5 de maio de 2008

Preta e Costinha


Confesso ter certa ojeriza por programas de TV do estilo "reality show". Mas ontem, domingo 04/05/2008, não consegui trocar de canal ao passar pelo SBT. No "Domingo Legal", um homem que vive de lixo era procurado por Gugu Liberato (esse cidadão sem paletó e de gravata aí na foto) e foram ambos à casa onde ele - o entrevistado - morava. Houve choros em profusão. Emoção daquelas pessoas humildes por conhecerem uma figura pública - e notória - da televisão. Iam ganhar uma casa de presente, já que a sua atual está caindo aos pedaços. Mas não esperei para ver essa parte. Meu estômago é sensível...

O incrível, no entanto, é que Preta, a esposa, e Costinha, o marido - e se parece mesmo com o velho personagem do humor - eram pessoas articuladas. Falavam corretamente, concatenavam suas idéias e contavam de maneira clara uma vida marcada por muita dureza, 47 anos de casamento, quatro filhas já casadas e um final de vida de dar pena: uma velha se virando em casa para complementar a aposentadoria de um salário mínimo num improvisado salão de cabeleireiro e um homem fuçando o lixo. Nenhum dos dois consegue trabalho regular, embora estejam há anos se apresentando para um lugar seja lá onde for.

Fiquei vendo aquilo com o pensamento num fato: minha filha mais velha está fazendo seu segundo curso superior e pretende, no trabalho de conclusão em Psicologia, desenvolver um estudo sobre a falta de espaço para as pessoas de certa idade no mercado de trabalho desse Brasil que só dá certo na visão de alguns horários nobres.

Preta e Costinha são a imagem desse país. À margem do processo produtivo, embora com vontade de trabalhar, vivem de migalhas e ainda precisam torcer para a casa, construída faz meio século pelo pai do catador de lixo, não lhes caia na cabeça numa noite de temporal. Não sei que tipo de casa ganharam ou ganharão do programa do SBT. Nem interessa.

Eles estão sendo ajudados por um demagógico esforço de audiência e não por uma efetiva política de Estado de inclusão de trabalhadores no mercado de trabalho. E isso tudo acontece, incrível do incrível, ao mesmo tempo em que o Ibope de Lula sobe. Bom, dessa parte entendo muito, porque Comunicação é minha área. Mas fica para uma próxima oportunidade.

Um comentário:

Scliar disse...

Puxa, vai ser super interessante a pesquisa da sua filha. O incrivel é que, apesar de nao coneguirem postos de trabalho (e olha que o "corte" velhice é bem baixo no Brasil: 45 anos já estao considerando velho - eu me sinto a propria Matusalem, conservada em alcool...), os aposentados acabam virando arrimo de família, com seus parcos recursos - os jovens tambem nao consguem emprego. E isto é o Brasil!"A menas que..." Ethel
PS: Pois é, não entendi ainda porque os psicologos especializados em ouvrir crianças ainda nao ouviram o irmao no caso da Isabela. Alguem consegue explicar?