27 de março de 2024

Faz 60 anos... (3)


Pode-se dizer que o dia 1º de abril de 1964 foi, por todos os ângulos, muito diferente dos outros, e já a partir do fato de que um golpe de Estado sem muitas explicações prontas, com dúvidas e medos, aconteceu justamente no dia dos mentirosos. Mas eu não tinha estrutura para pensar nisso naquele momento, em vésperas dos 14 anos, e voltei para a casa dos meus avós depois de passar pelas partes mais conhecidas do Centro de Vitória logo após o almoço. Deixando a Praça Oito de Setembro, em vez de ir em direção à Praça Costa Pereira (foto) andei pela Avenida Jerônimo Monteiro no sentido Parque Moscoso, passando por pontos que conhecia como as Lojas Helal Magazin, Casas Santa Terezinha e Hudersfield. Nessa última meu avô comprava, quando o dinheiro dava, os tecidos de seus ternos.

Em vez de subir a Escadaria Barbara Lindenberg, fui mais para baixo e entrei pela Rua General Osório. Ela me levaria à Escadaria Doutor Carlos Messina, de onde a gente às vezes tinha que descer correndo para pegar as bolas das peladas que eram desviadas durante os rachas na Rua Francisco Araújo. Passei pelos números 78, 92, 120 e 130, os prostíbulos da cidade e que rivalizavam com os da Volta de Caratoíra. Esses últimos não eram conhecidos pelos números, mas sim pelas cores ou acabamentos que ostentavam: Casa Branca, Casa Verde, Casa Caiada, etc.

Na porta de um dos prostíbulos da General Osório, sei lá eu hoje qual, uma das "primas" estava parada na porta vendo certa batida policial. Não, nada tinha a ver com o golpe de Estado que se desenvolvia no Brasil e que já havia afastado o presidente da República. Era só um bêbado que estava sendo colocado no "camburão". "Aprende a respeitar a Policia, safado", ouvi o policial dizer enquanto o empurrava para dentro do veículo e sapecava um tapa na cara do preso. Tão forte que o estalo pode ser ouvido à distância.

Na casa de vovô e vovó um "conselho de estado" estava formado. Meu tio Walter, um dos irmãos de mamãe, havia se reunindo com o pais e fui autorizado a participar das conversas. Ele, funcionário do Banco do Brasil, explicava com base em "fontes confiáveis" que um regime militar iria se formar para ajudar a salvar o Brasil do comunismo, mas que, mais uma vez segundo as fontes, essa intervenção se daria até as próximas eleições. Só isso, Um pequeno intervalo para tirar os contestadores e subversivos do raio de ação. Mas seria coisa pouca. insistiu meu tio respondendo a uma interrogação de vovó.

Sim, só duraria 21 anos...  

2 comentários:

Anônimo disse...

Bom trabalho! Enquanto você narra sua trajetória de vida adolescente, registra também os acontecimentos e descreve alguns logradouros da nossa Vitória.
Continue! Tá ficando legal.

Anônimo disse...

Não lembro desse chafariz na Praça Costa Pereira. Observe que nem o prédio do Alvares Cabral aparece. A foto é bem antiga.