17 de janeiro de 2008

Aprendemos todos


40 anos depois, a maioria dos que conviveram com os conflitos políticos de 1968, desembocando no AI-5, ainda convivem com uma contradição que a alguns atormenta e a outros leva ao riso: combatíamos a ditadura militar do Brasil, gritávamos para que ela caísse, mas apoiávamos outra.
Naqueles tempos, a esmagadora maioria dos que iam às ruas gritar contra o governo era formada por estudantes militantes políticos ou então não estudantes também com militância política. Em comum eles tinham o fato de serem filiados ao Partido Comunista Brasileiro, o PCB ou Partidão, e ao Partido Comunista do Brasil, o PC do B. Mais adiante, muitos se filiariam também às várias correntes que surgiram, sobretudo em decorrência dessas duas e que pregavam a luta armada contra a ditadura: MR-8, Colina, Var-Palmares, Libelu, etc.
Havia uma clara ligação entre os partidos ou movimentos então clandestinos e países como a União Soviética, China e Cuba, principalmente. Como todas eram, como ainda hoje o são China e Cuba, defensoras de princípios marxistas como a “ditadura do proletariado”, queríamos substituir a nossa por outra.
Interessante notar que muita gente se associou à luta e lutou honestamente contra o regime militar não tendo consciência disso. Ou então achando que, uma vez afastados os militares brasileiros, seria possível também afastar, junto com eles, o cerne dos movimentos que lutaram nas ruas brasileiras.
Foram tempos contraditórios.
Em comum, tínhamos todos uma coisa: detestávamos o regime militar brasileiro. Que prendia ilegalmente, torturava e matava. Que estuprou a nossa brasileira, depondo à força um presidente que, se era dúbio na maioria dos seus atos de poder, havia chegado a ele pela via legal. Detestavam também a ditadura quem nada tinha a ver com os partidos de esquerda. (como as mulheres da foto acima, pinçada ao site do Zirando para ilustrar esse texto: Eva Tudor, Tônia Carrero, Eva Wilma, Lila Diniz, Odete Lara e Norma Belguel).
Foi esse caminho que desembocou, 21 anos depois do golpe militar de 1964, em 1985 e no fim da ditadura. Ela, que saiu de cena desacreditada, quase enxotada, legou aos brasileiros o ensinamento de que as piores democracias são melhores do que as melhores ditaduras. Ou então que o voto é o único caminho inquestionável, dentre os conhecidos hoje, de conquista do poder.
Aprenderam isso também aqueles que lutaram, pelas sabotagens ou pelas armas, contra os ditadores de plantão. Hoje sabemos que, se não existe espaço para a “ditadura do proletariado”, o capitalismo também não é a solução dos problemas. O que se busca é algo que una o que de melhor têm ambos.
Aprendemos todos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Concordo com o fato de que o capitalismo nao eh a solucao dos problemas. Ditadura do proletariado tambem nao faz sentido, no entanto, como concertar esse pais se nao for pela forca ? Como distribuir melhor a renda sem revolucao ?

Dos que voce citou conhecia o Libelu (liberdade e luta nao eh ?).
Interessante.

Eduardo Cypriano disse...

Caro Álvaro,

na "liturgia" clássica do marxismo, a ditadura do proletariado não é mais do que uma fase onde essa classe se torna a classe dominante. Dentro desse mesmo conceito o capitalismo é a ditadura da burguesia.

Esse conceitos não estão diretamente ligado ao conceito que temos de ditadura, ou seja supressão de liberdades individuais, violações de direitos humanos etc.

Claro que a Russia e China da época (e de hoje) não eram exatamente libertários mas convém diferenciar o conceito Marxista daquilo que ocorrreu nessas experiências.

Vale lembrar, por exemplo, que os primeiros a denunciar os crimes de Stalin forma pessoas do seu próprio partido e que durante a segunda guerra as "democracias" do ocidente fizeram questao de esconde-los.

Álvaro José Silva disse...

Gente;
o Eduardo tem razão no tocante à "liturgia" do marxismo, quando comenta meu artigo. Isso foi um ponto muito discutido à época, não apenas em rueniões partidárias mas também até mesmo em salas de aulas nas universidades.
Concordo com ele. Meu artigo refere-se ao fato de que, mesmo vivendo uma ditadura burguesa, nós a estávamos torcando, no sentido lato, pela outra. Se havia supressão de liberdades em uma, claro haveria na outra. Afinal, eram correntes antegônicas, que jamais coniveriam, ao menos em princípio.
Álvaro José Silva