitos truques criados pelo cinema de então. Cada filme era formado por vários assuntos ligados uns aos outros por cortes de cena e sempre explorando a impressão que o espectador tinha, de estar dentro da tela. Ou então de a tela ter invadido a sala de exibições. E isso graças a equipamentos - projetores - imensos, pesadões e que ocupavam praticamente toda a grande sala de projeções.
Logo ele caiu em desuso. E isso porque não contava histórias, não havia tramas, nada. Eram apenas diversões rápidas, que com o tempo cansaram. O Cine Comodoro fechou depois de algumas décadas. Mesmo passando filmes tradicionais, grandes sucessos (como Evita, mostrado na foto). O mundo de Cinerama ficou apenas na memória das milhares de pessoas que foram até aquele cinema se divertir.
Restou, da época, pelo menos em minha lembrança, o Filé do Morais. O restaurante próximo dali e para onde meu pai levou-nos para comermos o mignon mais gostoso que existia, uma ou duas vezes. E esse filé ainda existe. Continua sendo o mais gostoso, não do Brasil, mas talvez do mundo!
Agora o 3D volta. Adulto, tecnologicamente avançado, capaz de nos contar dessa forma, com esses recursos invadindo as salas de projeções, todas as histórias que o cinema pode mostrar. Para quem pensava que ele - o cinema - havia morrido, ou iria morrer, eis a prova em contrário.
As salas mudaram de endereço e de formato. Em Vitória mesmo, como em São Paulo, a maioria dos cinemas ficavam quase todos no Centro. No caso capixaba, Santa Cacília, São Luís, Paz, Juparanã, Vitorinha, Jandaia, tantos outros. Hoje eles estão nos shopping centers, ocupando áreas nobres, com luxo,conforto e o que mais se busca nos dias atuais: segurança.
A arte renasce a cada dia, a cada criação. Ou através de recriações, mas em todos os lugares. Assim ela é feita. Ela é a essência do gênio humano e esse não se basta!

10 de janeiro de 2011

Meus filhos, meus tesouros diplomáticos


O novo do ministro do Turismo, Pedro Novais, pediu passaporte diplomático para a mulher dele, pois ela precisava descansar um pouco nos Estados Unidos. Estava muito cansada, coitadinha, e o ex-presidente Lula já disse em outras ocasiões que esse tipo de gente não é gente comum.
Então, para que fazer essa confusão toda porque dois filhos de Lula receberam passaporte diplomático às vésperas do encerramento do mandato dele? Devem estar muito cansados também. E viajar diplomaticamente é muito mais confortável.
Quem tem memória boa deve se lembrar de um filmete que os próprios filhos de Lula postaram na internet e depois retiraram. Eles aparecem num avião da presidência da República, parece que então era o Sucatão ou Sucatinha, e um diz: "Isso é que é vida!".
Com toda a razão.
Agora, com o papai fora da presidência, como continuar curtindo a vida sem passaporte diplomático? O Aerolula vai ser usado pela Dilma Roussef e os filhos do ex-presidente terão o desprazer de precisar frequentar essas primeiras classes sem conforto dos aviões de carreira!
O ministro Nelson Jobim tem razão, por exemplo, quando diz que Lula curte suas férias de graça numa instalação militar por medida de segurança. Com cerca de 90 por cento de aprovação popular! Fernando Henrique Cardoso, quando entrar de férias, vai ficar no porta-aviões São Paulo. Itamar Franco, num submarino. Por medida de segurança.
Os filhos de Lula merecem ou não merecem passaporte diplomático? Se o papai deles nunca se preocupou com as leis, qual seria o motivos de eles se preocuparem? Não é, ex-ministro Celso Amorim? O que falava tanto e agora está calado.
Bobagem, gente. Afinal, Pedro Novais já pagou motel com dinheiro público e continua ministro. Vai ver as mulheres não mereciam o dinheiro dele...

6 de janeiro de 2011

De Garibaldinho para Garibaldi


Quem viu televisão ontem, 05/01, ficou "emocionado". Nas solenidades de posse dos deputados federais e senadores que vão cumprir mandato tampão de menos de um mês durante o recesso parlamentar - no caso dos senadores, alguns que estão em meio de mandato entregam o cargo por até quatro anos - houve um que foi aos prantos.
Garibaldi Alves (olhem: ele é o do meio na foto), assumiu o posto de senador no lugar do filho do mesmo nome e foi às lágrimas durante o discurso de posse. Agradeceu ao filhote, agora ministro de Dilma Roussef, por ter permitido a ele realizar um sonho aos 87 anos de idade. Tornou-se autoridade. Vai ser chamado de "excelência". Terá toda uma entourage em seu entorno e várias verbas generosas para gastar além do também gordo salário. Tudo constitucional.
Ele merece. Afinal, quando era pequeno, Garibaldinho ganhou do pai quantos presentes? Estudou em boas escolas, teve seus desejos atendidos e, ao ingressar na política, toda a família o apoiou. E é próprio dos oligarcas manter o controle dentro da família. Assim, os estados, sobretudo no Norte/Nordeste, se tornam feudos, capitanias hereditárias, onde o poder é transferido de pai para filho. Como nas monarquias antigas, de mais de dois mil anos, onde era comum o casamento entre irmãos, garantia de que os filhos seriam realmente parentes em primeiro grau. A transferência de poder e riqueza estava garantida dentro da família.
Isso tudo é constitucional porque a Constituição e as leis de maneira geral são feitas pelo Legislativo. E ele, sendo oligarca, não apenas estende mas amplia seu poder. Sempre. Quase todos os dias. Como ocorre no Judiciário, este corporativo e que também se defende de todas as formas possíveis e imagináveis sob a alegação de ser essa uma atividade ímpar, já que seu membro não pode ter outro vínculo de trabalho que não seja o magistério.
Garibaldinho emocionou o pai. Parecia estar preocupado com a possibilidade de o velho morrer na solenidade. Mas ele sobreviveu. E se passar mal de agora em diante, terá todas as honras e todas as pompas para se tratar. Sua excelência, caso necessário, será atendido no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. E a conta virá para nós.
O país das oligarquias políticas funciona assim. Só me atrevo a dizer que a culpa não é dele. Nem de Garibaldi, nem de Garibaldinho, nem dos demais como José Sarney. A culpa é nossa, embora a imensa maioria de nós, brasileiros, ainda não tenha estrutura intelectual para entender isso.