10 de janeiro de 2025

Pepe Mujica, o gigante!


José Alberto Mujica Cordano, o homem que todos chamam de Pepe (foto), anunciou em entrevista que está morrendo. Pediu a todos permissão para ir em paz no sítio onde mora junto a seus pertences amontoados numa casa velha, o Fusca à porta e uma pequena horta da qual cuida com esmero. O gigante uruguaio, dono de um patrimônio moral de valor inestimável, está em vias de deixar a vida depois de saber que não há mais tratamento para o câncer que o devora por dentro, em metástases. Irá embora dentro de muito pouco tempo.

Esse velhinho de ar doce e frágil é um ex-guerrilheiro Tupamaro e foi preso por uma das ditaduras de extrema direita que governaram o Uruguai. Ficou 15 anos na cadeia e, em alguns momentos, dentro de um buraco. Saiu dele e da prisão para se tornar presidente do Uruguai de 2010 a 2015 e senador de 2015 a 2018. Nascido em Paso de La Arena, em Montevidéu, chegou ao Movimento de Libertação Nacional, ou Tupamaro, grupo marxista-leninista de guerrilha urbana, com o intuito de combater o fascismo em seu país. Pagou caro por essa opção - como no caso brasileiro, errada -, da mesma forma como aconteceu com Dilma Roussef, a quem sucedeu no Mercosul. Também já foi deputado, Ministro da Pesca um monte de coisas. Mas sobretudo vai deixar a vida e entrar para a história como um homem de honra.

Mujica não usou a política para enriquecer. Usou-a para construir e fortalecer a democracia no Uruguai. Depois de deixar o poder, jamais interferiu na vida pública de seu país. No seu estertor, usou o prestigio pessoal para ajudar a eleger o atual presidente, a quem jamais procurou depois disso. Em hipótese alguma para pedir favores ou cargos. Vai morrer pobre, mas cercado pela admiração de milhões. Será enterrado de mãos limpas, como poucos.

Pepe teria muito a ensinar aos políticos brasileiros, mas não vai se ocupar disso. Seu anúncio de morte próxima aos 89 anos foi feito sobretudo para os compatriotas uruguaios. Ao Brasil veio algumas vezes, na última para prestigiar o presidente Lula. Este, teria muito a aprender com ele, mas imagino que não o fará. Certamente chorará no velório caso possa ir, e serão lágrimas verdadeiras. O melhor, esse exemplo de vida, será sepultado com Pepe. Monumento à ética pessoal e política, à honra, à dedicação total e incondicional ao interesse público, ele viveu pelo Uruguai, sempre lutando, de início com armas nas mãos como no episódio da Tomada de Pando, em outubro de 1969, e depois na política que usou largamente e jamais em benefício próprio. O Uruguai, país minúsculo, em breve sepultará um gigante! Caso raro!          

7 de janeiro de 2025

ANISTIA, NÃO!

Depois do 08 de janeiro de 2023 os milhares de golpistas brasileiros que tentaram destruir a nossa democracia começaram uma campanha pela anistia daqueles que acamparam diante de quarteis e também seus mentores, sobretudo e principalmente para que o "grande líder" Jair Bolsonaro não pudesse ser alcançado pelas leis em vigor no Brasil. Então hoje, no dia em que se completam dois anos daqueles atos da Praça dos Três Poderes, em Brasília, é preciso dizer porque isso jamais deverá ser feito, em nome de nossa dignidade e da honra desse País tão vilipendiado ao longo dos tempos.

Quando terminou a Segunda Guerra Mundial e foram descobertos os crimes do nazismo uma ampla campanha mundial pregou o não esquecimento do que havia se passado para que tal jamais se repetisse. Israel, país então recém criado tomou para si o mote da campanha, reduziu-a a uma denúncia apenas e tão somente focada no extermínio judeu e fez dela uma imagem de seu país. Acontece que não era assim, porque os nazistas mataram indiscriminadamente todos aqueles que considerava inferiores, o que atingiu até mesmo adversários políticos deficientes, negros, etnias minoritárias e outros como palestinos, comunistas ou não.

Mas Israel continuou a ter essa bandeira até que sua extrema direita chegou ao poder e começou a fazer com as populações palestinas o mesmo que o nazifascismo havia feito de 1939 a 1945. Hoje, apesar da intensa campanha internacional que nasce nos Estados Unidos, sustentáculo do sionismo internacional, não é mais possível esconder o fato de que o Estado Judeu usa os mesmos argumentos requentados da Alemanha Nazista em busca de seu "espaço vital" e da eliminação palestina tida como grupo etnicamente inferior. Tal mestre, tal aluno! Bom aluno, por sinal...

Os ideólogos do 08 de janeiro de 2023 têm muita inspiração tirada do nazifascismo, inclusive do sionismo nazista israelense no poder hoje, quando Israel se tornou estado terrorista travestido de defensor ferrenho de sua soberania. Usa uma capa machada de sangue e que não consegue esconder o fato de que as tropas sionistas combatem não em seu território constituído pela ONU em 1948, mas sim em terras estrangeiras invadidas à força - como sempre com apoio norte-americano - aos povos nacionais que circundam as terras dadas legalmente a eles. As chamadas "Forças de Auto Defesa de Israel" são na verdade uma união de três armas agressoras mantida pelos interesses internacionais dos Estados Unidos.

Hoje, no dia em que são completados dois anos da tentativa do golpe brasileiro, o trumpismo a ser empossado dia 20 em Washington ameaça anexar o Canadá, mudar o nome do Golfo o México para Golfo da América, tomar o Canal do Panamá (pode ser que se queira mudar o nome para Canal Trump, quem sabe...), invadir a Groenlândia e não se imagina mais o quê. Depois de Elon Musk colocar o X, ex-Twiter, à disposição do futuro presidente norte-americano, ontem foi o dia de Mark Zuckerberg dizer que a Meta, controladora do Facebook e Instagran, principalmente e sua empresa não mais fará checagem de fake news, mas sim deixará isso à cargo das "comunidades". Não são sandices, mas sim insanidades que vão ser mesmo tentadas de curto a médio prazo.

O que se vislumbra também  nisso tudo é um foco nos sistemas judiciários dos países que combatem essa espécie de "absolutismo" das redes sociais chamados até mesmo de secretos sem o serem. Zuckerberg atacou a Europa e, na América Latina, mesmo sem citar nome, o Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil, que hoje julga uma regulamentação das redes sociais. Nosso Tribunal seria um inimigo declarado dos movimentos extremistas de direita, neofascistas e de projetos autocratas como o de Donald Trump.         

Então, estamos diante de dias incertos e perigos certos em diversos setores. Talvez o presidente dos EUA esteja pisando em terreno pantanoso para ver até onde poderá ir. Ele e seu país não vão lutar contra o mundo todo, mas é preciso que o Brasil dos verdadeiros brasileiros esteja unido em torno de nossos ideais maiores para enfrentar quaisquer ameaças que venham a se corporificar no terreno da sabotagem à democracia. Fazer diferente é abrir terreno fértil ao revisionismo, ao golpismo, ao oportunismo político e à corrupção que agora ganham terreno no Congresso Nacional na calda de cometa das emendas parlamentares e outras aberrações permitidas sobretudo por Bolsonaro.

Hoje, na passagem desses dois anos da tentativa de golpe militar - jamais confundir isso com uma comemoração -, várias manifestações ocorrerão em Brasília durante o dia. Lá em em inúmeras outras cidades brasileiras, como a minha Vitória. Até mesmo o relógio do século XVII vandalizado pelos marginais do 08 de janeiro voltará ao Palácio do Planalto juntamente com mais peças - onde deveria ter permanecido intocado -, isso depois de um restauro que demorou 24 meses.  Se conseguirmos fazer com que a nossa democracia atravesse as novas tormentas também sem o risco de surpresas como essa, estaremos diante de uma oportunidade de ouro para fortalecer de uma vez por todas as instituições civis e militares brasileiras em torno da Constituição da República nesse abraço simbólico da Praça dos Três Poderes!

É preciso que não nos esqueçamos do preço pago por todos na conta dos 21 anos de ditadura militar brasileira. "Ainda estou aqui", filme reverenciado por milhões e premiado com o Globo de Ouro para Fernanda Torres mostra isso de maneira enfática. Os cartórios do País estão tendo que retificar inúmeras certidões de óbito de pessoas assassinadas pelo regime militar ao longo dos 21 anos de obscurantismo político vivido por nós. Eu mesmo conheci homens e mulheres que foram supliciados e mortos na ditadura. Também outros que sofreram, mas conseguiram sobreviver. Todos esses últimos carregam consigo um peso imenso em traumas que jamais puderam e poderão ser apagados. É tempo de isso ficar para trás, mas de forma alguma no esquecimento porque uma decisão como essa seria o supremo desrespeito para com esses brasileiros. Esses, sim, são nossos patriotas.             

Anistia, não!                                      

6 de janeiro de 2025

Porque ainda estamos aqui

As Fernandas no momento da vitória maior da filha 

A vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro anunciado ontem nos Estados Unidos possui um significado simbólico muito grande e ela tem a exata noção disso. Significa que o Brasil que preza sua Constituição, que sobrevive a tentativas de golpe de Estado e luta pela manutenção do sistema político baseado no Estado Democrático e de Direito vai vencer os vermes golpistas que emergem dos esgotos da história onde vivem para, de tempos em tempos, buscar reviver seus pesadelos de violência, de negacionismo e de obscurantismo.

Significa explicar porque ainda hoje estamos aqui e vamos continuar estando.

A extrema direita golpista é diferente da direita politica. Essa última representa uma visão  de mundo antissocialista e que luta por alguns dos ideais caros ao capitalismo, mas dentro da regra do jogo e respeitando quem pensa diferente. Conheço muita gente assim. A extrema golpista vive nas sombras porque não pode emergir dos esgotos impunemente. Faz como fez uma acadêmica da Academia Espírito-santense de Letras (AEL) que postou imagem mostrando duas figuras religiosas ligadas à mãe de Jesus à esquerda e ao centro da "arte" com, à direita, uma da bandeira do Brasil, nosso maior símbolo pátrio, representando o extremismo que aqui ainda sobrevive respirando por aparelhos ligado a Bolsonaro. Retirou do ar, pediu desculpas e disse ter se enganado de grupo. Engano grande, disse eu...

Fernanda sabe, assim como eu e muitos outros, que Rubens Paiva é agora somente um símbolo. Da mesma forma que ele, muitos outros brasileiros foram presos ilegalmente, torturados e assassinados nos porões do regime que ocupou o Brasil entre 1964 e 1985. Teve mulher grávida jogada ainda viva de helicóptero sobre a selva. Teve homem amarrado à traseira de Jeep militar e com a boca presa no cano de escape enquanto o acelerador era pressionado para gerar mais gases e calor. Teve pau de arara, cadeira do dragão, afogamento simulado ou não, espancamentos que levaram à morte como aconteceu com Rubens Paiva e Vladimir Herzog, o Vlado. Em comum entre os dois o fato de que foram buscados em casa para "prestar depoimento". Vlado, o jornalista, foi mostrado num enforcamento simulado em instalação militar. Já Rubens Paiva, desapareceram para sempre com seu corpo.

As pessoas que vivem nos esgotos da história pensam o que da figura do Deus no qual dizem acreditar?

Irônico, mas "Ainda estou aqui" é uma produção da Globo! Há sempre tempo para as pessoas e instituições reverem seus princípios, suas crenças. E hoje, depois da vibração incontida de Fernanda Torres, da alegria de Fernanda Montenegro (vejam a montagem fotográfica) haverá muito tempo para que nós, brasileiros, pensemos em que país queremos viver. No dos esgotos da história, não, pois nunca na vida acamparei perto de quartéis militares, rezando para pneu ou chamando extraterrestres. No do exemplo contido no filme que nos levou ao Globo de Ouro, sim, porque esse país de homens livres construído pelas esquerdas democráticas é o retrato das aspirações de todos os que renegam o passado de torturas erigido sobre os cadáveres, de Rubens, Vlado e milhares de outros.