3 de novembro de 2010

Sakineh e a manipulação da informação jornalística


A pena de morte não soluciona os problemas da criminalidade em lugar algum. Não fosse assim e nos Estados Unidos, que mais executam, e na China, ilustre segunda colocada, não haveria criminoso algum. Todos já teriam sido mortos. E os demais candidatos ao crime sentiriam tanto medo a ponto de concluir que delinquir é perigoso demais. Ao menos em seus países. Por isso, em poucos lugares ainda se mata legalmente hoje em dia.
Mas a pena de morte infelizmente existe. Em alguns casos ela é exercida contra os considerados criminosos comuns. Em outros, contra inimigos políticos. Por último, por motivos religiosos ou de castas. E esse é o caso da iraniana Sakineh Ashtiani (na foto abaixo, à direita), acusada de adultério contra um marido já morto e de ter, juntamente com outras pessoas, tramado o assassinado deste. O caso Ashtiani vem chamando a atenção em todo o mundo e principalmente por dois fatores: a brutalidade insana com que as mulheres são executadas nos estados islâmicos e o fato de ela viver num país governado por um líder de opiniões e ações desconexas e execradas internacionalmente. No Dia de Finados, o Jornal Nacional deu a notícia relativa à mulher como sendo ela uma condenada à morte "pelo regime de Mahamoud Ahmadinejad", numa alusão direta ao presidente iraniano. Como se a decisão pela condenação dependesse somente dele suas opiniões anti-semitas e não de toda uma cúpula teocrática que governa aquele país já faz muito tempo, sob tensão e pressão de grande parte das comunidades externas. Sobretudo dos Estados Unidos, o que acirra, e muito, os ânimos.
No último mês de setembro, Teresa Lewis, uma norte-americana de 41 anos (foto acima, à esquerda), foi executada nos Estados Unidos com uma injeção letal no estado da Virginia. Ela havia sido acusada de matar o marido e um enteado. Seu QI, segundo constatado, era 72, limite da deficiência mental. Os advogados que a defenderam disseram, e provaram, que ela era débil. Uma doente mental, sem noção exata do que fazia. Mas isso não sensibilizou a Suprema Corte. Nem o governador do estado onde ela estava presa. Os jornalistas que viram a execução testemunharam depois que Teresa parecia assustada e desorientada. O Jornal Nacional nada falou sobre o caso. Os outros telejornais nacionais também não. E ninguém, mas ninguém mesmo, disse ou escreveu que ela havia sido morta "pelo regime de Barak Obama".
É óbvio que na nossa prática de noticiar fatos há uma grande carga de rejeição política e de manipulação de fatos em nome de crenças pessoais, corporativas ou interesses econômicos. Temos uma visão ocidental e anticomunista de mundo e separamos, dessa forma, amigos e inimigos. Isso ocorre também nos EUA e em grande parte dos países europeus. Falamos de iguais e desiguais. Certos e errados. Culpados e inocentes. Os assuntos são direcionados para que a opinião pública ame ou odeie de acordo com a ideologia ou valores defendidos pelas grandes empresas de Comunicação. E o conceito de "liberdade de imprensa" é parte integrante da prática da manipulação dos fatos. O que se pretende é poder noticiar o que interessa, da forma como interessa, ainda que omitindo informações e dados. E marginalizando o "outro lado".
E não é essa a liberdade com que se sonha. Pelo menos, não é essa a liberdade de noticiar pela qual lutamos muitos de nós por 21 anos, de 1964 a 1985, enquanto os grandes veículos de Comunicação do País ou se calavam ou apoiavam claramente a ditadura militar.
Um Estado que, em nome do conceito de "controle social" da informação, deseja garrotear o livre fluxo de notícias, age deliberadamente contra o interesse público. E grandes corporações de Comunicação que usam a informação para divulgar ou omitir fatos, manipulando-os quando necessário e para atender a interesses individuais ou de grupos, agem da mesma forma.
Isso acontece hoje no Brasil e em outros lugares. Como todos os dias falamos do sagrado direito de informar - e informação é poder -, não seria demais lembrar que ele, esse direito, pressupõe uma responsabilidade muito grande. Primeiro, de levar ao público a informação limpa de tendências, fisiologismos, ideologias ou manipulações econômicas. Por fim, de lembrar que o outro lado tem esse mesmo direito de se expressar. Principalmente porque pensa diferente.

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