12 de junho de 2024

Votações do obscurantismo


Está em discussão no Congresso Nacional, por mais incrível que possa parecer, um projeto de lei que pretende tornar mulheres que interrompem a gravidez após serem vítimas de estupro passíveis de acusação de homicídio doloso. Já não bastou o estupro, uma violência inominável, e a pessoa atingida ainda vai ser acusada de ser assassina. E isso por um ato que é previsto em lei como não sendo criminoso. Sim, porque a legislação brasileira considera legal que as mulheres - caso queiram - façam aborto em apenas três hipóteses: no caso de estupro, quando o feto é anencéfalo e quando a grávida pode morrer nessa condição.

Pois o obscurantismo legislador brasileiro quer perpetrar mais um monstrengo jurídico desde já condenado a ser declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O mais absurdo é que isso não está sendo gestado apenas por burrice pura, embora obscurantista seja quem se encontra na escuridão, vive na ignorância. E, em nível social, político e cultural essa situação seja o sistema que nega a instrução e o conhecimento às pessoas com a consequente ausência de progresso intelectual ou material. A rigor, tais preceitos já deveriam estar sepultados pela história, posto que vicejaram sobretudo na Idade Média.

Então o que ocorre hoje na Câmara e no Senado Federal? Acontece que nas últimas eleições, a reboque do pensamento de um sociopata que acendeu à presidência da República antes do governo atual agarrado na calda de cometa do renascimento do pensamento reacionário de grande parte dos brasileiros, foi criada como um dos seus sustentáculos uma tal "pauta de costumes" que reuniu e reúne o que há de mais retrógrado no pensamento e nas convicções dos brasileiros. Ele se baseia na ignorância - sim, eu posso ser ignorante até mesmo tendo curso superior! - e na disseminação de tudo o que existe de pior no cardápio da cultura nacional.

Isso se tornou de vital importância porque virou uma arma política. Pesquisas mostram que esse reacionarismo, em grande parte sustentado por correntes religiosas ligadas ao novo evangelismo formado por "confissões" de líderes picaretas, tem uma força enorme junto ao eleitorado nacional. Pode eleger muita gente, como aconteceu nas últimas eleições legislativas federais, quando um contingente imenso de desqualificados ganhou mandato de deputado federal ou senador para cultuar o genocida inelegível e também para sustentar de todas as formas uma pauta de loucuras que chegam a ser obscenas.

Só para terminar por onde começamos: se você acha pecado interromper a gravidez depois de engravidar vitimada por um estuprador, vá em frente. A lei em vigor te dá esse direito. Mas se para você levar adiante essa situação é mais uma violência injustificável, interrompa a gestação. Da mesma forma como você pode fazer isso se sua vida estiver em risco caso a gravidez prossiga ou se ficar comprovado que seu feto não tem cérebro da mesma forma como, parece, não têm aqueles que defendem essas pautas no Congresso.

Creio que isso vai continuar sendo só uma questão de opção. 

Nenhum comentário: